Retrospecto Tributário – 16/09 a 24/09
Impactos da Reforma Tributária no setor de saúde
Data: 10/09/2024
A Reforma Tributária, aprovada recentemente, traz profundas transformações para o setor da saúde. Neste artigo, analisaremos os impactos dessa reforma na margem de lucro das empresas do setor e discutiremos estratégias para mitigar os efeitos negativos das novas regras tributárias.
O Impacto da reforma tributária na margem de lucro das empresas de saúde
A Reforma Tributária, ao unificar e reestruturar tributos como PIS, Cofins, ICMS e ISS, pode trazer uma maior complexidade à estrutura tributária das empresas de saúde. A unificação dos tributos sob o CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) tende a simplificar o sistema, mas, também, pode resultar em uma elevação da carga tributária para produtos e serviços essenciais, incluindo medicamentos e equipamentos médicos que, anteriormente, se beneficiavam de isenções ou alíquotas reduzidas.
Esse possível aumento na carga tributária pode impactar diretamente os custos operacionais das empresas de saúde, pressionando suas margens de lucro. Hospitais e clínicas, que dependem fortemente de equipamentos e medicamentos, poderão enfrentar custos mais altos, que poderão ser repassados aos consumidores, mas com risco de perda de competitividade, dado o mercado sensível a preços.
Componentes específicos da reforma
Apesar de existirem previsões para alíquotas diferenciadas para bens essenciais como, por exemplo medicamentos, a unificação dos tributos pode neutralizar os benefícios dessas medidas. Equipamentos médicos são itens cujo custo pode aumentar significativamente sobre a nova estrutura tributária, impactando a operação das empresas de saúde.
A reforma também pode alterar os incentivos fiscais e deduções que, atualmente, beneficiam o setor de saúde. Embora ainda não estejam claros todos os detalhes, é possível que a eliminação ou a redução desses incentivos eleve ainda mais os custos operacionais das empresas, afetando sua rentabilidade.
Estratégias de Mitigação
Diante desses desafios, as empresas de saúde estão avaliando diversas estratégias para mitigar os impactos negativos da Reforma Tributária. Entre as principais medidas, destacam-se:
Revisão de estruturas de custos: as empresas estão revisando suas estruturas de custos para identificar áreas onde possam aumentar a eficiência e reduzir despesas, incluindo a renegociação de contratos e a otimização de processos de compra.
Adaptação ao novo cenário tributário: investimentos em compliance e consultoria tributária estão sendo considerados essenciais para garantir que as empresas se adaptem corretamente às novas exigências, minimizando riscos de penalidades e otimização do uso de créditos tributários.
Diversificação de serviços e produtos: algumas empresas estão explorando a diversificação de seus portfólios para compensar possíveis aumentos de custos em áreas específicas, fortalecendo segmentos menos impactados pela reforma.
Advocacy e diálogo com o governo: setores organizados do segmento de saúde estão engajados em ações de advocacy junto ao governo para influenciar a regulamentação da reforma e preservar incentivos fiscais cruciais para o setor.
Percepção dos investidores
Os investidores estão apreensivos quanto ao impacto da Reforma Tributária no setor de saúde. A perspectiva de redução da lucratividade, devido ao aumento dos custos operacionais, pode desestimular novos investimentos e a expansão de empresas no setor. A incerteza regulatória e a possibilidade de uma maior carga tributária contribuem para um ambiente de cautela, onde a viabilidade de novos projetos e expansões é cuidadosamente reavaliada.
A Reforma Tributária apresenta tanto desafios quanto oportunidades para as companhias de saúde no Brasil. Embora a unificação de tributos e a possível eliminação de Incentivos Fiscais representem riscos para o lucro, estratégias eficazes de adaptação, como a revisão de custos e a diversificação de serviços, podem ajudar as empresas a mitigar os impactos e encontrar novas oportunidades no cenário pós-reforma. A capacidade de adaptação e a proatividade no diálogo com o governo serão cruciais para garantir a sustentabilidade e o crescimento desse setor em um ambiente tributário mais simplificado, porém ainda muito complexo.
Autor: João Eloi Olenike, presidente-executivo do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT).
Complexidade do sistema tributário faz empresas pagarem mais
Data: 12/09/2024
O levantamento feito pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) revelou que, em 2022, aproximadamente 95% das empresas brasileiras pagaram mais impostos do que deveriam. Esse fenômeno é atribuído à extrema complexidade do sistema tributário brasileiro, que possui milhares de normas federais, estaduais e municipais. As empresas, muitas vezes, enfrentam dificuldades para interpretar e aplicar corretamente essas normas, o que acaba resultando em pagamento indevido de tributos como ICMS, IPI, PIS e COFINS.
A complexidade também se reflete nas diferentes alíquotas que variam conforme a atividade empresarial (CNAE), o tipo jurídico da empresa e o regime tributário. Esse cenário é reforçado pelo fato de que o Brasil possui 1.332 atividades empresariais, 89 tipos jurídicos e 5 regimes tributários distintos, tornando a tributação um verdadeiro labirinto legal para a maioria das empresas (IBPT).
Roger Mitchel, diretor da Contabilidade Internacional, afirma que “O Brasil tem 1.332 Atividades Empresariais CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas), 89 tipos jurídicos, 5 regimes tributários e mais de 100 impostos variados, deixando tudo muito complicado. São impostos municipais, estaduais e federais, e as alíquotas desses impostos variam para cada CNAE, cada tipo jurídico e cada regime tributário.”
“O Sistema Operacional Fiscal com Inteligência Artificial (SOFIA) organiza esse quebra-cabeça extremamente complexo, garantindo segurança jurídica, economia tributária e conformidade legal”, explica Roger.
O SOFIA é um software desenvolvido pela empresa brasileira Contabilidade Internacional para ajudar empresas nacionais e estrangeiras a encontrar os melhores caminhos no complexo sistema tributário brasileiro, além de alternativas em outros 33 países. Criado com base na inteligência artificial, o SOFIA oferece uma visão ampla e globalizada das operações financeiras de uma pessoa física ou de uma empresa, sendo capaz de integrar as funções de Web Crawler, ERP e CRM tributário e jurídico, conforme fonte oficial da própria empresa.
Ao coletar, processar e interpretar mais de 1.700 dados em todo o conjunto de leis e impostos de diferentes cidades, estados e países, a plataforma analisa cenários e indica caminhos que garantam às empresas e indivíduos uma gestão fiscal otimizada, nacional e internacionalmente. Em modo ativo desde 2017, já são 7 mil usuários entre pessoas físicas e jurídicas, no Brasil e em 34 outros países, inclusive nos Estados Unidos.
A plataforma auxilia o contribuinte a evitar pagar mais impostos do que necessário, além de cumprir qualquer obrigação tributária e a obedecer a todas as normas. “O SOFIA coleta todo o conjunto de leis e impostos de todos os municípios e estados do Brasil e compara com os equivalentes dos Estados Unidos, por exemplo, para apontar o melhor cenário tributário e jurídico, seja para um brasileiro abrir empresa nos EUA ou comprar uma casa nos Estados Unidos e financiar um imóvel de temporada na Disney ou para uma empresa americana importar serviços ou produtos brasileiros. E essas são apenas duas das possíveis aplicações do SOFIA”, explica Roger.
O executivo afirma que a plataforma facilita o acesso à contabilidade, tanto nacional quanto internacional, eliminando a necessidade de grandes investimentos em consultorias especializadas. A interface do sistema e os relatórios detalhados permitem uma gestão fiscal simplificada, além de fornecer informações sobre as implicações fiscais e jurídicas de suas atividades e operações.
Além desse diagnóstico inicial, a cada nova legislação adicionada, alteração tributária ou caso de uso, o sistema se atualiza. Esse ciclo de aprendizado e adaptação constante, característico da IA, assegura que o SOFIA permaneça atualizado diante das mudanças globais, oferecendo às empresas uma solução fiscal que atende suas necessidades atuais e futuras, como é o caso da Reforma Tributária no Brasil.
STF voltará a julgar validade da trava de 30% na extinção de empresa
Data: 17/09/2024
A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) julgará a partir desta sexta-feira (20/9), em plenário virtual, a possibilidade de se afastar a trava de 30% para aproveitamento de prejuízo fiscal do IRPJ e base negativa da CSLL em caso de extinção da empresa.
O placar está em 1×0 no plenário virtual com o voto do relator, o ministro André Mendonça, pelo afastamento da trava, ou seja, favorável aos contribuintes. Depois, o próprio Mendonça pediu destaque da discussão, ou seja, levou-a para o julgamento presencial. Agora, o destaque foi cancelado e o debate seguirá no formato virtual. A discussão se dá no RE 1.425.640 (AgRg).
Os contribuintes defendem que a discussão sobre a trava de 30% no momento da extinção da empresa deveria ser objeto de um distinguish pelo STF com relação ao Tema 117, que prevê que “é constitucional a limitação do direito de compensação de prejuízos fiscais do IRPJ e da base de cálculo negativa da CSLL”. Ou seja, para as empresas, deveria ser aberta uma exceção para permitir o aproveitamento sem a trava quando a empresa está para ser extinta, já que não haverá outra oportunidade de utilização do prejuízo fiscal e base negativa no futuro.
Porém, nos julgamentos envolvendo a extinção, os ministros do STF vêm ou aplicando o Tema 117, ou afirmando que a discussão é infraconstitucional. No RE 1425640, em maio, o ministro André Mendonça afirmou, em voto favorável aos contribuintes, que deve ser feita uma exceção à trava para o caso de extinção da empresa. Porém, em decisão monocrática recente, no ARE 1492100, Mendonça defendeu a tese de que a discussão é infraconstitucional. Assim, é incerto se o ministro manterá a posição no retorno do caso à pauta da 2ª Turma.
Além de Mendonça, integram a 2ª Turma os ministros Edson Fachin, Gilmar Mendes, Nunes Marques e Dias Toffoli. Entre eles, o ministro Edson Fachin era o único antes de Mendonça que já havia votado a favor de afastar a trava em caso de extinção da empresa, em 2019. No RE 1357308, o ministro André Mendonça votou com os outros ministros para manter a limitação e Fachin ficou vencido por 4×1. No voto proferido em maio, Mendonça alterou sua posição.
