Retrospecto Tributário – 20/05 a 27/05
Governo pode elevar arrecadação com petróleo em até 20% na reforma tributária, diz estudo
Data: 20/05/2024
A arrecadação da União com tributos que incidem sobre os investimentos de petroleiras pode crescer de 14% a 20% com a conclusão da reforma tributária, de acordo com um levantamento realizado pela Infis Consultoria. O estudo considerou a adoção de uma alíquota padrão de 28% do Imposto Sobre Valor Agregado (IVA Dual), que incidiria sobre contratos relativos a desenvolvimento de campos de petróleo e gás do pré-sal.
O IVA Dual corresponde à incidência da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), substituto do PIS/Cofins, somada ao Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Atualmente, o setor de petróleo conta com um regime aduaneiro especial chamado Repetro, que isenta importação de equipamentos específicos para a exploração e produção de petróleo, com perspectiva de ser encerrado em 2040.
O Repetro visa viabilizar altos investimentos em exploração ao desonerar tais atividades. Os debates da reforma incluem uma possível extinção do Repetro. Caso a alíquota de 28% do IVA Dual seja aplicada e o Repetro seja mantido, a Infis estima um aumento de 14% na tributação dos investimentos em óleo e gás. Se o Repetro for extinto, a alta na arrecadação será de 20%, de acordo com a consultoria.
Segundo Eduardo Pontes, especialista em tributação e sócio da Infis Consultoria, a maior tributação resultaria em custo mais elevado de investimentos das petroleiras, o que afastaria investidores do segmento, que já consideram os riscos exploratórios na decisão de se arrematar determinados campos de petróleo em leilões. O especialista destaca que entre 2010 e 2020, o setor gerou arrecadação superior a R$ 891bilhões, entre tributos, royalties e participações especiais.
“Nas últimas rodadas da Oferta Permanente da ANP [Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis], há campos do pré-sal que têm tido pouca procura. Muitos blocos já nem recebem proposta”, disse Pontes.
Ele prossegue: “A reforma não é negativa, há até alguns pontos que reduzem a carga tributária, como na fase de produção. Mas se queremos investimentos em campos não desenvolvidos, o governo deveria ter interesse em desonerar a cadeia.”
Um caminho que pode amenizar o impacto sobre a cadeia é o Projeto de Lei Complementar 53/2024, que tramita na Câmara dos Deputados. Entre outros pontos, o projeto estabelece a manutenção dos prazos do Repetro, com base, inclusive, em súmula do Supremo Tribunal Federal (STF) de que “isenções tributárias concedidas sob condição onerosa não podem ser livremente suprimidas”.
Outro ponto de preocupação da indústria é a aplicação de um imposto seletivo (o chamado “imposto do pecado”) que onera com uma alíquota adicional de 1% atividades consideradas prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, o que inclui a cadeia de óleo e gás, salientou Pontes.
Nesse aspecto, outro PLP, 23/2024, reduz ou isenta do imposto seletivo empresas de petróleo e gás que realizarem investimentos na transição energética ou em iniciativas de descarbonização.
Também há atenção da cadeia para a adoção de mecanismos para recuperação de créditos tributários, diante dos princípios que vem sendo estabelecidos na reforma tributária.
Banco Mundial lança simulador de impacto da reforma tributária para famílias brasileiras
Data: 21/05/2024
O Banco Mundial lançou um simulador que permite estimar o impacto da reforma tributária para as famílias brasileiras. O Simulador de Imposto sobre Valor Agregado se baseia nas informações da última Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
As simulações podem auxiliar a população geral e principalmente legisladores a promover um debate mais qualificado a respeito da reforma tributária. A ferramenta utiliza o cenário brasileiro apontado pela POF e o que propõe o Projeto de Lei Complementar 68/2024, que trata sobre a reforma tributária, para criar simulações.
Além disso, as simulações podem ser realizadas usando diferentes elementos que foram propostos na reforma e os impactos distributivos em vários cenários. A simulação pode ser realizada tendo como base um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) fixo de 20%.
De acordo com as análises realizadas pela ferramenta, os mais pobres ainda seriam o grupo que pagaria o maior imposto sobre o consumo em relação à própria renda, isso porque as famílias de baixa renda tendem a gastar todos os ganhos, enquanto as famílias com maior renda gastam um percentual menor. Nesse sentido, a carga tributária para os 10% mais ricos a carga tributária seria de apenas 8,2%.
Outra simulação apontou que se a reforma fosse aprovada em sua forma atual, a carga tributária para os 10% mais pobres seria reduzida para 22,1%, enquanto os 10% mais ricos pagariam praticamente o mesmo em termos proporcionais.
Sobre a cesta básica, o simulador destacou que as recentes ampliações não são a maneira mais eficiente de ajudar os mais pobres. Em caso de ampliação das isenções, a alíquota do IVA teria que aumentar para 28,3% para manter a neutralidade fiscal. No PLP 68/2024, a diferença entre as famílias mais ricas seria mínima (8,3%), mas os 10% mais pobres enfrentariam uma carga tributária de 25,3%.
Representantes do Banco Mundial acreditam que o cashback seria a melhor forma de proteger as famílias mais pobres, além de ser um mecanismo eficiente para uma tributação mais justa. Para eles, o foco do simulador é avaliar os impactos distributivos levando em consideração os padrões de consumo.
A economista principal do Banco Mundial para o Brasil, Shireen Mahdi, afirmou que “com dados oportunos e valiosos, os formuladores de políticas podem tomar decisões informadas que têm grandes impactos positivos, especialmente para populações vulneráveis”, disse.
Haddad enviará segundo texto da reforma tributária na próxima semana, afirma Lira
Data: 21/05/2024
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou nesta terça-feira (21), que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), o avisou que o segundo texto da regulamentação da reforma tributária será encaminhado ao Congresso na próxima semana.
Ele também disse que pretende formalizar, ainda nesta terça, a criação dos dois grupos de trabalho que discutirão os projetos de regulamentação da reforma tributária e que pretende fazer nesta quarta-feira (22), uma reunião com líderes partidários e com os indicados para esses colegiados para bater o martelo sobre o plano de trabalho dos GTs.
“Devo estar publicando hoje, e amanhã já fazendo reunião com líderes partidários e indicados para que façamos juntos o plano de trabalho e já tenhamos uma rotina de ouvir, discutir, fazer as audiências necessárias e poder entregar, se tudo correr bem, antes ainda do final do semestre”, disse Lira a jornalistas ao chegar ao Congresso.
Lira confirmou que cada um dos grupos terá sete deputados, explicou que todos os membros atuarão como relatores e que, apenas na reta final, quando os pareceres forem elaborados para ir a votação, é que cada um dos GTs escalará um dos seus integrantes para organizar o relatório.
“Todos serão relatores, todos serão membros. Na hora de cumprir os ritos regimentais, aí a gente escolhe um deles para assinar o que todos vão fazer conjuntamente”, pontuou o alagoano. “A participação de todos os partidos indicando um membro para esses GTs já dará amplitude de debate como já foi na reforma tributária mesmo.”
Isenção para e-commerce
Lira reconheceu que há impasses em relação ao projeto de lei que institui o Programa Mobilidade Verde e Inovação, o Programa Mover. Ainda assim, ponderou que, na reunião com líderes partidários de mais cedo, ficou definido que a proposta deve ser levada a votação nesta quarta-feira (22). Desde a semana passada, há um embate entre o governo, o PT, deputados do Centrão e o próprio Lira sobre a manutenção no texto do trecho que trata da isenção de Imposto de Importação (II) sobre remessas internacionais de até US$ 50.
“Relator [Átila Lira] ficou de procurar uma solução alternativa. Há uma mobilização grande do setor de varejo, de todos os setores, com confederações, sindicatos, falando da importância e do que está acontecendo. Não será pautado hoje, está na pauta da semana. Amanhã os líderes darão uma definição sobre o texto. A ideia que saiu da reunião é que amanhã ele seria votado de qualquer maneira”, disse Lira ao chegar ao Congresso Nacional. Ele acrescentou que não acredita em um eventual fatiamento da proposta tirando a parte da isenção e o colocando em um novo texto.
“É preciso colocar na balança a manutenção dos empregos na indústria nacional, a concorrência para com as empresas nacionais, que não estão pedindo isenção, estão pedindo pé de igualdade. Então, os líderes vão decidir com o relator e amanhã deve estar na pauta”, acrescentou.
Streaming
Sobre o projeto que regulamenta os serviços de streaming (oferta de vídeo sob demanda), Lira admitiu que ainda há resistência. Ele explicou que o relator André Figueiredo (PDT-CE) está tentando conversar com bancadas para negociar ajustes. “Eles estão tentando negociar. Mais uma vez enfrentamos dificuldades de narrativas que, no meu ver, não condizem com a realidade do projeto. Mas, como no Brasil ultimamente as coisas estão assim – quando você batiza, as coisas viram nome – as dificuldades não estão pequenas para aprovar essa matéria.”
Diferentemente do projeto do Mover – que ele acredita haver maioria para aprovar pelo menos uma parte do texto -, a proposta de regulamentação do streaming está em situação mais delicada. “O PL do streaming, não tenho certeza sobre o apoio.”
Lira deixou em aberto a possibilidade de o PL do streaming ter o mesmo desfecho que o PL das fake news. “Falta de votos? Confusão? Já tá desenhado, né”, comentou.
O parlamentar do PP afirmou ter feito apelo para que partidos que não concordam com a proposta não fiquem desgastando relator para que ele negocie e depois votem contra.
Em relação ao projeto de lei complementar que permite a securitização da dívida dos Estados e municípios, Lira disse que insistirá que o relator Alex Manente (Cidadania-SP) conclua essa semana o parecer para que ele possa ser colocado em votação. Objetivo é colocar em votação o quanto antes, porque texto deve ter alterações e precisará passar por nova análise do Senado.
Habilitação do novo regime fiscal das subvenções de ICMS
Data: 22/05/2024
Após a publicação da lei que trata do novo regime fiscal das subvenções de ICMS (Lei nº 14.789, de 2023), muito se discutiu e ainda se discute sobre sua abrangência e sua aplicação, especialmente diante da decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Tema 1.182. No entanto, a celeridade da Receita Federal em apreciar os pedidos de habilitação das subvenções de ICMS tem sido uma surpresa positiva neste início de vigência da nova lei.
Lembrando: pelo novo regime fiscal, as empresas beneficiárias de subvenções de ICMS não podem mais excluir o valor correspondente na apuração dos tributos sobre o lucro (IRPJ/CSLL). E mais: além de submeter a “receita” de subvenção a esses tributos, também deve submetê-la aos tributos sobre a receita (PIS/Cofins). Agora, as empresas beneficiárias terão direito ao crédito fiscal de 25% da “receita” de subvenção, limitado às despesas relacionadas ao investimento executado (depreciação, amortização, arrendamento, locação etc).
Para ter direito a apurar o referido crédito fiscal, é necessário que os incentivos ou benefícios fiscais de ICMS, caracterizados como subvenção, sejam habilitados pela Receita Federal. Na lei, o decurso do prazo de 30 dias correria a favor da empresa beneficiária, vale dizer, o silêncio das autoridades fiscais nesse período implicaria a habilitação tácita. Diante disso, muitas empresas se apressaram para requerer a habilitação.
Qual não foi a surpresa (ao menos, minha e de alguns profissionais de empresas) quando a Receita Federal procedeu à habilitação expressa, em prazo inferior a esses 30 dias.
Ainda de acordo com a lei, a habilitação pode ser cancelada caso a empresa beneficiária deixe de cumprir os requisitos elencados na lei. Acontece que esses requisitos legais são os mesmos para o deferimento da habilitação. Portanto, a mim me parece que o cancelamento da habilitação somente ocorrerá em casos muito particulares.
Sendo assim, a habilitação expressa da Receita Federal traz segurança jurídica para as empresas contribuintes, que já estão apurando seu crédito fiscal – embora sua utilização seja permitida apenas após a entrega da Escrituração Contábil Fiscal (ECF) referente ao exercício de 2024, cujo prazo é no meio do ano de 2025.
Controverso, Imposto Seletivo no setor mineral pode gerar até R$ 10,8 bi
Data: 22/05/2024
Controversa, a tributação do Imposto Seletivo (IS) sobre a extração mineral pode render à União receita adicional de R$ 8,7 bilhões em 2027, quando começará a ser cobrada, e chegar a R$ 10,8 bilhões em 2033. Pela proposta do governo o tributo deve ser cobrado sobre petróleo, minério de ferro e gás natural, mesmo que destinados à exportação, o que tem despertado críticas ao que se considera como intenção “arrecadatória”.
Os itens que ficarão submetidos ao IS estão em ascensão na pauta exportadora e contribuem com mais de 20% do valor de todos os embarques brasileiros. No ano passado, somaram US$ 73,3 bilhões em exportações, o equivalente a 21,6% da receita total de embarques. A expectativa é que, com aumento de volume de produção, se tornem mais importantes na pauta exportadora nos próximos anos. De janeiro a abril deste ano somente minério de ferro e petróleo foram responsáveis por 24% das exportações ante 20% em iguais meses do ano passado. O petróleo, segundo especialistas, promete se tornar neste ano o principal item embarcado pelo país.
As projeções de arrecadação do IS são de Bráulio Borges, economista da LCA e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre). As estimativas fazem parte de estudo em que Borges analisa o potencial de receitas que podem ser geradas pelo setor extrativo mineral até o início da próxima década. Atualizadas em fevereiro deste ano, as projeções consideraram alíquota do IS de 1%.
Pelos cálculos de Borges, a arrecadação total de tributos federais no setor extrativo mineral deve atingir R$ 52,7 bilhões em 2027 e chegar a R$ 63,5 bilhões cinco anos depois. As contas não incluem a contribuição previdenciária. O estudo tomou como base projeções de diversas fontes como ANP, Vale, Opep e PPSA. Os cálculos do economista consideraram, entre outras premissas, que o volume de produção de petróleo e gás vai crescer 50% até 2033 em relação ao observado em 2023. Para minério de ferro, foi considerada alta de 19% nos mesmos critérios.
Em entrevista ao Valor publicada no início de maio, Bernard Appy, secretário extraordinário da Reforma Tributária, disse que a arrecadação do Imposto Seletivo, da forma como proposta pelo governo federal, não deve ultrapassar total de R$ 50 bilhões.
O Imposto Seletivo deve ser cobrado a partir de 2027 e, segundo a emenda da reforma, tem como objetivo desestimular o consumo de bens e serviços nocivos à saúde e ao meio ambiente. Diferentemente de outras bases de incidência, como bebidas açucaradas e carros, a tributação sobre bens minerais não foi novidade do Projeto de Lei Complementar (PLP) 68/24 proposto pelo governo para regulamentação da emenda da reforma.
A cobrança do IS sobre bens minerais foi estabelecida na emenda, assim como a alíquota máxima de 1% para esse caso específico. O PLP especificou nos anexos que no caso dos bens minerais o alvo são petróleo bruto, minério de ferro e gás natural (liquefeito ou gasoso). Os produtos estão especificados por códigos da Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) e ou do Sistema Harmonizado (SH).
Ao elencar o petróleo bruto e o minério de ferro nas bases da tributação do Imposto Seletivo, a proposta do governo abarcou dois dos itens que costumam estar entre os três principais da pauta exportadora brasileira.