Na ocasião, ele afirmou que a aplicação da trava de 30% pressupõe a continuidade da empresa, a qual, somente assim, teria seus prejuízos compensados ao longo do tempo. Porém, com a extinção, deixa de existir a pessoa jurídica que estaria apta a recuperar os valores reconhecidamente devidos. Assim, segundo Mendonça, a retenção dos valores mesmo diante do encerramento da sociedade empresária geraria enriquecimento sem causa do fisco.
Segundo a advogada Nina Pencak, sócia do Mannrich e Vasconcelos Advogados, o voto do ministro André Mendonça em maio é um dos poucos favoráveis aos contribuintes na matéria entre os ministros do STF. “No próprio Tema 117, o ministro Fachin ficou vencido. Mas ele entendeu que a trava era inconstitucional em qualquer hipótese, principalmente na extinção”, explicou.
A advogada defendeu ainda a afetação da controvérsia à sistemática da repercussão geral. Com o retorno da discussão à pauta, Pencak afirma que os tributaristas estão “esperançosos”. “Estamos esperançosos, mas sabemos que há um background desfavorável aos contribuintes”, comentou.
https://www.jota.info/tributos/stf-voltara-a-julgar-validade-da-trava-de-30-na-extincao-de-empresa
STF julgará com repercussão geral contribuição ao Senar sobre exportação
Data: 18/09/2024
Por unanimidade, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceram a repercussão geral na discussão sobre a incidência da contribuição ao Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) sobre as receitas de exportação. O plenário virtual acompanhou a posição do relator, ministro André Mendonça, de que a questão tem relevância jurídica e deve ser objeto de debate entre os ministros.
Em seu voto, Mendonça afirma que há divergência entre os ministros do STF sobre a natureza da contribuição ao Senar, se é uma contribuição social ou uma contribuição de interesse de categoria profissional. Caso se trate de contribuição social, o Senar se enquadraria na imunidade prevista no artigo 149, parágrafo 2º, inciso I, da Constituição, que prevê a impossibilidade de cobrança das contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico sobre as receitas de exportação.
“O que sobressai, neste e noutros feitos pendentes de apreciação definitiva pelos eminentes membros desta Suprema Corte, é a compreensão sobre a espécie da contribuição ao Senar em face da regra de imunidade das contribuições sociais e de contribuições de intervenção no domínio econômico incidentes sobre as receitas decorrentes de exportações”, afirmou.
Para o ministro, o reconhecimento da repercussão geral na discussão contribuirá para o debate entre os ministros e com a sociedade. Mendonça destaca que, embora alguns ministros já tenham se posicionado sobre a qualidade da contribuição, será necessário que a Corte estabeleça um posicionamento uniforme.
Nesse sentido, Mendonça reforça que a questão é de relevância jurídica “notória” e processos sobre o tema “avolumam-se” nos gabinetes do STF. “Informações trazidas pela Frente Parlamentar da Agropecuária indicam impacto de 54% na arrecadação, em valor próximo de um bilhão de reais. Enfim, tudo a sobejamente demonstrar o preenchimento dos requisitos da repercussão geral”, considerou.
Ação tramita como RE 1.310.691 (Tema 1320).
https://www.jota.info/tributos/stf-julgara-com-repercussao-geral-contribuicao-ao-senar-sobre-exportacao
Receita atualiza regras da e-Financeira e amplia obrigatoriedade para novas entidades
Data: 18/09/2024
Receita Federal do Brasil (RFB) publicou a Instrução Normativa nº 2.219, de 17 de setembro de 2024, que atualiza as regras da e-Financeira e amplia a obrigatoriedade de envio de informações para novas entidades.
Agora, além das instituições financeiras tradicionais, entidades como administradoras de cartão de crédito e instituições de pagamento devem enviar informações por meio da e-Financeira.
A e-Financeira também passa a incorporar dados anteriormente coletados pela Decred, que será descontinuada a partir de janeiro de 2025.
Essa ampliação e atualização das regras foi previamente apresentada a entidades e interessados. No dia 4 de junho, foi realizada uma live com mais de 700 participantes, entre eles a Febraban e ABIPAG (Associação Brasileira de Instituições de Pagamento). No link e-Financeira – Apresentação das alterações para 2025 (rfb.gov.br) constam mais detalhes.
As medidas visam aprimorar o controle e fiscalização das operações financeiras, garantindo uma maior coleta de dados. Além disso, reforçam os compromissos internacionais do Brasil no âmbito do Padrão de Declaração Comum (CRS), contribuindo para o combate à evasão fiscal e promovendo a transparência nas operações financeiras globais.
A Receita informa que serão disponibilizados leiautes e manuais no site do Sped para auxiliar no processo de implementação das mudanças.
Decisão do STJ sobre stock options pode esvaziar transação sobre o tema
Data: 18/09/2024
É duplamente amarga para a União a decisão, tomada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no último dia 11, de tributar de uma forma mais benéfica aos contribuintes as stock options. Além de significar uma redução de tributação a longo prazo, o entendimento pode esvaziar uma das transações tributárias do Programa de Transação Integral (PTI), divulgado pela Fazenda no final de agosto e ainda pendente de regulamentação.
O PTI prevê a abertura de pelo menos 17 transações relacionadas a grandes temas em discussão na Justiça e na esfera administrativa, com expectativa de arrecadação de R$ 30 bilhões, de acordo com o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2025. Entre eles estão a incidência de Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) e de contribuição previdenciária sobre as stock options.
A decisão do STJ abarca parte do assunto, ao abranger o IRPF. Com base na tese firmada pela Corte, entretanto, interlocutores próximos ao tema imaginam que, futuramente, o mesmo entendimento deve ser tomado para a contribuição previdenciária. Assim, desistir de casos para aderir à transação sobre esse tema pode se demonstrar pouco vantajoso aos contribuintes.
Não é possível saber quanto dos R$ 30 bilhões corresponde à tese das stock options. De acordo com uma fonte da Fazenda, o tema, em termos de valor, não é o maior entre os previstos no PTI. Há, porém, um número relevante de ações sobre o assunto em tramitação. Em 2023, quando a controvérsia foi indicada como repetitiva no STJ, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou que constavam mais de 500 processos sobre a controvérsia na Justiça Federal. O número não abarca a esfera administrativa, na qual é frequente o debate sobre a natureza das stock options.
Entendimento sob o rito dos repetitivos
No dia 11, após analisar os REsps 2069644/SP e 2074564/SP (Tema 1226), a 1ª Seção do STJ considerou que as stock options – opções de compra de ações oferecidas por companhias como forma de reter ou atrair funcionários – não têm caráter remuneratório. Ainda, para a maioria dos ministros, a tributação pelo IRPF deve ser feita apenas no momento em que há a venda das ações, já que é neste momento em que há acréscimo patrimonial.
O entendimento foi tomado sob o rito dos recursos repetitivos, o que significa que a posição vincula o Judiciário – com exceção do Supremo Tribunal Federal (STF) – e o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).
A União pode recorrer da decisão por meio de embargos de declaração, que dificilmente alteram o mérito dos casos, ou tentar levar o assunto ao Supremo. Mesmo que, em um cenário hipotético, o STF altere o que o STJ decidiu, porém, até lá o que vale é a posição tomada no repetitivo. Ou seja, a tendência é que todos os processos sobre stock options, desde que se encaixem nos termos da decisão do STJ, sejam julgados de forma favorável aos contribuintes na Justiça e na esfera administrativa.
Em relação à contribuição previdenciária, há um processo indicado como candidato a ser julgado sob o rito dos repetitivos, o REsp 2161509. Pela forma como a tese relacionada ao IRPF foi fixada pelo STJ, entretanto, tributaristas imaginam que o resultado em relação ao tributo também seja favorável aos contribuintes.
O entendimento tem como base o fato de o STJ ter reconhecido que as stock options não têm caráter salarial. A decorrência lógica desse posicionamento, para tributaristas, seria o afastamento também da contribuição previdenciária, que incide sobre a remuneração do trabalhador.
O relator dos recursos analisados no dia 11 pelo STJ, ministro Sérgio Kukina, chegou a afirmar durante a apresentação de seu voto que baseou seu entendimento na posição do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que tem efeitos em relação à contribuição previdenciária.
“Fui me abeberar também na jurisprudência da Corte trabalhista, que, de algum modo, se consolidou no sentido de não reconhecer o caráter remuneratório [das stock options], inclusive para fins de incidência da contribuição previdenciária, que não está em causa [no julgamento do STJ]”, afirmou Kukina.
Por fim, tributaristas acreditam que há pouco espaço para que, apesar da fixação do texto, os contribuintes tenham que recorrer ao Judiciário ou à esfera administrativa para provar que o repetitivo se aplica aos seus casos concretos. Antes do julgamento sobre stock options no STJ, um dos temores era que, em caso de decisão favorável aos contribuintes, fosse fixada uma tese muito específica.
Porém, o texto redigido, na opinião de fontes próximas ao caso, deixa claro que as stock options, independentemente das peculiaridades do caso concreto, não têm caráter salarial. “[A tese] prevê de forma bem clara a natureza mercantil [dos planos de stock options] e está focada no momento da ocorrência do fato gerador do Imposto de Renda, que independe da natureza jurídica nesse caso, pois não há disponibilidade de renda no exercício”, afirma a advogada Thaís Veiga Shingai, sócia de Mannrich e Vasconcelos Advogados e consultora técnica da Abrasca. A entidade atua como amicus curiae no repetitivo.
https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/coluna-barbara-mengardo/decisao-do-stj-sobre-stock-options-pode-esvaziar-transacao-sobre-o-tema
Governo reabre programa de repatriação de recursos
Data: 19/09/2024
Pessoas físicas e empresas têm 90 dias para aderir ao novo programa de regularização tributária do governo federal. Publicada na terça-feira, a Lei nº 14.973 reabre o prazo para a adesão ao Regime Especial de Regularização Geral de Bens Cambial e Tributária (RERCT-Geral). Dessa vez, além da repatriação de bens não declarados no exterior, será possí vel regularizar rendimentos não declarados no Brasil. Especialistas ainda entendem que políticos e parentes passam a poder aderir ao programa.
Na prática, a norma permite que esses recursos sejam regularizados com o pagamento de 15% de Imposto de Renda e 15% de multa. Em condições normais, no caso de pessoa física, o IR poderia chegar a 27,5% e a multa, após autuação, a 75%.
A primeira edição do RERCT aconteceu no ano de 2016 e gerou arrecadação de R$ 45 bilhões. No ano seguinte, houve uma segunda rodada, que arrecadou bem menos do que o esperado. Agora, a Receita Federal não informa quanto pretende receber por meio do programa mas, como ele está mais abrangente, o mercado o considera como mais um meio de o governo federal alcançar o déficit zero.
A nova legislação só especifica mudanças na data de corte dos recursos que podem ser abrangidos pelo RERCT. Agora é 31 de dezembro de 2023. Mas, segundo a Receita Federal, detalhes virão na regulamentação da legislação.
Segundo a especialista Thaís Françoso, do escritório FF Advogados, só depois que aderiram ao programa de repatriação muitos perceberam que deixaram alguns ativos de fora, mas não podiam fazer a retificação. “Outros optaram por não aderir em 2016 por uma incerteza com o que aconteceria de fato”, afirma. Havia temor, acrescenta, principalmente em relação a eventuais consequências na esfera penal.
Thaís explica que quem não tinha declarado ativos deverá pagar só os 15% de IR sobre o seu valor atualizado, até 31 dezembro de 2023, e a multa de 15%. E quem descobriu que declarou de forma incompleta no RERCT recolherá esses mesmos percentuais sobre o valor da complementação. “Nesse caso, porém, será somada uma multa moratória de 20%”, diz.
Para ficar 100% regular, a advogada afirma que rendimentos e frutos de ativos lá fora, de 31 de dezembro de 2023 até a data da adesão ao programa, poderão ser enquadrados pela denúncia espontânea. “Assim sobre esse valor específico incidirá apenas o IR e os juros Selic, sem multa”, diz.
Contudo, muitas das questões debatidas em 2016 e 2017 devem se repetir, segundo Thaís. Por exemplo, apesar da possibilidade de repatriação de ativos em nome de terceiros lá fora, desde que se comprove a relação entre os envolvidos, se houver transferência de titularidade, poderá haver cobrança de ITCMD pelos governos estaduais.
Além disso, pessoas físicas que, após regularizarem offshore no exterior pelo RERCT, pagarem até 22,5% de Imposto de Renda sobre o valor decorrente da extinção da sociedade, por considerar esse dinheiro como “ganho de capital”, serão autuadas. Segundo a Solução de Consulta da Coordenadoria-Geral de Tributação (Cosit) da Receita nº 678, o montante restituído é “rendimento”. Portanto, o IR é o da tabela progressiva de até 27,5%.
A advogada também aponta que continua a importância de se fazer um dossiê que comprove a licitude dos valores repatriados para o caso de uma eventual fiscalização. “O ônus da prova para demonstrar que a declaração do contribuinte é falsa é da Receita Federal, mas ele pode ser fiscalizado por cinco anos”, diz.
Sobre a adesão de políticos, funcionários públicos e os respectivos parentes, a advogada Priscila Farisco, do Viseu Advogados, aponta que a nova legislação faz remissão ao RERCT de 2016, mas se refere especificamente a alguns artigos, não inteiramente à Lei 13.254, “assim é possível interpretar que a vedação que se referia a políticos e parentes não existe mais”.
Para Priscila, o RERCT será útil especialmente para essas pessoas e para quem precisar complementar a repatriação. “O sistema não permitia a declaração de ativos no RERCT, por exemplo, por pessoas em processo de malha fina, quando o programa foi aberto pela primeira vez”, afirma.
Outro ativo que poderá ser declarado agora, diz Priscila, são criptomoedas. “A transferência para exchange no exterior não pede declaração dos ativos no país da pessoa física”, afirma ela, acrescentando que, em relação a outros ativos, isso mudou. “Bancos e fiduciários passaram a exigir a declaração de ativos no país de origem”, afirma. Segundo ela, isso acontece porque vários países celebraram acordos de troca de informações, especialmente para evitar a entrada de dinheiro de tráfico ou terrorismo, após a tragédia de 11 de setembro.
Já Caio Morato, advogado tributarista do Rayes & Fagundes Advogados Associados, destaca a possibilidade de regularização de rendimentos resultantes de operações realizadas no Brasil, como empréstimos com juros, venda de imóveis, de embarcações ou aeronaves e aquisição de cotas de fundos de investimento, sem declaração à Receita Federal. “O RERCT permite que a pessoa física recolha o IR sobre esses rendimentos com alíquota de 15% mais multa de 15%, em vez de alíquota de 27,5% de IR mais 75% de multa, no caso de autuação”, diz.
O ideal, afirma Morato, é já começar a passar um pente fino nas operações, calcular o IR e a multa e reservar o dinheiro, mas esperar a regulamentação da Receita, “o que deve ser publicado logo porque o prazo para adesão ao programa está correndo desde a publicação da lei”.
Uma grande preocupação dos contribuintes em relação ao RERCT, em 2016, eram os reflexos penais. Era a primeira vez que o Brasil aceitava a ideia de regularização isentando as pessoas de possíveis crimes que dissessem respeito a omissão de valores, evasão de divisas, sonegação fiscal e lavagem de dinheiro. “Isso aconteceu porque a lei anterior nasceu em um momento em que diversos Estados, logo após a crise econômica de 2007, acabaram aceitando o processo de transparência fiscal internacional para se saber onde cada nação tinha nacionais com dinheiro”, diz Renato Silveira, advogado e professor de direito penal da USP.
Segundo Silveira, a nova lei estabelece um novo regime de regularização tributária com o benefício da anistia criminal. Contudo, agora, sem as travas que existiam antes, como a limitação a políticos ou funcionários públicos. “Tem uma certa lógica a dispensa dessas travas porque hoje existe uma preocupação fundamental arrecadatória”, afirma. “O que impede que isso seja questionado por algum órgão”, acrescenta.
De acordo com o professor, se não houver provas de que o dinheiro é de origem ilícita, políticos e servidores públicos poderão agora aproveitar o RERCT. Porém, para ele, o cuidado da fiscalização deverá ser redobrado. “Por parte dos contribuintes, uma avaliação tributária-criminal daria maior garantia para a regularidade do que é declarado.”
STJ vai analisar regras do Perse por meio de recursos repetitivos
Data: 19/09/2024
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu afetar como repetitivos recursos que discutem dois pontos importantes do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse): se é necessário o contribuinte estar previamente inscrito no Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur), do Ministério do Turismo, para poder usufruir dos benefícios previstos e se os optantes do Simples Nacional também têm direito à alíquota zero de Imposto de Renda (IRPJ), CSLL, PIS e Cofins. Essas questões serão definidas pelos ministros da 1ª Seção.
O Perse foi criado por meio da Lei nº 14.148, de 2021, para compensar os setores de eventos e turismo pelo impacto financeiro causado pelas medidas de isolamento social decretadas em razão da pandemia da covid-19. Além da alíquota zero dos tributos federais, o programa estabeleceu o parcelamento de débitos tributários e de FGTS em 145 meses, com até 70% de desconto.
Com a regulamentação da norma que, segundo especialistas, acresceram exigências não previstas, e alterações trazidas por novas leis do Perse – nº 14.592, de 2023, e nº 14.859, editada neste ano -, vários pontos do programa foram questionados na Justiça. Esses dois abrangidos pelos recursos repetitivos, afirmam, são apenas parte do problema.
A exigência do Cadastur, por exemplo, foi levada ao Judiciário antes da edição das novas leis por duas associações de bares e restaurantes, a Associação Nacional de Restaurantes (ANR) e a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel). Foram ajuizadas, segundo o advogado que as defende, Sandro Machado dos Reis, sócio do Bichara Advogados, quatro ações, duas para cada entidade – uma para empresas nos regimes do lucro presumido e real e outra para as que estão no Simples.
Há, por ora, uma sentença favorável ao setor, concedida pela 5ª Vara Federal Cível de Belo Horizonte, que beneficia as empresas no lucro real e lucro presumido. O juiz Fabiano Verli entendeu que quando o Ministério da Economia, por meio da Portaria ME 7.163/21, além de prever as atividades (CNAEs) habilitadas ao benefício, estabeleceu a exigência de prévia regularidade no Cadastur, “extrapolou o poder regulamentar atribuído pela lei, razão pela qual tal disposição padece de vício” (processo nº 1031844-60.2022.4.01.3800).
Para Reis, ambos os temas elencados pelo STJ “são muito relevantes para os contribuintes”. Na lei [nº 14.148, de 2021], não houve qualquer restrição, especialmente no que se refere ao Cadastur”, diz ele, acrescentando que, porém, “o tema relativo a ilegalidade de atos infralegais que impuseram a segregação de receitas não está dentre os temas afetados”.
O advogado Ilan Gorin, da Gorin Advocacia, lembra que esse tema estava entre os que o presidente da Comissão Gestora de Precedentes e de Ações Coletivas do STJ, ministro Rogerio Schietti Cruz, listou para julgamento por meio de recursos repetitivos. Sugeriu-se abordar se a Instrução Normativa nº 2.114, de 2022, editada pela Receita Federal, teria promovido restrições indevidas, por excluir as optantes do Simples Nacional e dispor sobre quais receitas poderiam ser incluídas no Perse.
“São restrições que não estão previstas na lei original do Perse”, afirma o advogado, que espera que a discussão sobre a possibilidade de uma empresa mista ter o direito ao benefício fiscal sobre todo o seu faturamento esteja no voto da relatora da proposta de afetação, a ministra Maria Thereza de Assis Moura, que ainda será publicado.
Gorin ainda tem a expectativa de que sejam acrescentados ao julgamento dois temas importantes, “por estarem interligados”: a omissão dos CNAEs das atividades indiretas e a manutenção do benefício original por cinco anos – discussão que envolve o artigo 178 do Código Tributário Nacional (CTN).