Gabriela Faria, economista da Tendências, diz que em 2024 a expectativa é de destaque ainda maior para petróleo e minério de ferro, já que o desempenho agrícola, representado fortemente pela soja, não será tão forte este ano como foi em 2023. Embora tenha havido queda de preços do petróleo em relação a períodos mais recentes, diz ela, o aumento do volume deve fazer com que petróleo e minério contribuam para a balança comercial alcançar novamente um resultado robusto este ano.
Diferentemente dos demais tributos novos criados pela reforma tributária sobre consumo – a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que será arrecadada pela União, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que será gerido por Estados e municípios -, o IS não dará direito a crédito. Segundo o PLP, será cobrado uma única vez sobre o bem, o que deve acontecer na primeira comercialização pela empresa extrativista, ainda que destinada à exportação. Júlio de Oliveira, tributarista e sócio do Machado Associados, explica ainda que o IS, inclusive o cobrado na extração mineral, integrará a base de cálculo do IBS e da CBS.
Para Borges, no caso da extração mineral o Imposto Seletivo vai funcionar “na prática” como “um adicional de royalties, que ajuda a reduzir a alíquota-padrão da CBS e do IBS”. “No caso de petróleo e gás, até poderia ser considerado como um ‘upstream carbon tax’, mas nos demais setores extrativos isso não faria muito sentido, a não ser que esteja sendo considerado que essas atividades causam muitos danos ambientais nas áreas de mineração.”
Para Rinaldo Mancin, diretor de relações institucionais do Ibram, que representa as empresas de mineração, a cobrança do Imposto Seletivo no setor é uma “anomalia”. Ele defende que os “excise tax”, tributos que inspiraram o IS, não costumam focar em um setor, mas sim em produtos, para desestimular consumo de tabaco ou álcool, por exemplo.
Uma das polêmicas, diz, é que a medida desincentiva a mineração. “O mundo vai precisar de mais mineração, dentro da transição energética e energia renovável para os quais a mineração é essencial.” Há, para ele, um “contrassenso” entre políticas públicas que eventualmente busquem a extração de minerais críticos e estratégicos, o que iria na contramão de um IS que desincentivaria a mineração.
Mancin diz que o governo tem intenção “arrecadatória” ao listar o minério de ferro entre as bases tributáveis pelo IS, já que o item, sozinho, foi responsável por 59,6% do faturamento de R$ 248 bilhões do setor mineral em 2023. Os dados são do Ibram. O setor, defende, Mancin, é favorável à reforma tributária, mas não quer a tributação de minerais estratégicos. A ideia, relata, é levar o tema para o Congresso nas discussões sobre a proposta de regulamentação do governo.
Para Tércio Chiavassa, tributarista e sócio do Pinheiro Neto, é importante assegurar que as exceções à tributação estejam claras na legislação. Ele lembra que o PLP 68/24 traz exceção expressa para gás quando utilizado no processo produtivo para empresas. “Por que somente o gás, e não outras coisas? Esta é uma discussão que terá que avançar no Legislativo.”
No sistema atual, diz ele, as leis complementares estabelecem a incidência de ICMS e ISS e há conflitos sobre qual tributo incide em determinadas operações. Com a reforma a premissa é outra, observa. “O governo traz um conceito de operações muito amplo para dizer claramente que está tudo dentro e estabelecer as exceções. O que não for bem material, bem imaterial ou direito é serviço. Por definição se abre uma válvula e se abrange tudo. Isso vale para o Imposto Seletivo também. Se há exceções, o legislador precisa incluir agora.” Caso contrário, destaca, será muito difícil alegar depois que algo é exceção se isso não estiver expressamente estabelecido.
Dependendo de como ficar definido o texto no legislativo, diz Chiavassa, é possível que haja uma discussão sobre a natureza jurídica do IS especificamente sobre extração mineral. Poderá haver espaço, afirma ele, para questionar se há outra incidência sobre o mesmo fato, já que o IS tem por finalidade proteger o dano no ambiente doméstico, algo que teria natureza indenizatória muito similar à já existente Contribuição Financeira pela Exploração Mineral (Cfem), considerada uma compensação ambiental sobre uso do solo.
Segundo dados do Ibram, o setor mineral arrecadou total de R$ 85,6 bilhões em tributos em 2023, incluído no valor R$ 6,9 bilhões com a Cfem.
Haddad: Data marcada para aprovar reforma tributária na Câmara é ‘totalmente factível’
Data: 22/05/2024
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que a data marcada para aprovação da reforma tributária na Câmara dos Deputados é 8 de julho, prazo, segundo ele, “totalmente factível”. Haddad confirmou ainda que o segundo projeto de lei da reforma tributária deverá chegar ao Congresso Nacional na próxima semana. “Temos uma agenda microeconômica aqui na casa que pode andar”, disse.
As afirmações foram feitas em uma audiência pública na Comissão de Finanças e Tributação na Câmara nesta manhã. O ministro enfatizou aos parlamentares que a equipe econômica está com “desejo” de terminar o ano com as contas equilibradas.
Haddad lembrou que um dos princípios da reforma tributária é manter a carga estável. “É um ajuste fiscal que está sendo feito sem doer nas famílias trabalhadoras, empresários que pagam imposto corretamente” disse. Para ele, o Imposto sobre Valor Agregado (IVA) será “tão menor quanto maior for a base de arrecadação” e a alíquota do IVA será “muito menor do que a praticada hoje”.
Segundo ele, está acontecendo o que a Fazenda previa do ponto de vista de crescimento, inflação, emprego e fiscal. O ministro destacou que os núcleos de inflação estão rodando abaixo da meta. “Quantas vezes no regime de metas o Brasil teve 3% de meta de inflação?”, perguntou.
Haddad disse também que o trabalho de política monetária feito para a inflação cair foi “muito melhor do que a gente imagina”. “Muita coisa está sendo feita; por isso, estamos com indicadores [econômicos] dessa qualidade”, disse.
O ministro destacou também que muitas vezes quem dá o ritmo dos ajustes econômicos é o Congresso Nacional. “Todas as vezes que vim a essa Casa, foram com medidas delicadas.”
Haddad apontou que, em 2023, “ou se aumentava a alíquota ou se criava um novo imposto, mas não nos parecia justo isso, porque muita gente estava deixando de pagar imposto”. Disse que resolver os problemas fiscais do país é “um caminho mais difícil que exige pequenos ajustes”.
Câmara aprova isenção de IPI para eletrodomésticos em áreas atingidas por desastres
Data: 22/05/2024
A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (22) projeto de lei que concede isenção do do Imposto Sobre Produto Industrializados (IPI) alguns imóveis e eletrodomésticos da linha branca comprados por residentes em áreas atingidas por desastres naturais ou eventos climáticos extremos. A matéria será enviada ao Senado.
O texto aprovado é um substitutivo do deputado Lucas Redecker (PSDB-RS) para o Projeto de Lei 4731/23, das deputadas Maria do Rosário (PT-RS) e Gleisi Hoffmann (PT-PR). Serão contemplados fogões de cozinha, refrigeradores, máquinas de lavar roupa, tanquinhos, cadeiras, sofás, mesas e armários, contanto que fabricados no território nacional.
Poderão usufruir da isenção as pessoas físicas e os microempreendedores individuais (MEIs) residentes ou com domicílio fiscal em municípios cuja calamidade pública ou situação de emergência tenham sido reconhecidos pelo Executivo Federal.
Para obter a concessão do benefício, o interessado deverá comprovar que residia ou tinha domicílio fiscal na localidade do desastre e que a edificação foi diretamente atingida.
O texto limita o uso da isenção a uma única vez por um membro de cada uma das famílias atingidas e para um produto, segundo regulamento da Receita Federal.
Ao contrário de outras iniciativas, o desconto do tributo valerá para todas as situações de emergência e de calamidade pública reconhecidas pelo Executivo federal, não se restringindo àquelas referendadas pelo Congresso Nacional para fins de flexibilização fiscal e orçamentária, como no caso do Rio Grande do Sul.
Normalidade
Segundo Lucas Redecker, o projeto contribui para o restabelecimento da normalidade e do bem-estar nas áreas afetadas por desastres naturais. “Passam uma mensagem de apoio, solidariedade e empatia à população diretamente afetada e contribui para o fortalecimento da indústria nacional da linha branca, com impacto positivo na geração de emprego e renda.”
A deputada Gleisi Hoffmann afirmou que seria bom manter a previsão de usar o benefício novamente em caso de outro desastre. “Às vezes você tem recorrência de desastre nos mesmos locais, até pela situação geográfica.” Redecker alterou a proposta para deixar mais clara a permissão do uso da isenção mais de uma vez.
O deputado Gilson Daniel (PODE-ES) agradeceu o fato de o projeto beneficiar outros municípios com decreto de calamidade pública reconhecido, não só no Rio Grande do Sul.
Para o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), a proposta é a maneira de o Estado ter uma atitude generosa a quem perdeu vários itens essenciais. “É preciso que a gente tenha essa maturidade e compreensão. Não é favor, é dever que cumpro com prazer, mas com dor e angústia porque não gostaria de fazer”.
Presidente Lula sanciona lei que retoma e reformula o Perse
Data: 22/05/2024
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sanciona nesta quarta-feira (22/5), no Palácio do Planalto, o Projeto de Lei n° 1026/2024, que retoma e reformula incentivos do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse).
Criado em 2021 para ajudar empresas que tiveram de paralisar as atividades durante a pandemia de Covid-19, o Perse representa um importante suporte para o desenvolvimento da economia criativa no país, que responde por cerca de 3% do Produto Interno Bruno (PIB) e emprega cerca de 7,5 milhões de pessoas em mais de 130 mil empresas formalizadas.
O texto estabelece um teto de R$ 15 bilhões para os incentivos fiscais, com validade até dezembro de 2026, e beneficia empresas de 30 tipos de atividades econômicas do setor, incluindo às ligadas ao turismo, cultura e esporte.
Entre as empresas que podem ser beneficiadas estão as que operam no ramo de hotelaria; serviços de alimentação para eventos e recepções (bufês); aluguel de equipamentos recreativos, esportivos, de palcos; produção teatral, musical e de espetáculos de dança; restaurantes e similares; bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas; cinemas; agências de viagem; além de atividades de jardins botânicos, zoológicos, parques nacionais, reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental, parques de diversão e parques temáticos, entre outras.
LIMITE – A nova lei garante a continuidade do programa e traz mecanismos de controle para evitar o uso indiscriminado dos recursos e garantir a gestão fiscal responsável. Os valores relativos aos incentivos do Perse serão demonstrados pela Secretaria Especial da Receita Federal em relatórios bimestrais. Os benefícios da alíquota zero dos tributos envolvidos (IRPJ, CSLL, PIS e Cofins) serão extintos a partir do mês seguinte àquele em que o Executivo demonstrar que o custo fiscal acumulado atingiu o limite fixado de R$ 15 bilhões.
LUCRO REAL – O PL que será sancionado permite que empresas tributadas pelo lucro real (faturamento maior que R$ 78 milhões e possibilidade de deduções) ou pelo lucro arbitrado possam contar com todos os benefícios do Perse em 2024, ficando restritos à redução de PIS e Cofrins em 2025 e 2026.
CADASTUR – Para determinadas categorias, o acesso às vantagens do Perse é condicionado à regularidade perante o Cadastro de Prestadores de Serviços Turísticos (Cadastur) em 18 de março de 2022 ou adquirida entre esta data e 30 de maio de 2023. Contribuintes com irregularidades no Cadastur ou sem direito à isenção por problemas de enquadramento na Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) podem aderir à autorregularização em até 90 dias após a regulamentação da lei, sem a incidência de multas.
A caminho da era digital: o plenário virtual do Carf
Data: 22/05/2024
Embora seja o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) um órgão quase centenário, certo ter, nos últimos anos, enfrentado desafios importantes, que o instigou a se reinventar. A pandemia de Covid-19, o movimento grevista dos auditores fiscais da Receita Federal, as alterações na sistemática do voto de qualidade, para enumerar alguns desses obstáculos, levaram à consolidação de um estoque que representa margem próxima a 10% do PIB brasileiro.
Esforços foram envidados, a partir de janeiro de 2023, o que permitiu a redução do estoque de cerca de 91 mil processos para 84 mil processos em 12 meses, segundo os dados abertos do Carf [1], consolidados em 25 de abril de 2024.
Diante desse contexto, na administração desse número e demonstrando a capacidade de reinvenção do Carf, foi editado o Novo Regimento Interno (Novo RICarf), aprovado pela Portaria MF nº 1.634, de 21 de dezembro de 2023, que trouxe medidas de celeridade e transparência aos julgamentos, dentre as quais: o aumento do número de colegiados e de julgadores, a redução de oito para seis julgadores em Turmas Ordinárias e Extraordinárias, bem como a previsão para a realização de sessões assíncronas, por meio do Plenário Virtual, objeto de análise desta coluna.
Experiência prévia em sessões não presenciais
Durante a pandemia do Covid-19, diante da fragilidade da vida humana no momento da aguda crise sanitário-econômica global, o Carf foi forçado a (re)pensar os caminhos para a realização de sessões. O isolamento obrigatório obstou a realização das sessões de julgamento que, em suas Turmas Ordinárias e Câmaras Superiores de Recursos Fiscais, ocorriam, exclusivamente, de forma presencial na capital do nosso país.
Na época, valendo-se de plataforma virtual de comunicação para a realização de videoconferências, o Órgão retomou as atividades paralisadas, adequando-se à nova realidade que havia sido imposta a todo globo. Essa experiência demonstrou que, na realização de julgamentos de forma remota, há também benefícios de diversas ordens:
(1) A substancial economia no dispêndio de recursos públicos, eis que com a realização de sessões virtuais, desnecessário o gasto com despesas decorrentes de deslocamentos dos Conselheiros;
(2) Os contribuintes e patronos também deixaram de arcar com os custos de deslocamento para acompanhamento das sessões de julgamento ou realização de sustentação oral; e,
(3) Os impossibilitados de se locomoverem por motivos médicos, familiares, dentre outros, foram beneficiados, uma vez continuaram no exercício de suas funções dentro de suas respectivas residências.
Vê-se o êxito da experiência: após 95 anos de sua existência, conseguiu o órgão se transformar para viabilizar a realização de sessões não presenciais.
Novas tecnologias
Desde o século 19, assiste-se ao recrudescimento do fenômeno da globalização, evidenciando a necessidade de constantes inovações tecnológicas para o aprimoramento das atividades [2], não permanecendo o Carf estanque diante das novidades trazidas nesta era digital. Tal fato, atrelado à necessidade de atualização e incremento nos procedimentos relacionados ao julgamento não presencial, levaram ao projeto de desenvolvimento do Plenário Virtual do Carf, em parceria com o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro).
O Novo RICarf, aprovado pela Portaria MF nº 1.634, de 21 de dezembro de 2023, trouxe a previsão do Plenário Virtual, mudança essencial atrelada ao desenvolvimento de novas tecnologias e em consonância com o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável nº 16 da Organização das Nações Unidas (ONU), que visa “(…) proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis” [3].
A experiência do Plenário Virtual do STF [4]
Muitas foram as críticas proferidas em face da inovadora modalidade de julgamento, quando da sua implementação no âmbito da Corte Constitucional brasileira [5]. A despeito delas, a realidade – sinalizadora da existência de agigantado estoque, de pautas travadas e de lapso temporal substancial para apreciação dos processos – impôs-se. O modelo, previsto desde 2007, no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, que veio a ser implementado 13 anos mais tarde, consolidou-se na mais alta corte do país.