A decisão de afetar como repetitivos os recursos sobre o Perse – seis no total- foi definida em sessão virtual realizada entre os dias 11 e 17 (REsp 2144088). A decisão, quando tomada, deverá ser seguida por todas as instâncias do Judiciário.
O julgamento do STJ, lembram advogados, pode impactar o programa de autorregularização lançado pela Receita Federal – Lei nº 14.859, de maio. O prazo para adesão vai até 18 de novembro. Podem ser incluídos os débitos apurados entre março de 2022 e maio deste ano do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins.
Embora não haja estimativas de arrecadação ou do volume de empresas em situação irregular, a Receita Federal divulgou que as isenções relacionadas a esse programa chegaram a R$ 7,9 bilhões no acumulado de janeiro a junho deste ano.
Para Gabriel Paranaguá, sócio do Felsberg Advogados, a afetação de recursos especiais pelo STJ poderá desestimular a adesão por contribuintes que eventualmente sejam impactados pelo posicionamento que será adotado pelos ministros. “Aqueles que eventualmente tenham aplicado o Perse às atividades restringidas sem base legal, poderão desistir de seguir com a autorregularização e aguardar a decisão do STJ para confirmar se estavam certas ou não em sua interpretação”, diz.
Frederico Bastos, sócio do escritório BVZ Advogados, afirma que a afetação deve influenciar a decisão principalmente dos contribuintes que estão no regime do Simples e os que não tinham inscrição prévia no Cadastur. “Isso porque a decisão do repetitivo recairá sobre esses dois pontos específicos.”
Eduardo Rehder Galvão, do GBA Advogados Associados, entende, porém, que o julgamento do STJ “não influirá na tomada de decisão do empresário que optou lá atrás em correr o risco inserindo sua empresa em um programa que ele sabia que não fazia jus ou que ele entendia que poderia ser questionado”.
“O que aconteceu no Perse é um fenômeno tipicamente brasileiro. Empresas sabiam que estavam aderindo a um regime tributário que exigia critérios que elas não atendiam. Uma medida emergencial que foi adotada por alguns para tentar reduzir a tributação, mesmo sabendo que, no futuro, poderia existir questionamentos por parte da Receita Federal. Essas empresas vão aderir ao programa de autorregularização”, afirma o advogado.
Para aderir, é preciso quitar 50% do montante devido do imposto à vista. O restante pode ser parcelado em até 48 vezes. Não incidirá nenhum juro de mora ou multa sobre o valor devido, e as empresas podem usar o prejuízo fiscal e a base de cálculo negativa da CSLL convertido em crédito para abater até metade do valor da dívida consolidada.
Levantamento mostra quais estados serão mais impactados por mudanças no ITCMD e ITCD
Data: 19/09/2024
Os contribuintes de dez estados serão os mais impactados pelas mudanças nas regras referentes à tributação de doações e heranças — o ITCMD ou ITCD. São eles: Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Espírito Santo, Paraná, Piauí, Rio Grande do Norte, Roraima e São Paulo.
É o que revela levantamento realizado pelo escritório André Teixeira, Rossi, Andrade, Saadi Advogados, que avaliou os efeitos de eventual elevação das alíquotas que incidirão sobre a transmissão de propriedade a título de herança e doação em estados onde o imposto é fixo e a alíquota máxima ainda está distante do teto atual de 8%, percentual determinado pelo Senado.
Os estados destacados no levantamento têm, atualmente, as menores alíquotas do imposto sobre heranças e doações do país e ainda não adotaram a regra do imposto progressivo, estabelecida como obrigatória pela reforma tributária.
No Amazonas, por exemplo, onde o imposto tem alíquota de 2%, as novas regras podem representar para o contribuinte um aumento de até quatro vezes o valor do tributo atual.
Em Alagoas, há alíquota fixa de 2% para doação e de 4% sobre heranças. O tributo pago pelo contribuinte, portanto, poderá quadriplicar nas doações e dobrar nos casos de herança. A situação é semelhante em outros estados que ainda não adotaram o imposto progressivo ou cujas alíquotas máximas não estejam fixadas no teto de 8%.
“Com a reforma, os estados que ainda não preveem progressividade nas suas alíquotas serão obrigados a fazê-lo”, diz o alerta o advogado Bernardo de Vilhena Saadi, à frente do levantamento.
“Além disso, todos os estados passaram a ter a possibilidade de tributar heranças e doações recebidas no exterior. Hoje cada unidade da federação é livre para estabelecer quaisquer alíquotas até o limite de 8% estabelecido pelo Senado, mas o Projeto de Lei Complementar 108/2024, prevê que os Estados regulamentem o que configura ‘grande patrimônio’ e este, necessariamente, deverá ser submetido ao teto de 8%.”
Esta regra vale também para os estados que adotaram a progressividade e cuja alíquota máxima está muito abaixo do teto de 8%. É o caso do Maranhão, cuja alíquota máxima para doação é de 2%.
Todas essas mudanças irão vigorar no ano seguinte às respectivas aprovações em cada estado, esclarece Saadi, lembrando, ainda, que existe um Projeto de Resolução que tramita no Senado com o objetivo de elevar o limite máximo deste imposto para 16% o que permitiria que os estados estabelecessem alíquotas até este percentual. “Essa é uma tendência mundial de aumento da tributação sobre renda, patrimônio, heranças e doações. As mudanças legislativas também começam a ser introduzidas no Brasil com esta finalidade”, avalia.
Antecipação
Para tentar fazer com que a sucessão patrimonial pese menos no bolso, muitos contribuintes antecipam a transmissão do patrimônio para pagar uma alíquota menor antes do aumento, além dos custos adicionais relacionados a um processo de inventário.
“Por meio de diversos instrumentos legais, pode-se garantir ao doador controle sobre o patrimônio doado. Há possibilidade, também, de aumentar ou diminuir quinhões de herdeiros, determinar que bens cada herdeiro receberá e estipular regras de governança em sociedades operacionais ou patrimoniais evitando potenciais litígios futuros”, conclui Saadi.
https://www.conjur.com.br/2024-set-19/levantamento-mostra-quais-estados-serao-mais-impactados-por-mudancas-no-itcmd-e-itcd/
Reforma tributária provoca elaboração de proposta de mudanças na legislação penal
Data: 20/09/2024
A aprovação da reforma tributária incentivou a elaboração de uma proposta para a área penal. Um grupo de mais de 20 especialistas da FGV Direito SP – entidade que também participou da construção do texto original que resultou na Emenda Constitucional nº 132, de 2023 – já iniciou pesquisas em outros países, como Espanha, Portugal, Alemanha e Itália, para propor mudanças na esfera penal tributária.
Um dos objetivos concretos da pesquisa é afastar o entendimento de que não há crime enquanto não finalizado o processo administrativo tributário (Súmula Vinculante nº 24 do Supremo Tribunal Federal). “Na prática, hoje, torna o crime tributário imprescritível”, afirma Heloisa Estellita, uma das coordenadoras da pesquisa, que também estudam, por exemplo, a necessidade de criação de novos tipos de crimes puníveis ou aumento de penas de crimes que já existem.
A íntegra da proposta da equipe da pesquisa “Evasão Fiscal: uma proposta legislativa para debate” do Núcleo de Direito Penal e Processual Penal da FGV Direito SP deverá estar disponível ao público em até dois anos. A ideia é que ela seja abraçada por algum parlamentar para ser transformada em projeto de lei.
A reforma tributária, instituída pela Emenda Constitucional nº 132, aprovada no fim do ano passado, tem como principal objetivo simplificar o atual sistema. Ela cria, por exemplo, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) para ficar no lugar do ICMS, ISS, PIS e Cofins. Agora, a regulamentação está em discussão no Congresso: os projetos de lei complementar (PLPs) nº 68 e nº 108.
Uma das medidas da reforma tributária que pode impactar os contribuintes na esfera penal, aponta Heloisa, é que o contribuinte vai passar a receber dinheiro do Estado. Isso porque a compensação de benefícios fiscais será feita por meio de repasses do governo às empresas. “Fraudes que ocorreram nos países europeus devem acontecer aqui, como operação simulada para gerar direito à devolução de IVA”, diz ela. “Poderá ser necessária a criação de novos tipos penais”, acrescenta.
O PLP 68, já aprovado na Câmara dos Deputados e em discussão no Senado, cria uma espécie de nova representação para fins penais para o caso específico de apuração de irregularidade da lei tributária (artigo 395). Segundo o dispositivo, a Receita Federal deve informar ao Ministério Público a suspeita de prática de crime tributário em até 10 dias após a emissão do auto de infração relativo à compensação de benefícios fiscais do ICMS na transição para o novo sistema CBS/IBS. Porém, esse mecanismo já existe na Lei nº 9.430/96 (artigo 83) e poderia gerar duplicidade de investigações penais.
De acordo com Heloisa, se estuda uma punição diferenciada na fase de transição da reforma tributária, período de sete anos durante o qual o contribuinte terá que conviver com dois sistemas tributários diferentes ao mesmo tempo. “Na Itália, por exemplo, em caso de controvérsia, a infração não é punida na esfera penal, só no âmbito administrativo”, d iz a advogada.
Na Espanha, segundo Fernanda Vilares, também coordenadora da pesquisa e procuradora da Fazenda Nacional, há uma cláusula de aumento da pena para o crime de fraude à execução tributária. O tema também está na pauta da pesquisa. “A experiência de atuação como procuradora e gestora de dívida nos deu a convicção de que as empresas usam o não pagamento como estratégia de negócio. Atualmente, nosso problema são os grandes planejamentos que tentam maquiar as operações ou estratégias de blindagem patrimonial”, afirma.
Por outro lado, ao contrário do que acontece hoje, uma nova norma poderá delimitar melhor quais administradores podem ser acusados de crime. “Não é um problema da reforma, mas não existe norma no Brasil para determinar a transferência da responsabilidade penal para o administrador de fato, como há na Alemanha, Espanha e Itália”, diz Heloisa. “A consequência, hoje, no país, é que o Ministério Público direciona a investigação a todos os dirigentes.”
Uma nova legislação, afirma Heloisa Estellita, pode evitar que quem não tem nada a ver com a fraude não seja mais forçado a fazer acordo com o MP, mesmo sem responsabilidade, só para se livrar do risco de prisão.
Para Renato Stanziola Vieira, sócio do Kehdi Vieira Advogados e presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCRIM), a ref orma tributária pode ser uma janela de oportunidade para necessárias mudanças na legislação penal. “A reforma tributária veio para dar transparência e simplificação, assim é uma chance de também simplificarmos o atual cipoal de normas penal tributárias”, diz.
Uma reforma penal, afirma o especialista, poderia acabar com o uso ilegítimo da pena para fim de arrecadação. “Um exemplo é a punição do substituto tributário em vez do sonegador. O resultado disso são idas e vindas de programas de parcelamento tributário.”
Outro item que poderia ser abordado nessa proposta, segundo Vieira, é o uso de órgãos como o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para a obtenção de informações sigilosas dos contribuintes, sem autorização judicial.
Já Renato Silveira, advogado e professor de Direito Penal da USP, destaca a atual questão da extinção de punibilidade penal com o pagamento do tributo devido. “Desde a década dos anos 90, essa discussão gera enorme controvérsia porque o Direito Penal não deveria servir para arrecadar dinheiro”, afirma. “Poderia-se limitar o uso disso uma vez a cada cinco anos, por exemplo, para evitar um sistema disfuncional.”
Fiscalização da Receita Federal orienta contribuintes sobre o uso correto de subvenções para investimentos
Data: 20/09/2024
O tratamento das subvenções para investimento na apuração do lucro real passou por mudanças significativas com a promulgação da Lei nº 14.789, de 29 de dezembro de 2023. A Fiscalização da Receita Federal intensificou ações com vistas a alertar contribuintes sobre a oportunidade de autorregularização, além de fiscalizar irregularidades identificadas na vigência do art. 30 da Lei nº 12.973, de 13 de maio de 2014, tratamento tributário anterior. Situações identificadas em casos concretos são apontadas e podem orientar os contribuintes sobre o uso correto desse benefício fiscal.
Evolução normativa
A norma revogada permitia que, sob determinadas condições, a subvenção recebida não fosse computada na determinação do lucro real e na apuração de base de cálculo da CSLL.
Com a sua revogação pela Lei nº 14.789, de 2023, todos os tipos de subvenções recebidas a partir de 2024 passam a ser tributados pelo IRPJ e pela CSLL. Em compensação, as pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real que recebem subvenção da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios para implantar ou expandir empreendimento econômico podem apurar crédito fiscal de subvenção para investimento, correspondente ao produto das receitas de subvenção e da alíquota de 25% relativa ao IRPJ, desde que observado o disposto na legislação.
A nova legislação introduziu também a possibilidade de transação tributária especial para os débitos apurados em virtude de exclusões em desacordo com o art. 30 da Lei nº 12.973, de 2014, sendo concretizada no edital de transação por adesão no contencioso tributário de relevante e disseminada controvérsia jurídica nº 4/2024. Os contribuintes podem aderir à proposta até as 19h do dia 30 de setembro de 2024.
Em outra inovação, a Lei nº 14.789, de 2023, instituiu ainda a possibilidade de autorregularização incentivada para esse tipo de infração fiscal, desde que efetuada antes do lançamento do crédito tributário. O tema foi regulamentado pela Instrução Normativa nº 2.184, de 2 de abril 2024, que estabeleceu, entre outros, os períodos de adesão e as medidas necessárias para a autorregularização.
Contornos da norma vigente até 2023
No que tange à possibilidade de a subvenção recebida deixar de ser computada na determinação do lucro real e na apuração da base de cálculo da CSLL no regime anterior, a disciplina estava normatizada pelo art. 30 da Lei nº 12.973, de 2014, ao qual foram incluídos os §§ 4º e 5º pela Lei Complementar nº 160, de 2017, para dar contornos específicos aos incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao ICMS.
A área de Fiscalização da Receita Federal vem monitorando eventuais irregularidades praticadas pelos sujeitos passivos e identificando indícios de exclusões a título de subvenções para investimento efetuadas em desconformidade com o art. 30 da Lei nº 12.973, de 2014.
Alertas e outras ações para estimular a conformidade
Na busca por estimular o cumprimento voluntário das obrigações tributárias, centenas de alertas de conformidade foram encaminhados para grandes contribuintes sujeitos a controle diferenciado em maio de 2023. Além disso, a RFB vem orientando os contribuintes em geral e os profissionais especializados mediante a participação em painéis voltados ao tema em Congressos de Direito Tributário e em palestras demandadas por Conselhos Regionais de Contabilidade.
Ações após alertas
Para os contribuintes com indícios dessa infração fiscal que não se autorregularizaram, foram retomadas as atividades de fiscalização, que se estendem ao momento atual, já havendo novos autos de infração lavrados. Em recente levantamento, foram identificadas mais de 80 autuações, num montante global de R$ 8,74 bilhões de crédito tributário, e quase 200 outros procedimentos estão em andamento.
Lembra-se, por oportuno, que permanece válida a possibilidade de autorregularização, ainda que agora sem a aplicação do incentivo legal específico, enquanto não iniciado procedimento de fiscalização, o que evita incidência de eventual multa de ofício.
Irregularidades identificadas
Com o intuito de orientar os contribuintes para a conformidade por meio da autorregularização fiscal, a Subsecretaria de Fiscalização aponta, a seguir, alguns dos principais tipos de exclusões indevidas a título de subvenção para investimentos identificadas e que, na análise dos auditores-fiscais, não encontram amparo jurídico na legislação fiscal, tampouco na jurisprudência qualificada do Superior Tribunal de Justiça:
Em relação ao crédito presumido de ICMS:
Crédito presumido concedido em substituição aos créditos efetivos de ICMS sobre as entradas
Somente o benefício fiscal do crédito presumido de ICMS é passível de exclusão na determinação do lucro real a título de subvenção para investimento ou simplesmente como incentivo fiscal. Nas situações em que parte do crédito presumido de ICMS não representa benefício fiscal, essa parte não é passível de exclusão na apuração das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL. São exemplos de tais situações:
Por vezes, o crédito presumido de ICMS é escriturado em decorrência de regimes especiais previstos em legislação estadual. Trata-se de uma opção que vem em substituição ao método ordinário de apuração do ICMS a recolher (débitos por saída menos créditos por entradas). Por essa opção, o contribuinte renuncia ao seu direito aos créditos básicos pelas entradas. O benefício fiscal resultante, portanto, não é todo o crédito presumido escriturado, mas tão-somente o valor que eventualmente supera o crédito básico de ICMS que deixou de ser apropriado (inclusive porque o crédito básico estornado, ou simplesmente não escriturado, passa a integrar o custo de aquisição das mercadorias). Nessa situação, o benefício fiscal representa a diferença entre o valor de ICMS que o contribuinte recolheria na sistemática da não cumulatividade e o valor que ele efetivamente recolheu por aderir ao regime especial.
2. Crédito presumido escriturado em regime simplificado aplicável ao setor de transportes
Na hipótese do Convênio ICMS nº 106, de 1996, aplicável ao setor de transportes, exceto aéreo, a pessoa jurídica pode optar por regime simplificado de apuração do ICMS, desde que o faça para todos os seus estabelecimentos do território nacional. Por esse regime, aproveita-se um crédito presumido de 20% do valor do ICMS devido na prestação em detrimento de quaisquer outros créditos, inclusive os créditos básicos de ICMS pelas entradas. Trata-se de créditos presumidos ditos “operacionais”, concedidos com a finalidade de simplificar o cumprimento das obrigações relativas à apuração do imposto. Nessa situação, a totalidade do crédito presumido de ICMS não se configura um benefício fiscal, mas somente simplifica a sistemática de apuração do imposto estatual.
3. Contribuições obrigatórias a fundos estaduais
Deve-se considerar na quantificação do benefício fiscal auferido a eventual existência de contribuições obrigatórias a fundos instituídos e administrados pelo próprio ente tributante do ICMS, a partir do Convênio ICMS nº 42, de 2016. Na situação em que a legislação estadual prevê que a contribuição é obrigatória para apropriação dos créditos presumidos, ela se reveste da mesma natureza jurídica do ICMS, configurando uma diminuição do montante do benefício fiscal concedido. Portanto, essa contribuição ao fundo deve ser diminuída na apuração do montante a ser excluído para fins de determinação do lucro real.
4. Em relação as espécies de desoneração total ou parcial de incidência do ICMS
Em razão do regime constitucional e legal do ICMS, o contribuinte de direito do ICMS não é quem suporta jurídica e economicamente o seu ônus, salvo raras hipóteses legais. Essa característica do ICMS levou o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar a tese jurídica posta em julgamento no Tema nº 69, a concluir que o ICMS não integra a receita do seu contribuinte, nem ele se agrega ao seu patrimônio, representando mero ingresso de caixa para o qual coexiste a obrigação de repasse do mesmo valor ao ente tributante, ou um “simples trânsito contábil”.
As espécies de desoneração do ICMS, tais como isenção, redução de base de cálculo ou redução de alíquota, por sua vez, produzem como efeito, em relação ao montante do ICMS desonerado, a inocorrência do seu ingresso no caixa do contribuinte ao mesmo tempo que evitam o surgimento da obrigação de repasse ao Estado ou DF. Consequentemente, não há “resultado de benefício” em decorrência da ausência de mero trânsito do ICMS pelas contas do vendedor.
Percebe-se, assim, que – tanto na operação onerada de ICMS quanto na desonerada – não há qualquer repercussão de natureza fiscal no patrimônio do contribuinte do ICMS. A compreensão de que o ICMS que incide na operação não se incorpora ao patrimônio do vendedor necessariamente traz consigo ao entendimento de que em uma situação de não incidência do ICMS, por isenção ou redução de alíquota ou de base de cálculo, simplesmente não há qualquer valor de imposto apto a se incorporar ao patrimônio do vendedor.