Dentre as principais vantagens do Plenário Virtual do STF, é possível citar as seguintes [6]:
(1) Desnecessidade de suspensão dos trabalhos, em situações semelhantes à experimentada com o Covid-19;
(2) A redução das formalidades de praxe no âmbito do Pretório Excelso;
(3) A celeridade no julgamento e maior liberdade de escolha, para os ministros e ministras, acerca do momento para a confecção de seus votos e apreciação daqueles na qualidade de vogal; e,
(4) A desnecessidade de apresentação de declaração de voto, na hipótese em que aderida à posição do relator, algo pouco frequente nos julgamentos presenciais do STF, o que “reduz a quantidade de votos e permite chegar a uma posição institucional de forma mais simples” [7].
Logo, é de fácil constatação o avanço que o Plenário Virtual representou em termos de celeridade nos julgamentos ocorridos no STF.
No contencioso administrativo fiscal, no qual já impera o princípio da formalidade moderada, segundo o qual há de ser adotadas “formas simples, suficientes para propiciar adequado grau de certeza, segurança e respeito ao direito dos administrados” – ex vi do inciso IX do parágrafo único do artigo 2º da Lei nº 9.784/99 –, o Plenário Virtual representa também uma mudança de paradigma rumo ao aumento da eficiência nos julgamentos administrativos.
Passará o Carf a contar, assim como o Supremo Tribunal Federal, com um Plenário Virtual.
Plenário Virtual do Carf
O artigo 92, do Novo RICarf, prescreve que as sempre públicas reuniões poderão ser realizadas na modalidade síncrona, empregada desde os primórdios do conselho, e na novel modalidade assíncrona, “por meio do depósito de relatório e votos em sistema eletrônico, aprovado e regulamentado por ato do Presidente do Carf” – cf. §§1º e 2º.
Nas sessões síncronas, os conselheiros do Carf participam de maneira simultânea nas sessões de julgamento, nas seguintes formas, nos termos do §1º, do artigo 92, do Novo RICarf:
(1) presencial (todos no mesmo espaço físico);
(2) não presencial (todos participam por meio de videoconferência ou tecnologia similar); e,
(3) híbrida (há a participação tanto de forma presencial como não presencial dos integrantes do colegiado).
Por sua vez, as sessões assíncronas serão realizadas no Plenário Virtual, no qual, em tempo real, será possível acompanhar o teor do relatório e voto do relator, dos demais conselheiros, a votação e o resultado do julgamento, que serão postos no sistema eletrônico, disponíveis para visualização pública, desde o início da reunião de julgamento – ex vi dos §§ 2° e 3º do artigo 92 do Novo RICarf.
O artigo 103 do Novo RICarf, ao seu turno, assegura o direito à sustentação oral dos patronos, de quinze minutos em arquivo de áudio ou de áudio e vídeo, também postada no sistema eletrônico e disponível publicamente, bem como o envio de memoriais.
A utilização do Plenário Virtual poderá ser feita por qualquer colegiado do Carf, desde que observadas as regras dos artigos 93 e 94, ambos do Novo RICarf.
Dessa forma, nos termos do §1º do artigo 93 do Ricarf, em reunião síncrona, presencial ou híbrida, ou no caso de Turma Extraordinária, em reunião síncrona na forma não presencial, serão julgados os processos com tramitação prioritária [8]; e, os que tratem de exigência de crédito tributário de valor igual ou superior ao determinado em ato do presidente do Carf ou os relativos a outras hipóteses previstas também em ato do seu presidente – vide artigo 94.
Da leitura da Portaria Carf/MF n° 8, de 4 de janeiro de 2024, alterada pela Portaria Carf/MF n° 416, de 12 de março de 2024 e da Portaria Carf/MF n° 9, de 4 de janeiro de 2024, alterada pela Portaria Carf/MF n° 420, de 12 de março de 2024, temos atualmente a seguinte situação: até 30 de junho de 2024, serão julgados, em sessão síncrona, os processos com valor igual ou superior a R$ 60 milhões pela 1ª Seção de Julgamento; pela 2ª Seção de Julgamento, aqueles que ultrapassem R$ 7,5 milhões; e, os que superem R$ 30 milhões, cuja competência repousa na 3ª Seção de Julgamento.
Por sua vez, serão julgados em reunião assíncrona, preferencialmente, os processos de Turmas Extraordinárias, que apreciam, em regra, os processos de até dois mil salários mínimos – vide artigo 65, do Novo RICarf – [9], e aqueles não classificados nas hipóteses previstas acima para as reuniões síncronas [10].
O artigo 104 prevê ainda possibilidade de requerimento para exclusão de recurso da reunião assíncrona, nos casos de controvérsia jurídica relevante e disseminada (§3º do artigo 16, da Lei nº 13.988, de 14 de abril de 2020), ou de elevada complexidade de análise de provas. São legitimados para requerer o julgamento em reunião síncrona:
(1) o Relator, antes de aberta a reunião;
(2) qualquer outro Conselheiro [11]; ou,
(3) as próprias partes, dentro do prazo para apresentar sustentação oral, vindo o pleito a ser decidido pelo presidente da Turma.
O procedimento das sessões assíncronas é previsto no artigo 105 do Ricarf, que envolve: a disponibilização de ementa, relatório e voto, sustentações orais e memoriais, no início da reunião; a manifestação dos votos dos demais conselheiros até o final do período da reunião assíncrona; o cômputo dos votos à medida da apresentação; pedido de vista admitido na primeira reunião assíncrona; a proclamação do resultado do julgamento tão logo proferidos todos os votos, independentemente do fim do período da reunião assíncrona; a transferência do julgamento para sessão síncrona nas hipóteses previstas nos §§ 6° e 7° do artigo 105 do Ricarf.
Digna de nota é a medida de obrigatoriedade de explicitação das razões de decidir, sempre que o Conselheiro acompanhar ou divergir do relator pelas conclusões, conforme o §4º do artigo 105, §§8º e 9º do artigo 114 e §10 do artigo 133 do Novo RICarf. Isso porque, imperioso que sejam os julgadores capazes de não só de explicar como também justificar suas decisões, em sintonia com o ordenamento jurídico [12], em garantia da devida motivação das decisões, corolário da segurança jurídica.
O que o futuro reserva
Parece ser bem verdade que “[t]oda boa ideia passa por três etapas: primeiro é ridicularizada, depois é violentamente antagonizada e por último é universalmente aceita como autoevidente” [13]. Sequer entrou o modelo em funcionamento e críticas têm sido prematuramente postas quanto ao Plenário Virtual do Carf. O momento é de cautela para apreender a realidade que ora se descortina, cujos mecanismos nem ainda são apreensíveis aos nossos olhos, porquanto o sistema permanece em desenvolvimento, na parceria firmada com o Serpro.
Se tudo correr bem, a expectativa é que o Plenário Virtual comece a funcionar já no segundo semestre deste ano. A torcida é que seja a experiência no Carf – assim como foi no STF – exitosa, porquanto tem a ferramenta vocação para gerar redução do acervo de feitos e minorar a temporalidade geral do iter processual no âmbito do contencioso administrativo fiscal em 2ª instância. Mormente quando, em consulta aos Dados Abertos do Carf, conclui-se pela existência de substancial acervo de baixa complexidade e valor pendente de julgamento: cerca de 20.540 processos trazem exigências tributárias inferiores a R$ 84,7 mil.
Quiçá, negligenciam os precoces críticos as prescrições dos artigos 104 e 105 do Novo RICarf, do Ricarf, que versam sobre a transferência do julgamento de processos para a sessão síncrona. Tais dispositivos representam, em justa medida, o atendimento aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.
Quando inexistirem obstáculos operacionais para o funcionamento do Plenário Virtual do Carf, comprovar-se-á ser a ferramenta capaz de potencializar os esforços no cumprimento do papel fundamental do órgão: julgar os litígios tributários com imparcialidade, celeridade, eficiência e transparência.
https://www.conjur.com.br/2024-mai-22/a-caminho-da-era-digital-o-plenario-virtual-do-carf/
Grupo da reforma tributária exclui Norte e Centro-Oeste
Data: 23/05/2024
Após quase um mês, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), divulgou a composição dos dois grupos de trabalho que discutirão a regulamentação da reforma tributária, mas a falta de deputados do Centro-Oeste e do Norte no colegiado que decidirá sobre a distribuição dos recursos para os Estados levou a críticas de parlamentares destas regiões e pressões para que já ocorram mudanças.
“É preocupante”, disse o coordenador da bancada do Mato Grosso do Sul, deputado Vander Loubet (PT-MS). “Não sei qual foi o critério, mas não dá para o Centro-Oeste ficar de fora da discussão e ser prejudicado. Não dá para vir um trator passando por cima da gente”, afirmou o petista.
Loubet disse que o Mato Grosso do Sul trabalhou para ajudar a construir uma posição de consenso sobre a reforma e que não pode ser excluído. “Independentemente da questão partidária, não dá para um Estado como o nosso, que fez todo o dever de casa, ser penalizado”, declarou.
Coordenador da bancada do Distrito Federal, o deputado Rafael Prudente (MDB) procurou outros coordenadores estaduais e o presidente do seu partido, o deputado Baleia Rossi (SP) – que foi autor da proposta de emenda constitucional (PEC) que originou a reforma – para fazer uma mobilização que amplie o grupo.
“Tenho certeza de que teremos a sensibilidade do presidente Arthur Lira para que possa rever essa decisão”, disse. “Claro que não podemos ter representante de todos os 27 Estados, mas o trabalho terá mais legitimidade e credibilidade, e isonomia também, se tiver a composição de pelo menos todas as regiões do país.”
O desbalanceamento ocorreu devido ao método escolhido por Lira para compor os grupos de trabalho e por causa das indicações das siglas: os sete maiores partidos vão participar do primeiro grupo, que cuidará das regras de funcionamento do novo sistema, e o segundo grupo, com os demais partidos/federações, tratará dos critérios para divisão dos recursos entre os Estados e municípios, do funcionamento do comitê-gestor do IBS e das normas para atuação dos Fiscos.
Os partidos não indicaram nenhum deputado do Centro-Oeste e do Norte para este segundo grupo. Serão quatro representantes do Sudeste, dois do Nordeste e um do Sul. No primeiro grupo, há um deputado do Norte – Joaquim Passarinho (PL), do Pará -, mas ele não discutirá as questões relativas à Federação. Este segundo projeto ainda não chegou à Câmara – justamente por divergências entre a União e os entes subnacionais – e a promessa do governo é que isso ocorra na próxima semana.
“Tenho certeza que teremos a sensibilidade de Lira para reverter”
— Rafael Prudente
Lira oficializou nesta quarta-feira em reunião com o primeiro grupo de trabalho que os colegiados não terão nenhum relator ou coordenador e que a intenção é que os sete membros cheguem num acordo sobre os temas para elaborar um parecer sobre o texto, que possui 499 artigos.
A situação, inédita, levará a um inusitado rodízio: por ordem alfabética, cada integrante comandará uma audiência pública. Nos bastidores, essa divisão foi vista por parlamentares como uma forma de o presidente da Câmara ter maior influência sobre o texto, para decidir sobre os assuntos em que houver divergência.
Segundo o deputado Claudio Cajado (PP-BA), os sete integrantes do grupo sentarão em reunião fechada após essas audiências públicas para tentar chegar a um consenso sobre cada tema. O GT apresentará os parâmetros para elaboração de um parecer no plenário, mas não votará um texto nem haverá apresentação de emendas pelos parlamentares. Essa fase ocorrerá no plenário – quando, de fato, for escolhido um relator para negociar.
As primeiras audiências públicas ocorrerão na terça-feira (28) com o secretário extraordinário do Ministério da Fazenda para a Reforma Tributária, Bernard Appy, às 9h, e com as confederações patronais, como CNI e CNC, às 14h.
O roteiro de trabalho será divulgado também na terça-feira, mas a promessa dos parlamentares é realizar quatro audiências públicas por semana, com o objetivo de aprovar o projeto na primeira quinzena de julho, antes do recesso parlamentar.
Reforma tributária e mecanismos de resposta a calamidades públicas
Data: 23/05/2024
Em artigo aqui publicado em 11 de maio último, Alexandre Rossato S. Avila [1] chama a nossa atenção para a necessidade de ajuste da legislação gaúcha com relação às doações efetuadas em períodos de calamidade pública, tendo em vista a grave situação enfrentada pelo Rio Grande do Sul no presente momento.
Conforme o autor aponta, a legislação local estaria preparada para não exigir o ICMS sobre doações de mercadorias, em especial após a celebração do Convênio ICMS nº 54/2024. Esse convênio também assegurou a manutenção do crédito do ICMS relativo às operações anteriores, quando os contribuintes gaúchos efetuarem saídas de mercadorias isentas do imposto ou quando se tratar de mercadorias em estoque que tenham sido extraviadas, perdidas, furtadas, roubadas, deterioradas ou destruídas.
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Quanto às doações em dinheiro, o articulista anota a necessidade de se ajustar a legislação local, pois a faixa de isenção ao ITCMD atualmente vigente seria muito baixa (pouco mais de R$ 3 mil). Basta alteração legislativa pela própria Assembleia Legislativa.
Ausência de mecanismos
Essas pertinentes observações despertam a nossa preocupação com relação à ausência de mecanismos de resposta às situações de calamidades públicas, tanto no texto da reforma tributária aprovada pela Emenda Constitucional nº 132/2023, quanto no primeiro projeto de lei complementar para a sua regulamentação (PLP 68/2024), recentemente apresentado pelo Poder Executivo ao Congresso.
O nosso texto constitucional prevê, no seu artigo 21, inciso XVIII, a competência da União para planejar e promover a defesa permanente contra as calamidades públicas, especialmente as secas e as inundações. Além disso, a União é quem pode instituir empréstimos compulsórios para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública (artigo 148, inciso I); e, ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, é quem pode decretar estado de defesa para restabelecer a ordem pública ou a paz social, quando ameaçadas por calamidades de grandes proporções na natureza (artigo 136).
Em razão da experiência enfrentada com a pandemia da Covid-19, inseriu-se no artigo 49, inciso XVIII, a competência para o Congresso decretar estado de calamidade pública de âmbito nacional, hipótese em que a União: (1) pode adotar regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para atender às necessidades dele decorrentes; (2) pode utilizar processos simplificados de contratação de pessoal, em caráter temporário e emergencial, e de obras, serviços e compras; (3) pode apresentar proposições legislativas e atos de enfrentamento da calamidade, com dispensa das limitações legais quanto ao aumento de despesas e à renúncia de receita tributária, inclusive superando a vedação para a contratação com o poder público por parte de empesas em débito com a seguridade social; e (4) fica dispensada de observar uma série de regras relativas à manutenção do equilíbrio fiscal-orçamentário.
Com a implementação do novo sistema de tributação sobre o consumo, vigorará a regra do artigo 156-A, § 1º, inciso X, segundo a qual IBS e CBS não poderão ser objeto de incentivos e benefícios financeiros ou fiscais, salvo os regimes específicos, diferenciados ou favorecidos previstos na própria Constituição. Tais regimes, no entanto, dizem respeito a segmentos econômicos ou a bens e serviços específicos que, no curso do processo legislativo que levou à aprovação da Emenda nº 132, lograram romper a barreira da absoluta uniformidade da incidência do IBS e da CBS, que era advogada pelos autores intelectuais da reforma.