Desse modo, porque inexiste recebimento ou resultado de benefício fiscal por meio das espécies de desoneração do ICMS para o vendedor da mercadoria, tal situação também não configura subvenção governamental. Logo, qualquer exclusão do lucro real a esse título, seja no regime legal anterior, seja no regime atual, torna-se arbitrária e sem amparo legal.
Efeito idêntico se verifica nas operações imunes de ICMS, com a situação qualificadora que imunidade não é benefício fiscal, mas sim a decorrência da limitação constitucional ao poder de tributar. Ademais, ainda que, por hipótese, se tratasse de benefício fiscal, a não incidência do ICMS em operações de exportação ou remessa com o fim específico de importação, por exemplo, sequer seria um benefício ou incentivo concedido pelos Estados e pelo Distrito Federal, nos termos da redação do § 4º do art. 30 da Lei nº 12.973, de 2014, que vigorou até o ano-calendário 2023.
5. Em relação ao diferimento do ICMS para etapa subsequente
Assim como abordado no item anterior, a operação com diferimento do ICMS também não causa qualquer repercussão no patrimônio do contribuinte do ICMS. Além disso, o diferimento do ICMS sequer é tido como benefício fiscal, consistindo em mera técnica de tributação em que se procede a substituição tributária para trás, conforme jurisprudência do STF e do STJ (ADI 2056/MS, STF, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 17/08/2007; EREsp 1119205 / MG, STJ, S1 – Primeira Seção, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 08/11/2010).
https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/noticias/2024/setembro/comunicado-fiscalizacao-da-receita-federal-orienta-contribuintes-sobre-o-uso-correto-de-subvencoes-para-investimentos
Agenda do STF: Ministros voltarão a julgar alterações no Reintegra e validade do Funrural
Data: 22/09/2024
Estão na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF) desta semana dois julgamentos de impacto tributário bilionário. Na quarta-feira, os ministros podem voltar a analisar ação sobre o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural). Na quinta, o Plenário deve definir se as alíquotas do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras (Reintegra) podem ser reduzidas pelo governo federal.
No caso do julgamento do Funrural, o impacto para o caixa da União é previsto em R$ 20,9 bilhões, segundo o Anexo de Riscos Fiscais do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025.
Em 2018, a Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo) questionou a cobrança do valor devido por agropecuaristas a título de contribuição previdenciária, o Funrural, diretamente das empresas a quem essas pessoas prestam serviços.
Em 2023, a Corte definiu, por maioria de votos, que o imposto é devido, mas não houve consenso sobre o valor poder ser cobrado das empresas, ou se teria de ser recolhido junto às pessoas físicas — o que, na prática, pode inviabilizar a cobrança.
Votaram pela validade do Funrural e da sub-rogação (quando a contribuição é recolhida das empresas) os ministros Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Luix Fuz e Luís Roberto Barroso. O ministro Dias Toffoli votou pela constitucionalidade da contribuição, mas pela inconstitucionalidade da sub-rogação.
Já os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello conheceram parcialmente da ação, afastando a tributação. O voto do ministro Marco Aurélio foi computado nesse mesmo sentido.
A Advocacia-Geral da União (AGU), no entanto, chamou atenção para o fato de que Marco Aurélio, já aposentado, não se manifestou a respeito da sub- rogação. Assim, pelos cálculos dos contribuintes, haveria maioria pela validade da contribuição, mas não pela transferência dessa obrigação para as empresas. Para a Fazenda, no entanto, a maioria é favorável à sub-rogação.
Em 2023, em sessão convocada para a resolução desse impasse, Toffoli defendeu o ponto de vista dos contribuintes, alegando que, se o voto do ministro aposentado foi contra o imposto, também seria contra a sub-rogação. Já Barroso propôs que fosse ouvido o ministro André Mendonça sobre esse ponto, já que ele substituiu Marco Aurélio no Plenário. Sem consenso, a definição foi novamente adiada.
Reintegra
O impacto do julgamento sobre as alíquotas do Reintegra para os cofres da União é ainda maior, de R$ 49,9 bilhões em caso de derrota, de acordo com o Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO).
O programa foi instituído em 2011, pela Lei nº 12.546, para estimular as exportações com o reembolso de parte da carga tributária sobre produtos manufaturados. Inicialmente, foi previsto que a alíquota do crédito sobre a receita com vendas ao exterior iria variar entre 0,1% e 3%.
Em 2014, a Lei nº 13.043/2014 retomou o programa, permitindo ao governo redefinir a alíquota passível de recuperação pelas exportadoras. Sucessivas reduções levaram o patamar máximo para o piso da previsão original, de 0,1%. A Confederação Nacional da Indústria e o Instituto Aço Brasil, então, acionaram Supremo, afirmando que o Executivo pode alterar o percentual do crédito, mas não pode reduzi-lo sem justificativa relevante. Essa prática, dizem, contraria os princípios constitucionais da não exportação de tributos, da livre concorrência e da proporcionalidade (ADI 6040 e 6055).
O relator, ministro Gilmar Mendes, discordou dos argumentos das empresas e defendeu que o Reintegra tem uma natureza jurídica diferente das imunidades à exportação, garantidas pela Constituição Federal. Ele foi acompanhado por Alexandre de Moraes e Dias Toffoli.
Abriu a divergência o ministro Luiz Fux, para quem a nova metodologia do Reintegra aumenta a carga tributária. Até agora, ele foi acompanhado pelo ministro Edson Fachin.
Lei permite atualizar valor de imóvel e aplicar IR menor
Data: 23/09/2024
O governo federal permitiu aos contribuintes atualizarem os valores de bens imóveis para valor de mercado com o pagamento do Imposto de Renda por uma alíquota menor. O percentual reduzido seria de 4% para pessoas físicas (que normalmente pagam entre 15% a 22,5%) ou 10% para pessoas jurídicas (alíquota usual de 34%). A medida é mais uma contrapartida do governo para cumprir a meta fiscal frente a desoneração da folha salarial, trazida pela Lei nº 14.973/2024.
Essas alíquotas reduzidas, porém, só valerão para quem vender o imóvel depois de 15 anos. Antes desse prazo, o contribuinte só poderá usufruir de uma parcela proporcional do adiantado à Receita Federal. São previstas 14 faixas percentuais, que aumentam a depender do tempo em que o bem não é alienado.
Se a venda ocorrer em três anos, por exemplo, nada poderá ser aproveitado. Na prática, o contribuinte pagará mais imposto do que se não fizer a atualização, caso a venda ocorra no curto prazo.
Segundo advogados, a mudança pode ser benéfica, mas só para quem tem imóveis muito antigos e com a certeza de que não haveria alteração na titularidade do imóvel tão cedo.
Um levantamento da tributarista Joanna Rezende, sócia de Peluso, Guaritá, Borges e Rezende Advogados (PGBR), mostra que só após seis anos se igualaria a alíquota do tributo, no caso de pessoas físicas. Na prática, para quem vender o imóvel em até três anos, pagará os 4% agora e os 15% sobre o ganho de capital na próxima declaração do IRPF. “A alíquota efetiva fica 19%”, afirma Joanna. A adesão ao benefício e o efetivo pagamento do tributo deve ser feito em até 90 dias, diz a lei.
A medida é inédita, segundo ela. Algo semelhante ocorreu no ano passado, com a atualização dos investimentos em offshores, com a Lei nº 14.754/2023. Mas a nova previsão, afirma, não deve ter tanta aderência. “A lei veio com um desincentivo para quem quer vender o imóvel nos próximos meses, porque não se aproveita desse custo incrementado que teve com o aumento da base de cálculo.”
Para Joanna, a legislação também não esclarece como seria o aproveitamento do valor pago com a atualização após a morte do titular. “Não está claro se essa atualização presta para permitir que o filho receba o imóvel pelo valor de mercado e aproveite o valor do imposto pago”, adiciona. A medida, destaca, tem “intuito arrecadatório”.
Poucos contribuintes, segundo Gustavo Taparelli, sócio do Abe Advogados, devem aderir. “A legislação traz muita limitação para poder usar o benefício”, afirma. “Se eu pagar 4% e vender o imóvel ano que vem, não vou ter benefício nenhum.”
O advogado Rogério Fedele, do mesmo escritório, lembra que já existe previsão legal que permite a redução da base de cálculo do tributo pelo tempo em que a titularidade do imóvel é inalterada. Isso está disposto no artigo 40 da Lei nº 11.196, de 2005, e artigo 18 da Lei nº 7.713, de 1988. “Esse novo dispositivo não tem tanto apelo, porque as pessoas físicas já têm o benefício”, diz.
Também é possível não pagar IR sobre o ganho de capital se o intervalo de compra e venda de outro imóvel for menor que o de seis meses. Essa possibilidade consta no artigo 39 da Lei nº 11.196/2005 e na Instrução Normativa SRF nº 599/2005.
Para Taparelli, é preciso ainda “planilhar” e analisar caso a caso. “O que complica é o prazo de 90 dias para fazer as simulações. As famílias têm uma corrida contra o tempo para ver se faz sentido ou não.”
União altera correção de depósitos judiciais
Data: 23/09/2024
A União alterou o índice de correção dos depósitos judiciais, que deixa de ser a Selic, taxa usada desde 1998, para dar lugar a um “índice oficial que reflita a inflação” – como o IPCA. A medida está prevista na esperada lei sobre a desoneração da folha de pagamento (nº 14.973/2024), que prevê contrapartidas para ajudar o governo a cumprir a meta fiscal deste ano.
A mudança não foi bem-vista por advogados tributaristas, que a classificam como um “calote” contra quem litiga contra a União, se for aplicada nos valores hoje depositados – ou seja, de forma retroativa. A correção, até então, afirmam, era a mesma ou quase igual a uma aplicação financeira, como títulos do Tesouro Nacional e fundos indexados pelo CDI.
Não há clareza ainda, segundo os especialistas, se a mudança valerá apenas para os depósitos novos ou para os já existentes. Para os antigos, o entendimento predominante nos escritórios é que deveria ser preservada a correção pela Selic. Um ato do Ministério da Fazenda irá esclarecer questões procedimentais, diz a lei.
Com a nova norma, afirmam os tributaristas, o contribuinte não terá mais direito a receber os juros de mora – levando-se em consideração que a Selic compreende correção monetária e juros -, o que seria um tratamento anti-isonômico, já que os créditos tributários são corrigidos pela taxa básica. Hoje, a Selic está em 10,75%, enquanto IPCA, principal aposta dos tributaristas para o “índice oficial”, acumula 4,24% em 12 meses.
A legislação nova também ampliou o escopo dos depósitos. Pela lei anterior – a de nº 9.703/1998, que foi revogada -, a Selic só valia para ações sobre tributos e contribuições sociais. Agora, a nova correção se aplica para dívidas de qualquer natureza (não só tributárias) com a administração pública federal – quaisquer órgãos, fundos, autarquias, fundações ou empresas estatais federais.
A lei poderá afetar os R$ 217,6 bilhões em depósitos judiciais e extrajudiciais. O valor, informado pela Caixa Econômica Federal, são referentes a processos em que a União e toda a administração pública federal são parte. “Esses valores já são acolhidos pela Caixa e repassados à conta única do Tesouro Nacional em D + 1 pela sistemática da extinta Lei nº 9.703, de 1998, diz o órgão por meio de nota ao Valor, acrescentando que “aguarda a publicação de ato do Ministério da Fazenda que regulamentará os procedimentos”.
A advogada Gabriela Lemos, sócia do escritório Mattos Filho, afirma que a nova previsão legal desincentiva o uso de depósitos judiciais – o que prejudica a União a longo prazo, pois é um caixa de uso imediato. “Quando a União vence, o depósito é transformado em pagamento”, diz. Em caso de derrota, porém, o desembolso deve ser feito em 48 horas após o trânsito em julgado.
Agora, acrescenta, a atualização, que antes era pela Selic, será apenas pela inflação. “Isso tende a ser uma preocupação dentro da estratégia do contribuinte de discutir em juízo, porque a Selic é um índice composto. Se passa a ter a devolução dos valores pela inflação, perco a recomposição pelos juros”, afirma.
Os depósitos usados para garantir créditos tributários, por exemplo, diz Gabriela, têm o benefício de suspender a exigibilidade do tributo. Nos casos de seguro fiança e carta fiança, não. “A jurisprudência não tem permitido a não cobrança do imposto.”
Mas essa nova lei, segundo a advogada, pode ser um bom argumento para convencer o juízes a autorizarem a mudança da garantia no processo. “Pode trazer um novo elemento para esses pedidos, porque se fiz o depósito com a expectativa de rentabilidade futura e a regra muda no meio do jogo, faz sentido que haja revisão do posicionamento do contribuinte”, afirma.
Para o advogado João Rolla, sócio do Rodolfo Gropen Advocacia, não há mais a equidade que era prevista na lei anterior. “A União fica com seu dinheiro e usa livremente, ainda que provisione. E ela se remunera com a Selic [correção aplicada nos créditos tributários], então nada mais justo que a devolução do depósito seja feito com a Selic. A diferença entre Selic e índice oficial da inflação é gritante e brutal”, diz.
Uma parte positiva da mudança é pelo viés da tributação. João Rolla lembra de recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que afastou tributação de IRPJ e CSLL sobre correção monetária dos valores corrigidos em depósito judicial, para empresas no lucro real (Tema 962). Pela incidência da Selic, só seriam tributados os juros. Mas como agora a correção é pela inflação, não haveria mais a cobrança. “Agora vou receber menos dinheiro, mas não serei tributado”, afirma o advogado.
Na visão dele, “a União está fazendo um reforço não de caixa, mas de orçamento”. “O dinheiro do depósito já é livre para uso, mas a devolução teria que projetar a Selic. Agora, seria pela correção monetária, o que dá espaço orçamentário”, adiciona.
Segundo o tributarista Rafael Vega, do Cascione Advogados, a lei nova contraria a Súmula 523 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Tema 810 do STF, que já havia definido que a Selic seria o índice de atualização para depósitos. “O depósito era como se fosse uma aplicação financeira, só que a regra mudou no meio caminho, o que quebra a confiança e a segurança jurídica”, afirma.
Poderá haver agora, diz o advogado, uma “corrida ao Judiciário” para levantar esses valores, por não valer mais a pena. “Ter depósito neste cenário é queimar dinheiro.” A medida, acrescenta, pode funcionar para a União a curto prazo, mas, no futuro, prejudica, porque “ninguém vai querer mais fazer depósito e comprometer seu caixa”.
Procurados pelo Valor, a Receita Federal, Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e Ministério da Fazenda não deram retorno até o fechamento da edição. O Banco Central informou não ter dados sobre o assunto.
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FECP não pode ser considerado faturamento para cálculo de PIS e Cofins
Data: 16/09/2024
Por ser acessório à cobrança regular do ICMS, o adicional de alíquota destinado aos Fundos Estaduais de Combate à Pobreza (FECP) também não pode ser considerado receita ou faturamento para fins de incidência do PIS e da Cofins, em consonância com a decisão do Supremo Tribunal Federal no Tema 69, que consolidou a “tese do século”.
A partir desse entendimento, o juiz federal Marcelo Barbi Gonçalves, da 6ª Vara Federal do Rio de Janeiro, concedeu a segurança para declarar o direito de uma loja de roupas de excluir o FECP da base de cálculo para recolhimento do PIS e da Cofins.
Ônus não é faturamento
Ao citar a jurisprudência do STF, o magistrado destacou que o conceito de faturamento, à luz da Constituição, diz respeito à riqueza própria, “razão pela qual o adicional de ICMS destinado ao FECP não refletiria a riqueza obtida com a realização da operação, pois constituiria ônus do contribuinte e não faturamento”.
O juiz ainda autorizou a empresa “a obter a compensação, de acordo com o art. 170-A do CTN [Código Tributário Nacional], das importâncias indevidamente recolhidas pelo contribuinte, com juros e correção”.
“Caso o contribuinte venha optar pela restituição, a teor da Súmula nº 269 do STF, segundo a qual o mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança, a presente ordem judicial não alcança os indébitos anteriores à impetração, os quais deverão ser reclamados pela via judicial própria”, escreveu na decisão.
Atuou na causa o escritório MOADV — Moacyr Oliveira Advogados.
Processo 5033811-51.2024.4.02.5101
https://www.conjur.com.br/2024-set-16/fecp-nao-pode-ser-considerado-faturamento-para-calculo-de-pis-e-cofins/
TRF-3: Empresa deve recolher SAT/RAT sobre salário de aprendizes
Data: 18/09/2024
Acolhendo recurso da União, a 2ª turma do TRF da 3ª Região entendeu que jovens aprendizes são segurados obrigatórios do sistema SAT/RAT, impondo às empresas o dever de recolher tributos correspondentes aos valores pagos a esses trabalhadores.
No caso, a empresa impetrou MS para afastar a cobrança de contribuições ao SAT – seguro acidente de trabalho, RAT – risco ambiental do trabalho e a terceiros sobre salários de menores aprendizes.
O que são SAT e RAT? Tratam-se de contribuições previdenciárias pagas pelas empresas para financiar benefícios concedidos pela Previdência Social aos trabalhadores em caso de acidente de trabalho ou doenças ocupacionais.
A companhia argumentou que os menores aprendizes não deveriam ser considerados segurados obrigatórios para fins previdenciários, sustentando que o programa para menores assistidos, previsto no decreto-lei 2.318/88, não se confundiria com o contrato de aprendizagem regulamentado pela CLT.
Em 1ª instância, a sentença foi favorável à empresa, afastando a exigência de contribuições previdenciárias.
No entanto, a União recorreu defendendo que os menores aprendizes são segurados obrigatórios e que a empresa deveria recolher as contribuições devidas.
No voto, o relator, desembargador Federal Carlos Francisco, destacou que a questão central envolvia a interpretação dos conceitos constitucionais de empregador, trabalhador e folha de salários, além da aplicabilidade das contribuições previdenciárias aos rendimentos do trabalho.
Segundo o desembargador, o ordenamento constitucional estabelece que os ganhos habituais dos empregados, incluindo menores aprendizes, devem ser incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária.
O relator explicou que o contrato de aprendizagem, previsto na CLT, estabelece que ao aprendiz são assegurados direitos trabalhistas e previdenciários, incluindo a obrigatoriedade de recolhimento das contribuições ao INSS.
Esse entendimento foi reforçado por decisões anteriores do STF e do TST, que reconheceram a relação de emprego do menor aprendiz e a necessidade de incidência tributária sobre os valores pagos, com base no art. 195 da CF.
Acompanhando o entendimento do relator, o colegiado deu provimento à apelação, reconhecendo a obrigatoriedade de recolhimento das contribuições previdenciárias sobre os valores pagos aos menores aprendizes.
Processo: 5022758-27.2022.4.03.6100
Empresas vencem no TRF-3 discussão sobre relatórios de transparência salarial
Data: 18/09/2024
As discussões sobre a necessidade de empresas com mais de 100 funcionários publicarem relatórios de transparência salarial começam a chegar em turmas dos Tribunais Regionais Federais (TRFs). Há pelo menos dois acórdãos favoráveis aos empregadores. Em duas decisões recentes e unânimes, a 3ª Turma do TRF-3 entendeu que dar publicidade a essas informações extrapola os limites legais e os princípios constitucionais da intimidade e privacidade.
A obrigação de publicar o relatório de transparência salarial veio com a Lei nº 14.611, de 2023, regulamentada pelo Decreto nº 11.795, e por uma portaria do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), a de nº 3.714, do mesmo ano. O documento, elaborado pelo governo, deve ser publicado a cada semestre, tanto no site do MTE quanto em plataformas e redes sociais das empresas.
Os casos julgados pelo TRF-3 envolvem a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia) e a HM Empilhadeiras. Para o relator dos dois casos, desembargador Rubens Calixto, a portaria e o decreto inovam e extrapolam o que está previsto na lei, principalmente quando obrigam as empresas a replicarem os relatórios nos sítios eletrônicos e a apresentarem cópia de eventual plano de mitigação ao sindicato.