Há exceções, portanto, à uniformidade da tributação e à vedação da concessão de benefícios fiscais. No entanto, nenhuma delas se mostra apropriada para responder a uma situação extrema como esta enfrentada pelo Rio Grande do Sul.
Hipóteses previstas
Considerando-se as hipóteses de isenção ou redução em 100% da cobrança do IBS e da CBS, poderá haver desoneração apenas do seguinte: serviços de transporte público coletivo de passageiros rodoviário e metroviário de caráter urbano, semiurbano e metropolitano; dispositivos médicos, dispositivos de acessibilidade para pessoas com deficiência e medicamentos; produtos hortícolas, frutas e ovos; serviços prestados por Instituição Científica, Tecnológica e de Inovação (ICT) sem fins lucrativos; automóveis de passageiros para pessoas com deficiência ou com transtorno do espectro autista, ou para uso como taxi; e atividades de reabilitação urbana de zonas históricas e de áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística. No caso dos serviços de educação de ensino superior alcançados pelo Programa Universidade para Todos (Prouni), apenas a CBS poderá ser reduzida totalmente.
Todas essas hipóteses, porém, visam a adaptar a uniformidade da tributação a especificidades de cada segmento, tipo de serviço ou produto. É a mesma tônica da desoneração da Cesta Básica Nacional de Alimentos, cujo conteúdo proposto no PLP 68/2024 foi tão tímido ao ponto de excluir o sal da alimentação básica dos brasileiros.
A Emenda nº 132 previu, ainda, a criação do chamado regime de cashback, segundo o qual poderá haver a devolução do imposto a pessoas físicas, com o objetivo de reduzir as desigualdades da renda. Igualmente, não nos parece ser esse um mecanismo apropriado para o enfrentamento de calamidades situadas em pontos específicos do território nacional. Com efeito, ainda que uma crise ambiental como a gaúcha possa levar muitas pessoas a uma situação de relevante vulnerabilidade econômica, trata-se de uma catástrofe de tal proporção que alcança a comunidade na sua integralidade: ricos e pobres são atingidos.
Caminhos
Haveria espaço, de outro lado, para desonerações mais flexíveis com relação aos bens e serviços alcançados pelo imposto seletivo. No entanto, o impacto desse tipo de medida seria bastante limitado, uma vez que, por ora, o que se pretende onerar com o “imposto do pecado” são apenas veículos automotores, aeronaves, embarcações, bebidas alcóolicas, refrigerantes, produtos fumígenos e bens minerais.
O sistema tributário atual, ainda que repleto de vicissitudes, apresenta caminhos mais eficientes para dar resposta a crises como a enfrentada pelo estado do Rio Grande do Sul. A maior liberdade para desonerar, se por um lado levou à construção de um sistema casuístico e de privilégios, por outro, se bem utilizada, permite uma pronta resposta do Direito Tributário a situações extremas.
Já há quem proponha, por exemplo, a aprovação de uma espécie de “Perse Gaúcho”, para desonerar de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins as empresas instaladas naquele Estado, com o propósito de viabilizar a sua recuperação. Para que uma medida desse tipo surta efeito, para além do ano de 2027, quando a PIS e Cofins já terão sido substituídas pela CBS, haverá a necessidade de se rever a regra absoluta do artigo 156-A, § 1º, inciso X.
Há de se pensar e propor rapidamente, portanto, algum tipo de ajuste para que o novo sistema criado pela Emenda nº 132/2023 possa também responder à altura quando houver crises similares de calamidade pública, ainda que não queiramos que eles se repitam.
Ao que nos parece, esse ajuste deve ser feito por alteração da Constituição, para que se aprove e posteriormente se regulamente um regime diferenciado para casos emergenciais de calamidade pública, como medida complementar àquelas que foram inseridas no texto constitucional por ocasião do enfrentamento da crise pandêmica recente.
A realidade se impõe em situações como essas, queiramos nós ou não.
Brasil tem menor IDH entre os 30 países com maior carga tributária
Data: 23/05/2024
O Brasil possui o menor IDH (índice de desenvolvimento humano) entre os 30 países com maior carga tributária. Com isso, ocupa a última colocação no índice de retorno de bem-estar à sociedade calculado pelo IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação).
O índice criado em 2011 busca medir a relação entre tributação e benefícios para a população.
O levantamento feito com base em dados de 2022 mostra o Brasil com uma carga de 32,4% do PIB (Produto Interno Bruto) 24ª posição entre as maiores tributações e um IDH de 0,760.
O instituto considera uma composição entre os dois números, sendo que o primeiro tem um peso de 15% no indicador e o IDH, uma ponderação de 85%.
Com base nesse critério, é pouco provável que o Brasil consiga sair da lanterna do ranking, onde está há 13 anos, desde o início da divulgação do indicador.
Para isso, seria necessário um crescimento significativo do IDH ou, mais difícil ainda, uma redução dramática da carga que poderia comprometer o funcionamento da máquina pública e o pagamento dos benefícios sociais.
O penúltimo colocado na lista é a Grécia, com carga de 41% do PIB, mas um IDH bem superior ao brasileiro (0,893).
“A gente está mostrando matematicamente que o valor decorrente dos tributos continua sendo muito mal aplicado aqui no Brasil. Apesar de termos uma carga tributária digna de países desenvolvidos, o nosso IDH reflete um desenvolvimento muito precário”, afirma João Eloi Olenike, presidente-executivo do IBPT.
O tributarista destaca que, por esse critério, o Brasil perde para países do próprio continente.
O segundo pior IDH na lista é o do Uruguai (0,83), que tem uma carga de 26,5% do PIB e está na 9ª colocação no ranking.
O terceiro pior (0,849) é da Argentina, que tem uma carga de 34,4% do PIB, um pouco acima da brasileira. A piora no primeiro indicador em 2022 fez o país vizinho cair da 13ª para a 22ª posição no índice do IBPT.
Uma análise da IFI (Instituição Fiscal Independente), órgão do Senado, apontou que o Brasil possui uma carga tributária elevada para uma economia em desenvolvimento, mas que isso é explicado em boa medida pelo tamanho dos seus gastos sociais.
A despesa social representa entre 50% e 70% da carga tributária nos países da OCDE. No Brasil, é cerca de 60%.
Benefícios previdenciários, Bolsa Família, abono salarial, seguro-desemprego e BPC correspondem a 65% da receita líquida do governo. Despesas com pessoal, quase 20%. Saúde e educação, mais 13%, sem considerar a despesa com servidores dessas áreas.
A receita líquida do governo valor que sobra depois das transferências obrigatórias a estados e municípios cobre 89% da despesa federal. Os outros 11% são financiados pelo aumento da dívida.
Reforma: split payment e crédito vinculado ao pagamento preocupam especialistas
Data: 23/05/2024
Temas como o split payment, a vinculação do creditamento ao pagamento, pelo fornecedor, do IBS e CBS, a possível manutenção da substituição tributária e as situações em que os novos tributos não gerarão créditos preocupam especialistas em Direito Tributário. O tema foi tratado na mesa de encerramento do 2º dia do III Congresso Internacional Direito Tributário, organizado pelo Instituto de Aplicação do Tributo (IAT) entre os dias 21 e 23 de maio em Trancoso (BA).
A primeira divergência entre os participantes do debate disse respeito à análise – positiva ou negativa – das mudanças trazidas pela reforma tributária. O advogado Eduardo Manera, sócio fundador do Manera Advogados e professor da Faculdade Nacional de Direito da UFRJ, se disse “otimista” em relação às alterações, principalmente por trazerem o fim do PIS e da Cofins cumulativos.
“Não podemos dizer que a CBS é a unificação do PIS e da Cofins. É uma coisa diferente”, disse, salientando que a base de cálculo da CBS será inferior se comparada às atuais bases do PIS e da Cofins. Manera lembrou que, hoje, as contribuições incidem nas mais diversas situações, como, por exemplo, a redução de dívida tributária em caso de anistia, a indenização por desapropriação e os Juros sobre Capital Próprio (JCP).
Suzy Gomes Hoffmann, advogada e professora da APET e do IBET, concordou que a reforma simplifica o sistema tributário. “Saio de uma apuração de ICMS, de IPI e de PIS/Cofins, e vou para um IBS/CBS que é complexo, mas muito menos complexo que esses três tributos juntos”, afirmou.
Por outro lado, a advogada Mary Elbe Queiroz, sócia do Queiroz Advogados e presidente do Instituto Pernambucano de Estudos Tributários (IPET), afirmou que, caso se confirme, a permanência do modelo de substituição tributária, conforme reivindicam os estados, “quebra a espinha dorsal” da reforma. “A ideia era simplificar, mas isso não vai acontecer”, disse.
Por meio da substituição tributária, hoje aplicada ao ICMS, a empresa que ocupa o primeiro elo da cadeia de produção recolhe o tributo de forma antecipada, em nome das demais companhias.
Outra crítica feita pela advogada está relacionada à impossibilidade, trazida na reforma, de creditamento nos casos em que não há pagamento de IBS e CBS pelo fornecedor. Segundo Queiroz, a prática não é recomendada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), por trazer um ônus maior ao contribuinte.
Os participantes também comentaram a impossibilidade, trazida pelo PLP 68/24, de creditamento sobre bens para uso pessoal, como automóveis e bebidas alcoólicas. Para Raquel Preto, integrante da Comissão Nacional de Direito Tributário do Conselho Federal da OAB e co-fundadora do Women in Tax (WIT), o texto gerará “uma dificuldade enorme para segregar uso pessoal e uso para algum benefício diretamente ligado ao desenvolvimento da atividade econômica”.
O advogado Gustavo Brigagão, sócio fundador do Brigagão Duque Estrada Advogados e presidente do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa), também tocou no assunto. “O sujeito passa a semana inteira fazendo vendas, mas por que usa [o carro] no fim de semana não vai ter crédito?”, questionou.
O split payment, sistemática que possibilitará o recolhimento do IBS e da CBS no momento da liquidação financeira da transação de pagamento, também foi questionado. Há uma opinião de que, mesmo com o PLP 68/24, que regulamenta a reforma, ainda não existe clareza em relação ao assunto. O professor titular de Direito Financeiro da USP e sócio do Silveira, Athias, Soriano de Mello, Bentes, Lobato & Scaff Advogados, Fernando Facury Scaff, por exemplo, elencou a situação em que a compra foi feita à vista, mas a venda a prazo. Para ele, não está claro como o creditamento se dará nesse caso.
O Imposto Seletivo, que incidirá sobre bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, foi outro tema tratado na mesa de encerramento. A advogada Lina Santin, pesquisadora e coordenadora do NEF da FGV Direito SP e sócia do Salusse Marangoni Parente Jabour Advogados, afirmou que o seletivo é um “imposto novo com cara de velho”.
Para Santin, pode se revelar prejudicial à incidência do Imposto Seletivo sobre veículos, conforme previsto no PLP 68, e na extração de recursos naturais. A advogada ainda comentou que, em seu entendimento, a reforma permite a incidência do seletivo nas exportações. “Vamos exportar tributos em uma commodity que é importante [para o país]”, disse.
Outro tema que dividiu a opinião dos participantes da mesa de encerramento foi a possibilidade de incidência concomitante do IBS/CBS e outros tributos. Para Manera, por exemplo, é possível, em algumas situações, a cobrança simultânea dos tributos e do IOF ou do ITBI. Houve divergências, entre os presentes, em relação à constitucionalidade desse recolhimento.
Especialistas querem melhor caracterização do “devedor contumaz” em projeto do governo
Data: 23/05/2024
Especialistas em legislação tributária sugeriram aos integrantes da Comissão de Desenvolvimento Econômico da Câmara dos Deputados mudanças para que seja melhor caracterizado o chamado “devedor contumaz” no Projeto de Lei 15/24, do Executivo, que prevê o endurecimento das regras contra esses devedores. A preocupação dos especialistas é não prejudicar quem esteja agindo de boa-fé.
O deputado Danilo Forte (União-CE) é o relator da proposta na comissão. Ele presidiu dois debates nesta semana sobre o assunto.
Segundo o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal, Isac Santos, o texto é claro ao se referir às empresas que foram autuadas em R$ 15 milhões ou mais e ignoraram a autuação por mais de um ano.
Mas o consultor da Federação das Indústrias do Paraná, Carlos Alexandre Tortato, disse que existem trechos no projeto que se referem apenas a empresas que estejam devendo mais que o seu patrimônio ou que estejam discutindo os seus débitos; o que, segundo o advogado, é uma situação comum.
O próprio Isac Santos, porém, afirma que o texto não dá conta da situação de algumas empresas que até buscam serem incluídas na dívida ativa para poderem fazer negociações com a Receita. Isso porque, durante a fase administrativa, isso não seria possível.
Diretora do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás, Valéria Lima ressaltou a importância de atuar sobre os devedores contumazes de maneira efetiva. “Normalmente, eles cometem outras infrações. Adulteram a qualidade do produto, não fazem as misturas necessárias, adulteram o volume da bomba, etc. Ao se tirar do mercado um agente por não pagamento de tributos, na verdade você está tirando agentes que fazem outros ilícitos e que prejudicam o consumidor brasileiro”, disse.
Valéria também afirmou que será necessário unificar as regras sobre devedores contumazes porque os estados também têm legislação sobre isso.
O deputado Florentino Neto (PT-PI) concordou com a medida. “O cidadão não quer saber se o prejuízo está sendo para a Receita Federal, no âmbito da arrecadação federal, ou do estado. O importante é que todos os entes tenham a condição de ter uma ferramenta como essa à disposição para que a gente possa combater as práticas dos devedores contumazes.”
Para Vicente Braga, da Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal, é urgente reduzir as dívidas tributárias porque o estoque é muito alto. Segundo ele, o Acre é o estado que mais consegue recuperar essas dívidas e mesmo assim são apenas R$ 2,30 revertidos aos cofres públicos para cada R$ 100 devidos.
A reforma tributária: um olhar estrangeiro
Data: 24/05/2024
Muito se disse sobre o espelhamento entre o modelo brasileiro de tributação sobre o consumo pós-reforma tributária e o modelo de Imposto sobre o Valor Agregado. Obviamente, toda implementação efetiva de modelos importa em adaptação à cultura e elementos locais. Mas uma proximidade de modelos importa em uma maior compreensibilidade dos sistemas. Assim, em um mundo de operações globais e de competição internacional pela atração de investimentos, é inquestionável que a reforma tributária traz um sistema que fica melhor na vitrine.
Um desses pontos, obviamente, é a redução do número de tributos, com a criação de uma contribuição (a CBS) e um imposto (o IBS) com fato gerador e base de cálculo similares ao modelo europeu. Por exemplo, o IVA Europeu incide sobre operações de entregas de bens/prestações de serviço a título oneroso por um sujeito passivo agindo nessa qualidade, assim como sobre as importações de bens (artigo 2º da Diretiva IVA). Na versão brasileira, muito similar, indica-se que o IBS e a CBS incidem sobre operações onerosas com bens ou serviços. Nessa formulação abrangem-se as hipóteses anteriormente abrangidas por IPI, ICMS e ISSQN, mas também se afetam as zonas anteriormente gris. Para não haver dúvidas, entretanto, dado às discussões históricas próprias da realidade brasileira, enumeram-se algumas hipóteses que também estarão dentro desse guarda-chuva, tais como trocas, permutas, licenciamento, empréstimos etc. É chover no molhado, obviamente, mas como intenções de garantia de segurança jurídica.
De forma similar, o sistema de creditamento mudou, favorecido tanto pela concentração de tributos, eis que tributos distintos não geravam créditos entre si, quanto pela ampliação qualitativa da tributação. Nesse ponto, novamente, há um espelhamento parcial entre a legislação brasileira e a europeia. Para começar, adota-se a ideia de crédito financeiro, ou seja, a possibilidade de creditamento, “quando os bens e serviços sejam utilizados para fins das suas operações tributadas” (artigo 168, Diretiva IVA) ou, na formulação brasileira, o creditamento é possível, “excetuadas exclusivamente as operações consideradas de uso ou consumo pessoal e as demais hipóteses previstas nesta lei complementar” (artigo 28, PLP 68/24). Há um ponto, no entanto, em que o contexto da realidade brasileira se impõe, enquanto no modelo europeu se aceita que o IVA seja devido ou pago para fins de creditamento, no sistema brasileiro exige-se que o IVA tenha sido pago. Será um vestígio da interpretação da não cumulatividade à brasileira?
Seria um exercício acadêmico divertido comparar ponto a ponto em que medida o modelo IVA europeu e o brasileiro convergem. Mas não é só por se tratar de um exercício acadêmico que ao longo do tempo investidores/intérpretes vão fazer essa reflexão. A verdade é que a confluência do sistema brasileiro para uma maior racionalidade consolidando uma grande base tributável e creditável é, em si, uma vitrine. É uma vitrine conhecida. É dizer ao curioso estrangeiro: você pode entender a regra do nosso jogo. Ao olhar estrangeiro, que não entra em minúcias entre o “devido” e o “pago”, as regras do ambiente de negócios parecem mais familiares e mais simples.
Ainda a pensar de um lugar estrangeiro, as mudanças na tributação aduaneira também são importantes. No cenário pré-reforma, havia uma cascata de tributação cumulativa na importação, parcialmente reduzida com a redução dos tributos incidentes sobre a operação. De modo similar, uma tributação interna mais clara importa em mais efetividade na imunidade das exportações, consagrando-se a tributação no país de destino.
Com um impressionante mercado consumidor e uma cultura que favorece o ideal de “compra como um milionário”, os brasileiros são público-alvo das plataformas digitais internacionais. Em uma luta similar a de outros países do mundo, entendeu-se por definir que as plataformas digitais, ainda que domiciliadas no Brasil, serão responsáveis pelo recolhimento do IBS e da CBS (artigo 23). Ainda que a exequibilidade dessa disposição possa ser profundamente questionável quando se trabalha com empresas sem qualquer materialidade econômica no Brasil e que a sua operacionalização importe em criar burocracias específicas ao setor, a verdade é que essa inclusão se alinha a debates internacionais sobre a ética fiscal.
Aliás, a ética fiscal – e suas implicações potenciais práticas – é o que mais se tem discutido no exterior. Quando perguntei a diversos tributaristas estrangeiros qual a perspectiva deles sobre a reforma tributária brasileira, surpreendi-me com um foco bem diferente do que eu havia imaginado. Talvez por verem o sistema de fora começaram a comentar sobre as mudanças nos preços de transferência, nos tratados, nas CFCs brasileiras. Estavam curiosos se o Brasil, na sua intenção de tributar as plataformas digitais sobre a renda, seguiria mais o modelo da ONU ou da OCDE. Enquanto eu os ouvia, tive a impressão de que finalmente pegamos o bonde, esperemos que não tarde demais para sentar na janelinha.
Pilar Coutinho é colaboradora do blog Fio da Meada, consultora tributária na HerreveldvandenHurk & Partners, professora e pesquisadora na PUC-MG, onde fez doutorado com período de investigação na ULisboa.
https://valor.globo.com/legislacao/coluna/a-reforma-tributaria-um-olhar-estrangeiro.ghtml
O que muda para as entidades do terceiro setor após a reforma tributária?
Data: 24/05/2024
No dia 20/12/2023 foi promulgada a Emenda Constitucional 132 (PEC 45/2019), mais conhecida como reforma tributária. Aprovado pela Câmara dos Deputados no dia 15 daquele mês, o novo texto normativo tem como foco a simplificação do sistema tributário nacional. Apesar de não ser o objetivo da normativa, as mudanças trazidas pelo projeto impactam de forma direta e indireta o trabalho das entidades do terceiro setor.
De início, destaca-se que a imunidade tributária prevista no artigo 150, VI, “c”, da Constituição, permanece: o Estado não pode instituir impostos sobre “patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei”. Dessa forma, instituições que possuem o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (Cebas) mantêm-se imunes ao pagamento de impostos.
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Essa vedação, contudo, não se aplica aos tributos de forma geral. Apesar de não sofrerem a incidência de impostos, as organizações de assistência social ainda devem arcar com outros tributos — tais quais taxas, contribuições de melhoria e contribuições especiais. Essa diferenciação é o que justifica a maior preocupação das instituições beneficentes com a reforma: a perda de isenções fiscais e o aumento da carga tributária.
Unificação de tributos
Uma das principais alterações trazidas pela nova normativa é a unificação dos tributos sobre bens e serviços. Cria-se, portanto, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) que substitui o ICMS e o ISS — e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) — em substituição ao PIS e Cofins.
Atualmente, as instituições filantrópicas elegíveis possuem isenção tributária quanto ao PIS/Cofins, conforme artigo 195, §7º, da Constituição Federal, regulamentado pela Lei Complementar 187/2021. Porém tal isenção não foi replicada para os novos tributos no texto constitucional. As exceções já delimitadas dizem respeito apenas a:
Redução de 100% da alíquota do CBS para:
serviços prestados por entidades de inovação, ciência e tecnologia sem fins lucrativos, e
serviços de educação de ensino superior nos termos do Prouni.
Redução de 60% da alíquota para alguns serviços, dentre eles:
serviços de educação;
serviços de saúde,
produções artísticas, culturais, de eventos, jornalísticas e audiovisuais nacionais, atividades desportivas e comunicação institucional.
A questão dos incentivos
Outro ponto de atenção é que, até o momento, não há previsão de incentivos fiscais às instituições sem fins lucrativos — incentivos esses que hoje estão previstos nas legislações municipais e estaduais, com a possibilidade de destinação de parte do ICMS e do ISS para o financiamento de projetos de interesse público.
Contudo, tanto os incentivos quanto as isenções fiscais ainda podem ser objeto de regulamentação por meio de leis complementares, as quais serão necessárias para a implementação dos novos tributos. É fundamental, portanto, que as entidades continuem acompanhando e ativamente participando dos debates que seguirão no próximo ano.
Não incidência do ITCMD
Além do exposto, a Reforma Tributária trouxe também uma grande vitória para o terceiro setor: a não incidência do ITCMD (Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doações de Quaisquer Bens e Direitos) sobre as doações destinadas às organizações sem fins lucrativos com finalidade de relevância social, organizações assistenciais, beneficentes, religiosas e institutos científicos, observados os requisitos a serem previstos em lei complementar.
Trata-se de um grande avanço para as instituições filantrópicas, uma vez que a medida traz maior segurança jurídica tanto aos doadores quanto aos donatários. Com isso, espera-se um possível aumento de doações e, consequentemente, um aumento na execução de projetos com relevância social.
Considerações finais
As novas regras trazidas pela reforma tributária ocorrerão de forma gradativa, sendo que as primeiras mudanças quanto ao IBS e CBS serão efetivamente iniciadas a partir de 2026. Até 2027 deverá ser implementado de forma integral o CBS, extinguindo o PIS/Cofins. Já o IBS permanece com a alíquota de 0,1% até 2028, substituindo o ICMS e o ISS gradativamente de 2029 a 2032.
Será um período importante para a adaptação das entidades — que, como já dito, deverão participar diretamente na fase das legislações complementares que regulamentarão as previsões tributárias constitucionais. Além disso, os significativos benefícios decorrentes, principalmente, da previsão quanto ao ITCMD, deverão ser considerados nos planejamentos futuros das instituições, para uma atuação consciente e direcionada às novas possibilidades de receita.
https://www.conjur.com.br/2024-mai-24/o-que-muda-para-as-entidades-do-terceiro-setor-apos-a-reforma-tributaria/
Receita Federal regulamenta o benefício fiscal concedido no âmbito do Setor de Eventos
Data: 25/05/2024
Foi publicada a Instrução Normativa RFB nº 2.195, de 23 de maio de 2024, que dispõe sobre a habilitação e a fruição do benefício fiscal concedido no âmbito do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse).
Entenda
A Lei nº 14.148, de 3 de maio de 2021, instituiu o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) com o objetivo de criar condições para que o setor de eventos pudesse mitigar as perdas oriundas do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.
Até recentemente, o benefício fiscal decorrente do Perse não exigia manifestação prévia da Receita Federal do Brasil para o início de sua fruição (benefício de autofruição).
Com a publicação da Lei nº 14.859, de 22 de maio de 2024, foi incluído o art. 4º- B na Lei nº 14.148, de 2021, que passou a condicionar a fruição do benefício à sua prévia habilitação por parte da RFB.
A nova redação da Lei nº 14.148, de 2021, estabelece que:
a fruição do benefício fiscal está condicionada à habilitação prévia no prazo de sessenta dias a contar da regulamentação do referido art. 4º- B, ora realizada pela Instrução Normativa da RFB;
transcorrido o prazo de trinta dias após o pedido de habilitação sem que tenha havido a manifestação da RFB, a pessoa jurídica será considerada habilitada.
Cronograma
O art. 4º da Instrução Normativa dispõe que a habilitação para fruição do benefício fiscal deverá ser requerida no prazo de sessenta dias, contado de 3 de junho de 2024.
A data inicial da habilitação permite a realização de ajustes em sistemas informatizados e proporciona ao contribuinte maior prazo para conhecer a alteração da legislação e preparar-se para a habilitação prévia.
Dessa forma, o seguinte cronograma deverá ser observado:
No período de 3 de junho a 2 de agosto de 2024, os contribuintes transmitirão os requerimentos de habilitação;
Até 1º de setembro de 2024, a Receita Federal se manifestará a respeito dos requerimentos transmitidos;
Em caso de não manifestação da Receita Federal no prazo de trinta dias, contado a partir do protocolo do requerimento, o contribuinte será considerado tacitamente habilitado;
Desde que o protocolo do requerimento seja realizado no período de 3 de junho a 2 de agosto de 2024, a fruição do benefício retroage à data de vigência da Lei nº 14.859, de 2024, de forma que não haverá prejuízo à empresa devidamente habilitada.
Como pedir habilitação
O requerimento de habilitação será efetuado, a partir de 3 de junho de 2024 e, impreterivelmente, até 2 de agosto de 2024, por meio do Centro Virtual de Atendimento ao Contribuinte – e-CAC, disponível no site da Receita Federal na Internet, no endereço eletrônico https://www.gov.br/receitafederal/.
Receita adota tratado e permite alíquota menor de IRRF
Data:26/05/2024
A Receita Federal permitiu que uma refinaria de petróleo brasileira adote alíquota menor do Imposto de Renda (IRRF) em operações com os Emirados Árabes Unidos (EAU) — país que está na “lista negra” do órgão por ser considerado paraíso fiscal. Na visão da Fisco, mesmo que o país do Oriente Médio esteja em jurisdição de tributação favorecida e a alíquota maior, de 25%, devesse ser aplicada, prevalece o tratado firmado entre os dois países, que afasta a dupla tributação e prevê alíquota de 15% na contratação de serviços técnicos.
O entendimento está na Solução de Consulta nº 110, editada recententemente pela Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), que vincula todos os auditores fiscais. Segundo tributaristas, a interpretação é importante por seguir a jurisprudência dos tribunais superiores, que determina a prevalência de tratados internacionais sobre a legislação interna. Os EAU são um dos 38 países com quem o Brasil tem acordo para evitar dupla tributação e prevenir a evasão fiscal.
O contribuinte resolveu consultar a Receita para saber qual regra aplicar: a estabelecida no tratado entre os dois países (Decreto nº 10.705, de 2021), que prevê alíquota de 15% na contratação de serviço técnicos com empresas nos EAU, ou a da Lei nº 9.779, de 1999, aliada a uma instrução normativa, que incluíram os Emirados Árabes no rol de jurisdições favorecidas. Para evitar a evasão fiscal, o percentual aplicado seria de 25% do IRRF. Por ter uma posição mais conservadora, a empresa que fez a consulta tem feito a retenção na fonte pela segunda opção.
Ao responder ao questionamento, a Receita afirmou que, mesmo que os tratados não tenham força para revogar a legislação interna, o artigo 98 do Código Tributário Nacional (CTN) assegura que devem ser priorizados. “Os tratados internacionais não revogam a legislação interna. Ela continua válida, porém tem sua aplicação contida pelo tratado internacional. Desse modo, o tratado age limitando a pretensão tributária do Estado”, afirma a Cosit. A Receita reforçou ser preciso cumprir os requisitos do tratado, como comprovar a residência da empresa nos EAU, para usufruir dos benefícios.
Na visão do tributarista Caio Malpighi, do escritório VBSO Advogados, o esclarecimento é relevante, pois ilustra a importância da obediência aos tratados para definir a tributação de remessas ao exterior. “É muito positivo para os contribuintes, porque é um caso em que a empresa está em paraíso fiscal. A regra específica diz que a alíquota aplicada deveria ser majorada”, afirma.
A notícia, acrescenta, é positiva para quem importa serviços do exterior e arca, no contrato, com o ônus da alíquota maior do IRRF. Segundo Malpighi, esses contratos podem se tornar menos onerosos para os contratantes, que já prevendo a retenção, pagam mais caro pelos serviços. Ele também diz que o IRRF é uma forma de simplificar a cobrança de tributos e, nos casos em que há a contratação internacional, é a maneira da Receita tributar a renda de pessoas fora do Brasil.
Apesar do aparente conflito entre as normas, o advogado Renato Coelho, sócio do Stocche Forbes Advogados, afirma que “não há antinomia” entre elas. “Se você não partir do pressuposto que o tratado tem prevalência sobre a lei interna, esvazia o motivo da existência do tratado”, diz ele, lembrando de precedentes do Supremo Tribunal Federal (STF) e Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Segundo o advogado, seria sensato remover os Emirados Árabes Unidos na lista de países considerados paraísos fiscais pela Receita, já que o tratado dá tratamento diferenciado. “Há uma incoerência entre o Brasil evitar dupla tributação com determinado país e, ao mesmo tempo, considerar como paraíso fiscal”, afirma Coelho, adicionando que esse tema não teria como vir na solução de consulta.
Ele também entende que, apesar de a Cosit se referir apenas a serviços técnicos, a mesma lógica se aplica para rendimentos de outras naturezas, como pagamento de juros, dividendos ou ganho de capital. “Se vier uma legislação que passe a fazer a tributação de dividendos com alíquota de 20%, o tratado continuaria limitando a alíquota a 15%”, diz. “Não será aplicada a alíquota interna se a alíquota do tratado for inferior”, adiciona.
O tratado foi firmado durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, durante um contexto político de aproximação entre os dois países. “Quando há a aproximação comercial, não é desejável a dupla tributação. Torna a relação onerosa e acaba desincentivando os negócios”, afirma o advogado Caio Malpighi.