Ao mesmo tempo que o desembargador entende que o ato possa trazer transparência e segurança jurídica, afirma que “há que se prevenir o risco de a publicidade ser utilizada como simples ferramenta de exposição pública, conversível em mera execração, com todas as consequências que isso pode acarretar, violando os direitos constitucionais à privacidade e à intimidade”.
Na visão do relator, “ainda que muito louvável e necessária a equiparação salarial de gênero e raça, a sua implementação poderia ocorrer com os instrumentos ordinários ao alcance do Poder Público e das pessoas eventualmente interessadas”. A decisão validou a tutela de urgência concedida à Abia e converteu-a em julgamento de mérito, por não haver fatos novos nos autos. O acórdão em favor da HM teve mesmo fundamento (processos nº 5007991-77.2024.4.03.0000 e nº 5009068-24.2024.4.03.0000).
Rubens Calixto ainda reconheceu a competência da Justiça Federal para julgar a questão, algo também debatido no Judiciário. Para ele, a matéria é de ordem pública e “não tem relação direta com emprego ou trabalho, mas com encargos de índole administrativa perante órgãos da administração pública federal”.
O único pedido feito pela Abia que não foi acatado foi a desobrigação de apresentar plano de ação para mitigar a desigualdade. Segundo o relator, não há ilegalidade nesse ponto, pois estava previsto na lei e é algo “aparentemente coerente com o objetivo da norma”.
Christiana Fontenelle, sócia do Bichara Advogados, que atuou nos casos, diz que os TRFs têm sido mais vagarosos para dar decisões de mérito. E que, no início, as ações se pautavam muito mais na ofensa à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), a Lei nº 13.709/2018. Agora, as empresas insistem no prejuízo à livre concorrência.
“Fica claro que os relatórios publicados e as decisões confirmam isso, expõem as políticas da empresa, a estratégia de remuneração. E a dúvida que o concorrente tinha sobre a empresa pode ser esclarecida”, afirma Christiana. Ela também critica que não há tempo hábil para a empresa, se notificada, elaborar um plano de ação para mitigar eventual discriminação salarial. “Antes de fazer o plano de ação, é preciso ao menos um prazo para me defender, mostrar as políticas da empresa, se são efetivas, e os benefícios.”
Outro problema, diz, são os relatórios serem publicados sem contexto. “Se sair o relatório de uma mineradora, que há anos tem como público o masculino por questões históricas e de características físicas, não dá para em seis meses mudar esse mercado”. Na visão dela, a principal demanda, alvo de todas as ações, é a republicação dos relatórios nas plataformas das empresas, “que é um ambiente sem lei”. “Vai ofender a realidade da empresa e não vai atender ao propósito da norma.”
Eduardo Alcântara, sócio trabalhista do Demarest, diz que as decisões têm sido muito diversas. “Acabam variando porque os pedidos dependem da necessidade de cada empresa. Então tem ações mais amplas e mais restritas”, afirma. O que motivou os primeiros processos, foi o receio de os próprios dados informados saírem de forma incorreta quando confeccionados pelo MTE, segundo ele. “Tinha descrição que muitas vezes não se concretizava com a realidade e as empresas não podiam fazer essa ressalva.”
Ele lembra existir uma liminar favorável à Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), no TRF-6, que dispensa a republicação dos relatórios nos sites e redes sociais das empresas e seria válida para todo o Brasil. Mas caso as companhias tenham outros pedidos, como o envio dos dados ao MTE ou se abster de fazer plano de mitigação, devem entrar com ação própria.
As empresas que descumprirem o disposto na lei podem ser multadas em até 3% da folha de salários, com limite de 100 salários mínimos, o equivalente a R$ 141,2 mil. Mais difícil de cumprir, segundo Alcântara, é a negociação de eventual plano de mitigação com sindicato, se os auditores do trabalho identificarem que a pessoa jurídica oferece salários diferentes para homens e mulheres na mesma função.
“É uma questão política porque, conhecendo os sindicatos dos trabalhadores no Brasil, provavelmente para fazer essa adequação da discriminação vão usar essa negociação como moeda de troca para outra coisa que esteja pendente com a empresa”, completa o advogado.
Alcântara conseguiu decisões favoráveis para clientes, mas um dos acórdãos, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), foi contrário, também de forma unânime (processo nº 5005981-87.2024.4.02. 0000). A palavra final, porém, será do Supremo Tribunal Federal (STF), em uma ação proposta em março pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). O relator é o ministro Alexandre de Moraes (ADI 7612).
Em nota ao Valor, a Advocacia-Geral da União (AGU) diz que as normas sobre a publicação dos relatórios “atendem as previsões da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais” e foram editadas “para ampliar a publicidade de dados de interesse público como forma de fomentar a igualdade salarial entre homens e mulheres”. No Judiciário, acrescenta o órgão, a maioria dos pedidos de liminares foi negada.
Municípios vencem no STF disputa sobre repasse de ICMS
Data: 21/09/2024
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por unanimidade, que é obrigatório o repasse de 25% dos valores de créditos extintos de ICMS, por compensação ou transação tributária, dos Estados para o Fundo de Participação dos Municípios (FPM). O julgamento, no Plenário Virtual, se encerrou na sexta-feira.
Os ministros acompanharam o entendimento do relator, Nunes Marques, que julgou constitucional a previsão do artigo 4º, parágrafo 1º, da Lei Complementar nº 63/1990. O ministro Flávio Dino chegou a pedir que o julgamento fosse suspenso e retomado de forma presencial, mas cancelou o próprio pedido.
A ação foi apresentada pelos governos do Mato Grosso do Sul, Paraná e Paraíba. O argumento era de que a extinção de obrigações tributárias, por meio de compensações e transações, não aumentam a receita pública, e que a repartição constitucional do ICMS se refere aos recursos arrecadados, e não ao imposto em si. Para os Estados, extinguir o vínculo tributário sem arrecadação não gera receita, e, assim, o repasse aos municípios violaria a Constituição.
Nunes Marques, no entanto, ressalta em seu voto que a compensação e a transação, ao contrário de renúncias ou benefícios fiscais, exigem “obrigações por parte do contribuinte, equivalência entre o benefício obtido e o implemento a que se compromete”. Assim, “o poder público também alcança benefício em razão dessas medidas”.
Em seu voto, Nunes Marques sustenta que a receita produzida com a cobrança dos impostos é anterior ao pagamento do imposto pelo contribuinte, pois já está configurada no momento em que surge o crédito tributário em si. Parte dessa receita pertence ao município, por determinação constitucional, independentemente da concessão de benefícios ou negociações posteriores.
Assim, ainda que não haja recolhimento de imposto por parte do contribuinte, a compensação e a transação, ao serem formalizadas, provocam aumento na disponibilidade financeira do Estado, conforme aponta o ministro. “Havendo receita pública arrecadada nesses procedimentos, o numerário referente aos créditos de ICMS extintos deve sofrer o percentual de repasse da parcela devida aos municípios”.
Ao votar, o ministro Flávio Dino concordou com o relator, acatando o entendimento de que as transações e as compensações se enquadram no conceito de “arrecadação”, uma vez que reduz o passivo do ente arrecadador e, portanto, gera “incremento orçamentário e contábil positivo”. Entender de forma diferente, acrescenta, esvaziaria a previsão de que percentuais da arrecadação de determinados tributos “pertencem aos municípios”, conforme o artigo 158 da Constituição.
O aumento dos programas de incentivo para a regularização de dívidas tributárias ajuda a dimensionar a importância da decisão do STF, na visão do advogado Ricardo Almeida, que representa no processo a Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais Brasileiras (Abrasf). Ele cita como exemplo o programa de transação tributária lançado pelo Estado de São Paulo em novembro de 2023, com a expectativa de arrecadação de R$ 700 milhões no primeiro ano, R$ 1,5 bilhão em 2025 e R$ 2,2 bilhões em 2026.
Ricardo Almeida afirma que a decisão é paradigmática para determinar a justa distribuição dos recursos para os municípios, mas que é necessário melhorar os mecanismos de fiscalização da arrecadação. Hoje, acrescenta, se é possível estimar a arrecadação direta dos Estados com o ICMS, o mesmo não acontece com as transações e compensações.
Para ele, é preciso um esforço conjunto, junto aos Tribunais de Contas, para fiscalizar a destinação correta desses recursos, sob pena de a decisão do STF, apesar de positiva para os municípios, não ter efetividade prática.
Almeida lembra que a decisão deve influir na implementação da reforma tributária, que prevê a substituição do ICMS e do ISS pelo IBS, e cuja distribuição também deve ser equacionada com a reserva de 25% aos municípios.
Não é possível pleitear pagamento de precatório em mandado de segurança
Data: 23/09/2024
Por unanimidade, os ministros da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiram que o mandado de segurança não pode ser usado para pleitear restituição administrativa de indébito tributário (devolução de imposto pago indevidamente ou a maior) em espécie ou pagamento de precatório. Prevaleceu o voto do relator, ministro Mauro Campbell Marques, que fundamentou a decisão em súmulas do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF).
No caso concreto, o Sindicato dos Lojistas do Comércio de São Paulo impetrou mandado de segurança coletivo em 2006, para reconhecimento do direito de seus associados de exclusão do ICMS da base de cálculo de PIS e Cofins, bem como à compensação dos valores recolhidos indevidamente com correção pela taxa Selic. A entidade obteve decisão favorável, transitada em julgado em 2018. A Corte de origem autorizou o pagamento sob a forma de precatório e requisição de pequeno valor (RPV).
Segundo o ministro Mauro Campbell Marques, a autorização contraria precedentes do STJ. Em seu voto, Campbell citou a Súmula 461, do STJ, que prevê que “o contribuinte pode optar por receber, por meio de precatório ou por compensação, o indébito tributário certificado por sentença declaratória transitada em julgado”. Conforme o julgador, a súmula não autoriza o pagamento do precatório por meio de mandado de segurança e deve ser interpretada em conjunto com as Súmulas 269 e 271, do STF.
A primeira prevê que “o mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança”. Já a segunda estabelece que “concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria”. Os demais ministros acompanharam o voto.
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