Carf bate recorde e reduz em R$ 110 bi estoque de processos
Data: 27/05/2024
O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) vem conseguindo reduzir o estoque de processos, encerrando casos de maior valor e alcançando volumes recordes de julgamentos: em abril, foram cerca de R$ 110 bilhões em processos analisados, a melhor marca desde dezembro de 2019. O órgão recursal é a principal aposta do Ministério da Fazenda para elevar a arrecadação e atingir a meta de déficit zero este ano.
O número de abril ainda será consolidado oficialmente, mas foi antecipado ao Valor pelo presidente do Carf, Carlos Higino. Em março, o tribunal administrativo já havia alcançado um volume recorde de julgamentos. A queda no estoque foi de R$ 70 bilhões, a maior desde a pandemia.
O estoque, porém, ainda soma cerca de R$ 1 trilhão, distribuídos em aproximadamente 80 mil processos tributários. De acordo com Higino, esse valor continua alto porque, enquanto há processos saindo do Carf, outros estão entrando a partir de recursos contra condenações proferidas pelas Delegacias Regionais de Julgamento (DRJs).
A meta de julgamentos para 2024 segue em R$ 870 bilhões, para gerar uma arrecadação de R$ 55,6 bilhões, montante mantido no relatório de receitas e despesas do governo apresentado na última semana – além dos casos em que sai vitorioso, o contribuinte, quando perde, ainda pode recorrer ao Poder Judiciário. O Carf não faz o controle de quantos encerram a disputa na esfera administrativa ou dão sequência ao litígio.
No segundo semestre, a ideia é acelerar os julgamentos. O Conselho pretende lançar um sistema de inteligência artificial para ajudar os conselheiros a elaborarem as minutas dos votos. O sistema vai se chamar “Iara” e está sendo desenvolvido em parceria com o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro). “Quando estiver rodando, teremos como aumentar a produtividade dos conselheiros”, disse Higino.
Além disso, o presidente espera uma mudança no fluxo de julgamentos com a aprovação de súmulas. Desde a edição da Lei nº 14.689, de 2023, as súmulas do Carf passaram a ser de observância obrigatória pelos auditores fiscais, o que significa que as Delegacias Regionais de Julgamento também precisam seguir os entendimentos do Conselho – antes não eram obrigados, então podiam julgar de forma diferente, o que dava margem para recursos ao Carf apenas para aplicação da jurisprudência.
“Precisamos ter uniformidade e que as decisões do Conselho consigam ser observadas desde o lançamento na Receita Federal”, afirmou Higino.
Vários fatores contribuíram para as quedas recordes do estoque, de acordo com o presidente. Os principais são: julgamentos de casos de alto valor, o que não foi possível durante a pandemia de covid-19, o retorno do voto de qualidade (o desempate pelo voto duplo do presidente da turma julgadora, representante da Fazenda) e a regulamentação do bônus dos auditores – até o pagamento ser regulamentado, sessões foram paralisadas por falta de quórum. Ainda foram criadas novas turmas de julgamento e o número de conselheiros aumentou.
Higino destacou ainda que “algumas decisões do Carf incentivaram transações e acordos no âmbito da PGFN [Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional]”. Ele citou como exemplo o recém-aberto edital sobre contratos de afretamento, uma discussão bilionária que o setor de óleo e gás vem perdendo no Carf.
Em 2023, ainda ocorriam pedidos para retirada de pauta de grandes processos, o que tem se normalizado, segundo o presidente. “Em 2024 e talvez 2025, devemos ter uma redução muito forte do valor [do estoque]. O montante de R$ 1 trilhão é inaceitável”, disse. Além do valor do estoque, o presidente também projeta uma redução no número de processos na sequência, nos próximos dois anos.
“Estamos caminhando para ver o Carf dobrar o recorde de valores julgados em um único ano, que atualmente é de R$ 430 bilhões”, afirmou Jorge Mussa, do Pinheiro Neto Advogados.
Em 2015, lembrou o tributarista, o Tribunal de Contas da União (TCU) estimou que seriam necessários 77 anos para julgar todo o acervo de processos no Conselho e, desde então, foram implementadas diversas mudanças, como os lotes de repetitivos e o aumento do número de turmas julgadoras com o mesmo número total de conselheiros.
No ritmo atual, acrescentou, o Carf levaria apenas 10 anos para julgar todos os processos. “Mas poderá diminuir pela metade o valor em estoque ainda neste ano, se consolidando como um exemplo de sucesso em gestão processual.”
A advogada Ana Paula Lui, sócia do Mattos Filho, destacou que o Carf ainda vem fazendo alguns ajustes para aumentar o volume de julgamentos, como a criação de novas turmas – mesmo que para isso desfalque, ainda que temporariamente, turmas existentes. Para a advogada, o mês de maio foi de ajuste de turmas e até distribuição de processos. “Isso pode ter dado uma truncada no andamento que vinha bem e corrido, com muitos julgamentos”, afirmou.
A tributarista espera que o ritmo continue acelerado no segundo semestre. “Até pelo volume de processos pautados, vemos que eles estão levando a sério aumentar o número de julgamentos e zerar o estoque”, disse. O Carf tem, inclusive, acrescentou, realizado algumas sessões de julgamento durante as segundas e sextas-feiras – as sessões eram sempre de terça a quinta.
A advogada afirmou que ainda não é possível observar se o Carf está mais ou menos favorável aos posicionamentos da Receita Federal. Mas disse ter percebido mudanças em decorrência da retomada do voto de qualidade. “Está bem parecido com o que o Conselho já era, inclusive com a volta de alguns antigos conselheiros.”
GTs da reforma tributária avançam para aprovar regulamentação no primeiro semestre
Data: 27/05/2024
Com a formalização dos grupos de trabalho que vão discutir a regulamentação da reforma tributária do consumo, a Câmara dos Deputados deve avançar, nesta semana, na discussão do tema em busca de garantir que a proposta seja votada na Casa ainda no primeiro semestre. Depois de quase um mês da entrega da primeira proposta do governo ao Congresso Nacional, o presidente da Câmara, Arthur Lira, anunciou na última terça-feira (21/5) a criação de dois grupos.
O primeiro, que discutirá a Lei Geral do IBS, da CBS e do Imposto Seletivo, já foi instalado e deve votar o plano de trabalho na terça-feira (28/5) que vem. No mesmo dia, está marcada audiência pública com o secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, e com confederações nacionais dos setores econômicos.
O segundo grupo, que ficará responsável por discutir a operacionalização e fiscalização do IBS, bem como o Comitê Gestor e a distribuição da arrecadação, no entanto, ainda não foi instalado. A ideia é que ele seja instituído após o envio do segundo projeto do governo — o que deve ocorrer nesta semana, provavelmente na terça-feira (28/5), de acordo com fontes da Fazenda.
A composição deste segundo grupo, no entanto, já é criticada por parlamentares do Centro-Oeste e do Norte, já que não há representatividade dos estados da região no colegiado. Embora seja voltado à regulamentação da questão federativa, ele traz parlamentares apenas de São Paulo, Pernambuco, Ceará, Paraná, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Ao JOTA, o deputado Joaquim Passarinho (PL-PA), que compõe o primeiro grupo, avalia que é “perigoso” que as regiões não contempladas fiquem sem representação no segundo grupo. “Não culpo o presidente Lira, porque a indicação foi dos partidos. A gente precisa estar sempre conversando, mas por mais que eu seja do Norte, não tenho influência no outro grupo. As bancadas estaduais vão ter de participar, acompanhar as discussões, mas logicamente seria importante ter as regiões contempladas”, disse o parlamentar.
O primeiro grupo, que já iniciou os trabalhos, anunciou que fará uma rodada de audiências pelos estados e que cada parlamentar deve visitar três ou quatro unidades da Federação para ouvir as demandas. As agendas, datas e distribuição dos estados por componentes, no entanto, ainda não estão definidas. Além disso, o primeiro passo será ouvir os setores e as demandas antes de começar a ajustar os textos.
O grupo não terá divisão temática nem relatorias setoriais, como antes havia sido ventilado, e todos os componentes vão contribuir com o texto final. Ao fim do processo, ainda não está definido se será uma relatoria conjunta ou se um parlamentar fará a assinatura do relatório construído em conjunto. A coordenação do grupo será revezada a cada reunião, seguindo a ordem alfabética.
“Primeiro nós vamos realizar uma ampla rodada de diálogos com as confederações que representam os diversos setores. Depois, com segmentos mais específicos de cada setor, com associações. E aí os próximos passos do grupo vão combinar com a política. Mas o primeiro passo é ouvir o secretário Bernard Appy, que vai contextualizar o ponto a ponto, o contexto e a concepção do texto do PLP 68/2024”, explicou o deputado Reginaldo Lopes (PT-MG) ao JOTA.
Mobilização dos setores
Setores também se preparam para garantir alterações na proposta de regulamentação da reforma no Congresso Nacional. Estudo do Sindusfarma, ao qual o JOTA teve acesso, aponta que anexos do PLP 68/2024 apresentam incorreções na nomenclatura, incoerências relacionadas ao percentual de desconto, repetições e omissões. A entidade prepara uma nota técnica que será enviada em breve para parlamentares que integram o GT encarregado de relatar o PLP 68/2024 alertando para o problema.
Enviado no fim de abril, o PLP lista, em três anexos, 850 substâncias e 71 fórmulas de nutrição enteral e parenteral que terão alíquota em 40% e 383 substâncias com alíquota reduzida em 100%. Alguns produtos, no entanto, constam em mais de uma lista — o que impede saber ao certo qual tratamento será de fato dado. Entre outros problemas, o presidente-executivo do Sindusfarma, Nelson Mussolini, afirma que, para fazer os anexos, o governo usou como base listas positivas e negativas editadas em 2014, mas houve mudanças no mercado desde então.
Além disso, ele avalia que a lógica de editar listas com descontos perpetua um problema que já havia sido identificado no passado, uma vez que é necessário ter agilidade para fazer alterações. Mussolini afirma que a lista traz ainda problemas de distorções concorrenciais, já que produtos de mesma indicação terapêutica terão tratamentos distintos.
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Carf afasta multa sobre cobrança bilionária do Magazine Luiza
Data: 22/05/2024
O Magazine Luiza conseguiu, no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), afastar multa em cobrança bilionária de PIS e Cofins sobre a venda de eletrônicos. A penalidade, de 75% sobre o valor das contribuições sociais, foi anulada porque os conselheiros entenderam que a varejista estava protegida por liminar contra o pagamento dos tributos – cassada e posteriormente restabelecida – durante a fiscalização da Receita Federal que levou à autuação fiscal.
O auto de infração, somando os tributos devidos, multa de ofício e juros é de R$ 2,2 bilhões. O valor isolado da multa não foi especificado no processo, mas advogados estimam que é de cerca de R$ 800 milhões. A decisão unânime é da 1ª Turma da 3ª Câmara da 3ª Seção e, segundo especialistas, serve de precedente para os contribuintes, principalmente para os que entram na Justiça para suspender a cobrança de impostos. Cabe recurso.
A discussão começou no Judiciário, em 2016, quando o Magalu pediu a isenção das contribuições sociais na venda de mercadorias eletrônicas, por conta da Lei do Bem (Lei n° 11.196/05). O programa, que deveria durar até 2018, foi revogado em 2016. Para usufruir dos benefícios até o fim do período estabelecido inicialmente, ela foi à Justiça.
A empresa conseguiu liminar (tutela de urgência) contra o pagamento dos tributos em janeiro de 2016. A decisão foi cassada em agosto de 2018, mas restabelecida pela segunda instância um mês depois, em setembro de 2018. Justamente nesse intervalo em que a liminar não estava vigente, a Receita Federal iniciou a fiscalização contra a companhia. O auto de infração oficialmente só veio em outubro de 2019.
Para a Receita, a multa poderia ser aplicada porque quando se iniciou a fiscalização a tutela não estava vigente. Para a empresa, a multa é “um absurdo” e “descabida”, pois a liminar voltou a valer em menos de 30 dias, prazo processual estabelecido pela legislação tributária para o pagamento de um imposto que estava com a exigibilidade suspensa.
“No nosso ordenamento jurídico, quando uma liminar é cassada, ela ainda tem um lapso temporal de produção de efeitos de 30 dias”, diz o diretor jurídico do Magalu, José Aparecido. “A Receita Federal de forma absolutamente equivocada e absurda não considerou o restabelecimento da liminar e fez o auto de infração com a multa, que nunca poderia ter sido aplicada.”
Além da multa, o Magalu questionou o valor do tributo cobrado, alegando erro na base de cálculo. Esse pedido não foi acatado pelo Carf, que afastou apenas a penalidade e manteve o principal. Caso a ação judicial seja finalizada de forma desfavorável, a empresa precisará pagar o imposto apenas acrescido de juros.
Na visão de Aparecido, são baixíssimas as chances da varejista de perder no Judiciário, onde ocorre a discussão de mérito sobre o pagamento do tributo. “Esse assunto está pacificado no Superior Tribunal de Justiça. Não temos a provisão porque não temos preocupação sobre a disputa, a chance é remota”, diz ele, citando julgados da 1ª e 2ª Turmas (REsp 1928635 e REsp 1848221).
O processo judicial aguarda julgamento no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), com sede em Brasilia. No tribunal administrativo, a empresa deve recorrer sobre o “detalhe” do valor do tributo, segundo Aparecido.
A relatora da ação no Carf, a conselheira Juciléia de Souza Lima, afirmou que é como se a cassação da liminar “não tivesse existido”. Ou seja, desde 2016, quando concedida a primeira tutela, “a recorrente conta com decisão vigente suspendendo a exigibilidade do crédito tributário”.
A conselheira ainda suscitou os princípios da segurança, certeza e estabilidade das relações jurídicas que, se não respeitados, poderiam criar “situações afrontosas ou, no mínimo, indesejáveis à ordem jurídica”. “Restabelecida a liminar concedida, por óbvio, não se apresentou tal decisão como se nova decisão judicial fosse, a qual teria efeitos apenas para períodos futuros”, diz ela no acórdão, publicado recentemente (processo nº 13855.721993/2019-66).
Segundo advogados, o Fisco tem até cinco anos, desde o fato gerador, para fazer a cobrança da dívida, sob o risco de prescrever – período conhecido como decadência. Para o tributarista Vinícius Caccavali, do VBSO Advogados, é dever da Fazenda usar esse prazo. “Se a Receita não fizer nada, decai seu direito de cobrar”, afirma. “Mas quando ela faz isso, não pode aplicar multa se o Judiciário autorizou que o contribuinte não pagasse o imposto”, completa.
O tributarista Thiago Cerávolo Laguna, sócio do escritório Dib, Almeida, Laguna e Manssur Advogados, chama a atenção que a fiscalização se iniciou em setembro de 2018, dois dias antes do restabelecimento da liminar pelo TRF-1, e o auto de infração só foi lavrado mais de um ano depois, em outubro de 2019 – mais um argumento para não ter sido cobrada a multa de ofício.
“Quando a autoridade administrativa praticou o auto de infração, a exigibilidade do crédito já estava suspensa porque foi restabelecida a liminar. Então, não poderia ter aplicado a multa. Se o auto de infração tivesse sido lavrado 15 dias antes do restabelecimento da liminar, aí sim a multa poderia ser devida”, afirma Laguna.
Para os dois advogados, a decisão é positiva e pode servir como argumentação em outras discussões semelhantes. “O precedente dá mais relevância para a lavratura do auto de infração do que para o início da fiscalização, então enquanto não foi constituído o crédito tributário, posso brigar pelo restabelecimento da liminar para que a multa não seja lançada quando da autuação”, conclui Thiago Laguna.
GE vence caso milionário sobre classificação fiscal de turbinas eólicas no Carf
Data: 23/05/2024
Por unanimidade, a 3ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) afastou parte da autuação contra a empresa por erro na classificação fiscal, em um caso envolvendo R$ 74 milhões em valores atualizados. Foi vencedor o entendimento de que o contribuinte pode classificar o conversor de energia como parte indissociável do aerogerador, nome dado à turbina eólica. Isso significa que o equipamento pode ser tributado à alíquota zero de IPI e não à alíquota de 15%, percentual aplicável se o conversor de energia fosse considerado isoladamente.
O caso chegou ao Carf após a fiscalização autuar a empresa por alterar indevidamente a classificação fiscal de cinco componentes do aerogerador: sistema de interface meteorológica, sistema de gerenciamento do site; o software sistema Scada; kit laptop para utilização do Scada e conversor de energia. Segundo o fisco, a empresa alterou a classificação fiscal sob a qual as peças foram importadas, dando saída dos componentes de seu estabelecimento como se todos formassem uma peça única com o aerogerador.
Ao classificar os itens como uma peça única, o contribuinte aplicou a alíquota zero do IPI. Se cada componente fosse classificado individualmente, a alíquota seria de 15% para cada. No Carf, a turma ordinária manteve o entendimento do fisco e a empresa recorreu.
Na Câmara Superior, o advogado da empresa afirmou que, devido às dimensões de um aerogerador, é preciso importar os componentes de forma separada. A torre, por exemplo, pode ultrapassar 200 metros de altura, e cada hélice pode medir cerca de 80 metros. Porém, segundo o defensor, após a montagem a turbina eólica pode ser tratada como uma unidade. Ele afirmou que que quando várias máquinas formam uma unidade no contexto de um equipamento, a classificação deve se dar de acordo com a função principal.
A relatora, conselheira Liziane Angelotti Meira, deu parcial provimento ao recurso da empresa, para permitir que conversor de energia fosse considerado parte integrante do aerogerador. A julgadora entendeu que o equipamento está fisicamente instalado na turbina eólica e funciona como uma central de controle e conversão de energia. Já os demais equipamentos, conectados por cabos, seriam acessórios. Os demais conselheiros acompanharam o voto de forma unânime.
O processo tramita com o número 10830.727851/2016-50.
Carf: empresa deve recolher PIS/Cofins não cumulativo por usar IGP-M em contrato
Data: 27/05/2024
Por voto de qualidade, a 1ª Turma da 3ª Câmara da 3ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) decidiu pela tributação não cumulativa de PIS e Cofins à empresa de fornecimento de energia elétrica AES Tietê Energia S.A.. Foi vencedora a posição de que a adoção do Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M) para o cálculo tarifário desvirtua o caráter de preço pré-determinado em contrato e afasta o regime cumulativo.
A empresa calculava os tributos pelo regime cumulativo por estar enquadrada no regime de preço pré-determinado da Instrução Normativa (IN) 658/06, que dispõe sobre as receitas relativas a contratos firmados anteriormente a 31 de outubro de 2003. O fisco entende que o reajuste pelo IGP-M, entretanto, gera a necessidade de cálculo tanto do PIS quanto da Cofins pelo regime não cumulativo, ou seja, com uma alíquota maior, porém com a possibilidade de tomada de créditos.
O conselheiro Rodrigo Lorenzon Yuan Gassibe, relator do processo, acatou o posicionamento da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) pelo recálculo das contribuições referentes ao ano de 2015, estimadas em R$ 279,6 milhões.
De acordo com Gassibe, para manter a cumulatividade, seria preciso adotar o índice de custo de contrato, conforme a instrução normativa, mas a empresa adotou o IGP-M. Com isso, as alíquotas saltam de 0,63% e 3% a 1,65% e 7,60%, quanto ao PIS e à Cofins, respectivamente.
O relator foi acompanhado pelo conselheiro Wagner Mota Momesso de Oliveira. Os demais membros do colegiado, Laércio Cruz Uliana Júnior e Jucélia de Souza Lima, votaram em favor do contribuinte, admitindo que o índice aplicado pela empresa estaria correto, permitindo, assim, o regime de cumulatividade.
Processo Relacionado: 13896.721434/2019-70
NOTÍCIAS RELACIONADAS A DECISÕES JUDICIAIS:
- FEDERAIS:
STJ decide que MP não tem legitimidade para pedir interrupção da cobrança de tributo
Data: 22/05/2024
A 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, estabeleceu que o Ministério Público não pode ajuizar uma ação com propósito de impedir a cobrança de um tributo, mesmo que este tenha sido declarado inconstitucional. O entendimento foi estabelecido no julgamento do recurso especial (REsp) 1.641.326.
O processo começou quando o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) apresentou uma ação civil pública em que requereu que a concessionária Ampla Energia e Serviços fosse impedida de continuar cobrando dos consumidores a alíquota de ICMS de 25% sobre as contas de energia. Segundo o MPRJ, a alíquota havia sido declarada inconstitucional pelo órgão especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ).
No primeiro grau, a ação foi extinta sem resolução de mérito; sentença que foi mantida pelo TJRJ. O Ministério Público então entrou com o recurso especial, alegando que a ação civil pública movida tentava assegurar que todos os consumidores recebessem tratamento igualitário, mesmo aqueles que não ajuizaram ações contra a concessionária.
O ministro Afrânio Vilela, relator do recurso na 2ª Turma, reconheceu que a intenção do MPRJ era a de dar efetividade ao julgamento que estabeleceu a inconstitucionalidade do tributo. No entanto, o ministro negou provimento ao recurso por entender que o Ministério Público não tem legitimidade para ajuizar ações relacionadas a tributos.
Vilela citou o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 645 da repercussão geral, que estabeleceu que o MP não possui legitimidade, em ação civil pública, para questionar a constitucionalidade ou legalidade de tributos em defesa dos contribuintes.
O advogado tributarista Everton Lazaro da Silva, do escritório Rayes & Fagundes Advogados Associados, afirma que o STJ acerta em reconhecer a impossibilidade de o MP ajuizar a ação. “Ainda que o argumento fosse pela aplicação de matéria já sedimentada pelo STF em sede de repercussão geral, o fato é que o Ministério Público não detém a legitimidade para figurar no polo passivo, já que não é contribuinte interessado nesse caso”, diz da Silva.
Para o advogado tributarista Carlos Yuri, a decisão do Tribunal reitera a jurisprudência consolidada, mas abre margem para questionar o que é preciso fazer para que não haja a continuação de cobranças com base em normas tributárias consideradas inconstitucionais.
“A meu ver, caberia aos Tribunais reforçar a autoridade de seus julgados, cabendo a responsabilização cível e criminal do gestor que, notificado da declaração de inconstitucionalidade, insistir na cobrança do tributo”, diz Yuri.
Já Carlos Schenato, professor de Pós-Graduação em Direito Tributário do Centro Universitário do Pará (CESUPA), acredita que o STJ deveria ter decidido de forma diferente. “Neste caso, como já ocorreu uma decisão anterior pela inconstitucionalidade da alíquota que está sendo descumprida por uma pessoa jurídica, isso gera uma repercussão de ordem consumerista, coletiva. Nesse caso, eu entendo que deveria ter sido considerada a legitimidade do MP de defender o direito dos consumidores.”
ICMS sobre transportes marítimos é constitucional, decide STF
Data: 23/05/2024
Por 8 votos a 3, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) declararam a constitucionalidade da incidência do ICMS sobre os serviços de transporte interestadual e intermunicipal de cargas, passageiros, mercadorias e valores por via marítima. Prevaleceu a divergência aberta pelo ministro Alexandre de Moraes, que considerou constitucional o artigo 2º, inciso II, da Lei Complementar (LC) 87/1996.
Conforme o dispositivo, incide ICMS sobre “prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal, por qualquer via, de pessoas, bens, mercadorias ou valores”. A Confederação Nacional do Transporte (CNT), autora da ação, pediu a declaração de inconstitucionalidade da expressão “por qualquer via” no texto legal, e a exclusão da tributação sobre o serviço de transporte interestadual e intermunicipal de passageiros e cargas por via marítima, por falta de normas gerais disciplinando a peculiaridade dessas prestações e que autorizem a instituição do tributo estadual sobre elas.
O ministro Alexandre de Moraes discordou do relator, ministro Luiz Fux, que deu parcial provimento ao pedido da CNT, para excluir a tributação sobre parte das operações. Moraes ponderou que a legislação está em vigor desde 8 de janeiro de 1997, e que o recorte proposto poderia acarretar impactos para os estados. A LC 87/97, ou Lei Kandir, foi editada para regulamentar o ICMS. Um total de sete ministros acompanhou a divergência.
Já o ministro Luiz Fux votou pela incidência do ICMS sempre que a operação tiver como objeto exclusivo ou preponderante o transporte interestadual e intermunicipal de bens e pessoas, excluindo a tributação em outras operações. Os ministros André Mendonça e Nunes Marques acompanharam o voto, que ficou vencido.
Processo Relacionado: ADI 2.779
STJ começa a julgar incidência de juros sobre expurgos na poupança
Data: 23/05/2024
A 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) começou a julgar um tema que pode custar bilhões de reais às principais instituições financeiras do país. Os ministros vão decidir a partir de quando se encerra a incidência dos chamados juros remuneratórios de 0,5% ao mês nas ações judiciais sobre os expurgos que afetaram as cadernetas de poupança de milhares de brasileiros que conviveram com a inflação no fim dos anos 1980 e início dos anos 1990. A tese começou a ser julgada ontem, em recursos repetitivos.
O voto do relator, o ministro Raul Araújo, foi favorável aos bancos. Como houve um pedido de vista da ministra Nancy Andrighi, o julgamento foi suspenso sem data para voltar à pauta. Ainda faltam se manifestar os outros nove ministros.
Tanto o Banco do Brasil quanto o Bradesco, partes nos recursos que começaram a ser julgados, citaram as ações de indenização contra eles no balanço do primeiro trimestre, publicado no início deste mês. O Bradesco classificou a perda como provável, que são aquelas provisões com mais chance de acontecer. Mas não foi possível identificar o montante relativo à causa. Procurados, ambos não quiseram se manifestar.
Para as instituições financeiras, o marco final para a aplicação dos juros remuneratórios sobre os expurgos deve ser a data de fechamento da conta de poupança ou até a conta do poupador atingir saldo zero. Já a tese dos poupadores é de que a incidência seja aplicada até o efetivo pagamento. Segundo advogados, a depender do caso, essa diferença temporal pode provocar perda de 70% ao que seria pago às pessoas físicas.
Citando precedentes da 3ª e 4ª Turmas do STJ, o ministro Raul Araújo reformou a decisão anterior do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que havia sido favorável ao poupador, no caso do Bradesco, para determinar a incidência até o efetivo pagamento dos expurgos. Defendeu que a aplicação só pode ocorrer nos processos em que haja a condenação expressa por juros remuneratórios – que não se confundem com os juros de mora, de 1% ao mês, aplicável a toda e qualquer ação. Ele também limitou a aplicação da tese às ações coletivas e não às individuais.
Raul Araújo propôs a seguinte tese: “Desde que expressamente previstos na sentença coletiva, que determina a recomposição dos índices inflacionários expurgados, o termo final de incidência dos juros remuneratórios sobre a parcela da conta poupança resultante da recomposição do índice expurgado é a data de encerramento da conta ou aquela em que passa a ter saldo zero, o que primeiro ocorrer” (REsp 1877280 e REsp 1877300 ou Tema 1101).
O relator acatou a tese dos advogados que fizeram sustentação oral em favor dos bancos e da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) durante a sessão. Eles defenderam que os juros são uma obrigação acessória, que encerra a incidência quando acaba a obrigação principal, que é o dinheiro na conta da poupança. Por isso, esse que deveria ser o marco temporal.
“Não havendo mais o contrato de depósito, não há incidência de juros remuneratórios. Com saldo zero, não há mais causa jurídica para atribuição às partes, seja depositante, seja depositário, de qualquer direito que decorra desse contrato”, disse o advogado do Bradesco, Marcos Cavalcanti Oliveira, durante a sessão.
Um dos casos, envolvendo o Banco do Brasil, remonta ao ano 1989, quando vigorava o Plano Verão, implantado durante o governo do José Sarney com o objetivo de combater a inflação. Segundo o advogado Paulo Cavalcanti de Albuquerque, do Cavalcanti Albuquerque Advogados, que representa uma poupadora no julgamento, uma série de ações individuais e coletivas foram movidas naquela época, até 1991, com o Plano Collor II. Nesse processo, a ação civil pública foi movida pelo Instituto de Defesa de Consumidores (Idec).
Para Cavalcanti, os juros devem incidir até o efetivo pagamento. “É notório e evidente que se ainda tem valor a ressarcir ao poupador, não se pode considerar como marco final a conta como extinta ou zerada, porque o contrato não se encerrou. Então o banco tem o dever se pagar os juros remuneratórios de 0,5% para a recomposição do patrimônio”, afirmou.
Na visão dele, a tese dos bancos, adotada pelo relator, pode implicar violação da coisa julgada. Isso porque, nos dois recursos em julgamento no STJ, assim como em outros casos, há expressamente na sentença a condenação por juros remuneratórios até o efetivo pagamento e não até o fechamento da conta poupança. “Não se pode mexer no que foi decidido e alterar a condenação.”
Já na visão do advogado Renato José Cury, sócio do FCAR Advogados, o voto do relator traz segurança jurídica pois confirma precedentes anteriores do próprio STJ. “Existia uma tentativa de aproveitamento e interpretação extensiva de decisões que não contemplavam o pagamento de juros remuneratórios. O voto do ministro organiza o terreno e foi expresso de que os juros remuneratórios só valem se houver condenação em processos coletivos”, afirma. Segundo ele, a incidência da correção até o efetivo pagamento desvirtua a natureza dos juros remuneratórios.
Em nota, a Febraban, que é parte interessada na ação, afirmou entender que “após o encerramento da conta poupança, não se justifica a incidência de juros remuneratórios nas ações de planos econômicos, uma vez que nessa circunstância o poupador poderá usar seus recursos”. Para a entidade, é “importante a manutenção da jurisprudência do STJ”, assim como a segurança do Acordo Coletivo de Planos Econômicos, homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
“Desde junho de 2018, mais de 300 mil pessoas já aderiram ao acordo referente às diferenças de correção da poupança dos planos Bresser, Verão, Collor 1 e Collor 2, com o pagamento de R$ 4,7 bilhões”, disse. O prazo para adesão ao acordo foi prorrogado para junho de 2025.
STJ julgará ação bilionária sobre cobertura de seguro habitacional
Data: 24/05/2024
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, voltou a frequentar os corredores do Superior Tribunal de Justiça (STJ), mas desta vez não é por conta de disputas tributárias. O tema da reunião desta semana com os ministros Humberto Martins e Isabel Gallotti está ligado ao setor habitacional: uma ação que deve ser julgada no dia 5 de junho e pode custar R$ 16,8 bilhões para a União.
A Corte Especial do STJ vai decidir se as seguradoras devem indenizar beneficiários do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) por causa de vícios de construção descobertos depois do fim dos financiamentos. Seguradoras privadas também poderão ser afetadas.
No caso da União, o impacto viria do Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS), administrado pela Caixa Econômica Federal (CEF) e que garante as apólices. Hoje existem 68.742 ações judiciais ativas cadastradas pelas seguradoras como de interesse nesse caso, segundo informou a Caixa ao Valor.
A previsão é que a Advocacia-Geral da União (AGU) e a Fazenda tenham reuniões com outros ministros antes do julgamento. Em audiência na Câmara dos Deputados na quarta-feira, Haddad comentou que tem dedicado “muito tempo” nos tribunais para explicar o impacto econômico das decisões judiciais. “É importante quem decide saber o que vai acontecer com as decisões. Faço parceria com a Simone Tebet (ministra do Planejamento) e Jorge Messias (AGU) para explicar os impactos”, disse.
Para Flávio Roman, adjunto do advogado-geral da União, o seguro tratado no Tema 1039 é do financiamento habitacional e não destinado a cobrir vícios de construção. Mesmo assim, a AGU aceita que a jurisprudência já tenha consolidado a possibilidade de que o seguro tenha essa cobertura de vícios de construção, mas valendo apenas até um ano depois do término do financiamento habitacional. A ideia de um “seguro vitalício” é combatida pela AGU.
“Precisamos de um prazo. A pessoa descobre uma rachadura na casa dela 30 anos depois da construção e vai pleitear com o fundo”, afirmou. “Seria uma conta impagável.” O precedente que será criado com o julgamento é amplo e também servirá para seguradoras privadas.
Segundo Cristiane Curto, procuradora Nacional da União de Políticas Públicas da AGU, pelo Sistema Financeiro de Habitação, o contrato de seguro está atrelado ao de financiamento. “O objeto desse contrato de seguro é garantir o adimplemento do financiamento.”
O seguro residencial, explicou, tem, juridicamente, uma outra classificação. “As pessoas vão judicializando e querendo transformar o habitacional em seguro residencial”, disse. De acordo com a procuradora, nas apólices públicas, é necessário ter uma previsão orçamentária, o que se torna impossível se tiverem que ser cobertos todos os vícios, sem um prazo definido.
“Se for admitido que a cobertura securitária deve abarcar vícios que podem aparecer a qualquer momento, realmente estaria muito fora do espectro do direito público, fora de todas as premissas da Constituição que salvaguardam o orçamento público”, afirmou.
Independentemente da tese que for consolidada haverá impactos no FCVS, segundo explicação do Conselho Curador do Fundo (CCFCVS). “Se for decidido que o prazo de prescrição de um ano começa a contar a partir da liquidação do contrato, ações judiciais cujos financiamentos foram finalizados há mais de um ano serão encerradas, mas se a decisão for que o prazo de prescrição começa a contar a partir do conhecimento do dano, pode haver um aumento significativo de processos.”
De acordo com o Conselho, cerca de 7,5 milhões de contratos habitacionais foram averbados na apólice pública ao longo dos anos. A depender do entendimento, todos esses contratos poderiam ter uma cláusula implícita que os assegure indenização por danos, mesmo após muitos anos de vigência e da sua extinção do contrato de financiamento.
“É um risco para a política pública da habitação”, disse Glauce Carvalhal, diretora jurídica da Confederação Nacional das Seguradoras (Cnseg). A entidade participa como parte interessada (amicus curiae) na ação porque existem ações residuais com o mesmo pedido para as seguradoras privadas e porque, até 1988, as seguradoras privadas prestavam serviço para o FCVS – o que não significa que suportarão o risco, segundo Carvalhal.
A Superintendência de Seguros Privados (Susep) também é parte interessada e indicou que não há provisionamento por parte das seguradoras, de acordo com a diretora. “A maior parte das ações são de apólices públicas, de imóveis populares.”
Uma estimativa da Cnseg mostra impacto ainda maior que o estimado pela União. Em 2021 existiam 50 mil ações em tramitação nas esferas estadual e federal. Os valores das condenações variavam entre R$ 40 mil por autor, na Justiça estadual, e R$ 4 mil na federal. Se considerado o prazo de um ano após o término do financiamento, os impactos seriam de R$ 2 bilhões e R$ 212 milhões, respectivamente. Mas se a cobertura for reconhecida para contratos ativos ou não, o impacto chega a R$ 296 bilhões na esfera estadual e R$ 30 bilhões na federal.
Segundo Vinícius Henrique de Almeida Costa, presidente da Associação Brasileira dos Mutuários da Habitação (ABMH), o pedido de mutuários nessa situação é para estender a responsabilidade da seguradora para depois do fim do financiamento. Costa considera a questão sensível porque o seguro do financiamento habitacional é obrigatório por lei e beneficia o imóvel, mas também o comprador do imóvel.
“Para os mutuários, o melhor seria ter a responsabilidade, mas juridicamente falando, é complicado”, afirmou. Costa lembrou que, no Direito, o acessório (no caso, o seguro) deve seguir o principal (o financiamento). Então, o fim do financiamento pode encerrar também o seguro.
Procurada, a CEF disse, em nota, que o tema “deve ser analisado de forma individual, tendo em vista que os contratos vinculados às referidas ações judiciais possuem diferentes características”, mas ponderou que, em relação ao FCVS Garantia, são 68.742 ações judiciais ativas cadastradas, para as quais se encontra provisionado o montante de R$ 16,8 bilhões para cumprimento de eventuais obrigações que sejam reconhecidas pelo Poder Judiciário.
Petrobras é responsável por recolher Cide-Combustíveis, decide STJ
Data: 24/05/2024
De forma unânime, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a cobrança da Cide-Combustíveis, em um caso em que a estatal alega que estava impedida de fazer o pagamento em razão de liminares que dispensaram distribuidoras e postos de combustíveis de arcar com o custo do tributo na aquisição de derivados do petróleo. Neste caso, a Petrobras era a contribuinte de direito, e as distribuidoras e postos, os contribuintes de fato.
Após ser autuada para o recolhimento da Cide-Combustíveis referente ao período de março de 2002 a outubro de 2003, a Petrobras ajuizou ação anulatória, mas a cobrança foi mantida pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2). Segundo o acórdão de mérito do tribunal, a autuação soma R$ 1,017 bilhão, incluindo principal, juros de mora e multa de ofício. A companhia, então, recorreu ao STJ.
O advogado da Petrobras defendeu que as decisões liminares favoráveis às distribuidoras e postos proibiam a companhia de efetuar o repasse da Cide-Combustíveis. O defensor disse ainda que, ao julgar o caso, o tribunal de origem sugeriu soluções inviáveis para que a estatal recolhesse a contribuição.
“Segundo o acórdão regional, a empresa deveria recolher o tributo [apesar das decisões judiciais] ou, pelo menos, intervir nos mandados de segurança para realizar o depósito da quantia devida. Com todo o respeito ao acórdão de origem, não consigo vislumbrar intervenção de terceiro em [sede de] mandado de segurança para efetuar depósito”, afirmou.
O advogado disse ainda que, se tivesse recolhido a contribuição, a Petrobras suportaria sozinha o encargo e depois, com eventual cassação das liminares, não teria como reaver os valores. Porém, o relator, ministro Francisco Falcão, votou a favor da possibilidade de realização da cobrança do tributo face à empresa produtora. Falcão não detalhou os fundamentos do seu voto. Os outros ministros o acompanharam.
O relator, acompanhado pela turma, também suspendeu tutela provisória concedida à Petrobras no TP 1.885/RJ. A tutela suspendia execuções fiscais contra a estatal envolvendo a cobrança da Cide-Combustíveis e havia sido concedida pelo ministro João Otávio Noronha quando este ocupava a presidência do STJ. Na prática, com isso, as execuções podem prosseguir.
Processo Relacionado: AREsp 1.483.879
STJ vai julgar imposto sobre importações de países do Gatt para Zona Franca de Manaus
Data: 25/05/2024
A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça decidiu afetar três Recursos Especiais de relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, para julgamento sob o rito dos repetitivos.
A questão submetida a julgamento, cadastrada como Tema 1.244 na base de dados do STJ, é a “possibilidade de exigência das contribuições ao PIS-importação e à Cofins-importação, nas operações de importação de países signatários do GATT, sobre mercadorias e bens destinados a consumo interno ou industrialização na Zona Franca de Manaus (ZFM)”.
O colegiado determinou a suspensão de todos os processos que versem sobre a questão controvertida, em primeira e segunda instâncias, bem como dos recursos especiais e dos agravos em recurso especial no STJ.
No REsp 2.046.893, a Fazenda Nacional recorre de decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que aplicou a mesma isenção para a entrada de produtos do mercado interno na Zona Franca de Manaus (PIS/Cofins-faturamento) na hipótese de entrada de produtos oriundos do estrangeiro (PIS/Cofins-importação).
Segundo o relator, a discussão trata da incidência do PIS-importação e da Cofins-importação nas aquisições feitas de países signatários do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT) para uso e consumo dentro da ZFM, em razão da aplicação da cláusula de Obrigação de Tratamento Nacional, tendo por base comparativa a isenção das contribuições ao PIS e à Cofins-faturamento.
O relator ressaltou o potencial de multiplicidade da controvérsia, tendo sido localizados quatro acórdãos e 62 decisões monocráticas dos ministros da 1ª e 2ª Turmas do STJ sobre o assunto.
De acordo com Campbell, a Fazenda Nacional também fez um levantamento e localizou 58 recursos interpostos pela sua procuradoria no STJ a respeito do tema. O órgão federal verificou ainda a existência de mais de 770 processos sobre a matéria em âmbito nacional (Tribunais Regionais Federais da 1ª a da 6ª Regiões).
“Considerando as informações prestadas, e por se tratar de tema que envolve interpretação e aplicação de procedimento padronizado adotado pela administração tributária federal, resta demonstrada a multiplicidade efetiva ou potencial de processos com idêntica questão de direito”, afirmou o ministro.
Recursos repetitivos
O CPC regula, nos artigos 1.036 e seguintes, o julgamento por amostragem, mediante a seleção de recursos especiais que tenham controvérsias idênticas.
Ao afetar um processo, ou seja, encaminhá-lo para julgamento sob o rito dos repetitivos, os ministros facilitam a solução de demandas que se repetem nos tribunais brasileiros.
A possibilidade de aplicar o mesmo entendimento jurídico a diversos processos gera economia de tempo e segurança jurídica.
No site do STJ, é possível acessar todos os temas afetados, bem como conhecer a abrangência das decisões de sobrestamento e as teses jurídicas firmadas nos julgamentos, entre outras informações. Com informações da assessoria de imprensa do Superior Tribunal de Justiça.
REsp 2.046.893
REsp 2.053.569
REsp 2.053.647
Produtos exportados não sujeitos ao IPI não geram crédito presumido
Data: 26/05/2024
Produtos industrializados que não se sujeitam à cobrança do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) não geram crédito presumido do mesmo tributo, ainda que o objetivo seja o ressarcimento do valor do PIS e da Cofins.
Essa conclusão é da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que deu provimento ao recurso especial ajuizado pela Fazenda Nacional em ação contra uma empresa produtora de tabaco para exportação.
O direito ao crédito havia sido reconhecido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por entender que a empresa preenchia os requisitos exigidos por lei, já que ela é produtora de produtos industrializados e os exporta.
A contribuinte defendeu essa posição alegando que o objetivo do crédito presumido é desonerar a cadeia produtiva das exportações, uma vez que se sujeita a contribuição a PIS e Cofins.
A Fazenda Nacional, por sua vez, sustentou que só haveria direito ao crédito presumido de IPI se o produto produzido e exportado se sujeitasse ao imposto. Não é o caso do tabaco.
O resultado do julgamento criou a inusitada situação em que o contribuinte produz um produto e o exporta, mas não pode gozar dos créditos fiscais destinados àqueles que produzem produtos e os exportam. E isso se deve a um encadeamento de normas.
Muitas leis
A Lei 9.636/1996 estabelece que a empresa produtora e exportadora faz jus ao crédito presumido de IPI como ressarcimento pelas contribuições a PIS/Pasep e Cofins que incidem sobre a compra de matérias-primas, produtos intermediários e material de embalagem no mercado interno.
Empresa produtora, conforme diz o artigo 3º da Lei 4.502/1964, é aquela que industrializa produtos sujeitos ao imposto.
Já a Lei 9.493/1997 fixou em seu artigo 13 que todos os produtos com a anotação NT (não tributário) estão fora do campo de incidência do IPI. Essa lista constava do Decreto 2.092/1996, vigente à época, e incluía o tabaco.
É, mas não é
Conjugando as três normas, a conclusão é que, como a empresa contribuinte é uma produtora de tabaco, não faz jus ao crédito presumido porque seu produto não se sujeita ao IPI.
A votação foi unânime, conforme a posição do relator da matéria, ministro Francisco Falcão. Em voto-vista apresentado na terça-feira (21/5), o ministro Mauro Campbell esclareceu que, para fins de crédito presumido do IPI, só é produtor aquele que industrializa produtos sujeitos ao imposto.
“Não se nega que a contribuinte de fato industrialize produtos e os exporte, tal como fixado pelo laudo pericial. O que se aponta é que tal fato não tem o efeito jurídico de conceder-lhe a condição de empresa produtora exigida”, explicou Campbell.
REsp 2.090.515
Juiz suspende ICMS do cálculo de IRPJ e CSLL de empresa
Data: 27/05/2024
Juiz Federal Leoberto Simão Schmitt Junior, da 5ª vara Federal de Blumenau/SC, determinou que a União não inclua créditos presumidos de ICMS na base de cálculo dos tributos federais IRPJ e CSLL de uma empresa. Na decisão, o magistrado levou em consideração as alterações trazidas pela lei 14.789/23 e a jurisprudência do STJ.
A decisão decorre de um mandado de segurança impetrado por uma empresa contra a Receita Federal, solicitando o reconhecimento do direito de excluir os créditos presumidos de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, por não se sujeitarem ao disposto na lei 14.789/20.
Na análise do pedido, o magistrado considerou que jurisprudência do STJ fixou entendimento no sentido de que os valores referentes a crédito presumido de ICMS constituem incentivo fiscal e, portanto, não devem ser incluídos na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, sob pena de a União esvaziar a finalidade do programa estatal.
O magistrado destacou ainda que os créditos presumidos de ICMS não devem ser incluídos na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, mesmo quando esses tributos são apurados pelo regime de lucro presumido.
Schmitt Junior pontuou que, apesar de a lei 14.789/23 introduzir um novo regime baseado no reconhecimento de “crédito fiscal decorrente de subvenção para implantação ou expansão de empreendimento econômico”, essa norma não se aplica aos créditos presumidos de ICMS. Isso porque a jurisprudência do STJ já firmou o entendimento de que a subvenção não se caracteriza como renda ou lucro, e, portanto, não compõe a base de incidência do IRPJ e da CSLL.
“Ademais, para atribuição do crédito fiscal decorrente de subvenção, a nova lei impõe requisitos restritivos já afastados pela jurisprudência estabelecida (como a necessidade de que a subvenção seja para investimento), o que igualmente a torna inidônea – salvo eventual mudança jurisprudencial – para regulação da matéria aqui tratada”, acrescentou.
Assim, o juiz concedeu a segurança para declarar o direito da empresa de apurar o IRPJ e a CSLL sem a inclusão de créditos presumidos de ICMS em suas bases de cálculo.
O escritório Silva & Silva Advogados Associados atua na causa.
Processo: 5005059-08.2024.4.04.7205
https://www.migalhas.com.br/quentes/407730/juiz-suspende-icms-do-calculo-de-irpj-e-csll-de-empresa
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