Retrospecto Tributário – 14/02 a 19/02
Com a reforma tributária, holding familiar continua vantajosa
Data: 14/02/2024
Mesmo com a reforma tributária, promulgada pelo Congresso Nacional em 20 de dezembro, as holdings familiares permanecem como um mecanismo viável para proteção e transmissão de patrimônio. “Embora haja possibilidade de aumento da carga tributária, a estrutura deste modelo, que simplifica transmissões e doações de bens, ainda pode ser benéfica”, avalia o advogado tributarista Nicholas Coppi, da Coppi Advogados Associados.
Em linhas gerais, holding familiar é uma pessoa jurídica criada de maneira lícita para administrar e proteger o patrimônio de uma família. “Na holding, os bens da família são integralizados ao capital da empresa permitindo a centralização da gestão e o controle dos bens da família”, diz Coppi. Mas a partir da promulgação da reforma tributária, o especialista considera a necessidade de novos planejamentos para o modelo.
O texto da reforma tributária prevê a majoração das alíquotas sobre heranças, doações e propriedades de bens ao instituir um modelo progressivo, com alíquotas maiores para grandes heranças, que segundo o advogado, podem chegar a 8%.
Outra alteração que deverá ser observada quando da constituição de uma holding se refere ao local de arrecadação do imposto estadual. Antes da Reforma, o imposto podia ser recolhido no local onde o inventário era processado ou no local onde residia o doador. “Essa regra permitia que, em razão da variação das alíquotas entre os Estados, o montante devido a título de ITCMD fosse mais elevado ou mais acessível, dependendo da opção escolhida, ou seja, a escolha da sede das holdings familiares podia priorizar as unidades da federação com alíquotas menores, a exemplo de São Paulo e Paraná, que têm atualmente alíquotas de 4%”, destaca.
Com o texto trazido pela Reforma, a arrecadação do imposto será centralizada no estado de residência da pessoa falecida. “Com isso, não se fala mais em opção por um Estado mais atrativo que outro para estabelecimento da holding”, fala.
Para Nicholas Coppi, embora o principal impacto da reforma tributária na sistemática do ITCMD se refira à localização da sede, a criação de holding continua sendo uma prática interessante para administração e proteção ao patrimônio familiar. “Ainda assim, a holding familiar é benéfica, justamente por não haver diversas transmissões e doações entre partes no transcorrer da vida dos acionistas”, pondera.
No caso de rendimentos provenientes de aluguéis, o especialista alerta que a carga tributária da pessoa jurídica é menor que a da pessoa física. “Neste ponto, um dos objetivos na constituição de uma holding familiar é aproveitar a carga tributária menor aplicada às pessoas jurídicas. Sobre pessoas físicas as alíquotas são maiores”, explica.
Nicholas Coppi reforça que a constituição de holdings familiares não visa exclusivamente as vantagens tributárias, mas também a proteção patrimonial efetiva e a organização na administração de bens. “A holding familiar não deve ser vista somente como um instrumento de redução de tributos, mas sim como uma forma de proteção e gerenciamento de bens.”, conclui o advogado.
Entre o populismo fiscal e a reoneração responsável
Data: 15/02/2024
Ao longo de anos, o Brasil tem enfrentado persistentes desafios fiscais, frequentemente marcados pelo surgimento do populismo e por práticas eleitoreiras repetidas, em detrimento da responsabilidade orçamentária.
Um exemplo notório desse padrão é a gestão fiscal durante o mandato de Jair Bolsonaro, um período em que a concessão de subsídios fiscais atingiu a expressiva cifra de R$ 80,95 bilhões, destacando-se particularmente no ano de 2022, ano eleitoral não por coincidência.
As leis complementares 192 e 194 de 2022 impuseram severas perdas aos estados e municípios brasileiros, resultando em reduções estruturais nos orçamentos estaduais e municipais, retirando, em cada exercício fiscal, aproximadamente R$ 100 bilhões de arrecadação de ICMS.
Isso representa uma clara violação ao pacto federativo e uma medida eleitoreira lamentável, que o judiciário ainda precisa examinar para responsabilizar o ex-presidente e seus seguidores.
Incentivos foram direcionados a setores como petróleo, carvão mineral e gás natural, delineando um quadro que exemplifica a lógica dos lobbies na administração federal e a inconsequente alocação de recursos públicos nas mãos daqueles setores que mais brigam para conquistar seus interesses em detrimento do conjunto do país.
Fiscal comprometido
Diante de um cenário desafiador, caracterizado por um orçamento altamente restrito e uma herança fiscal comprometida, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem adotado, desde o início de sua gestão, uma abordagem responsável e comprometida com os princípios republicanos. Iniciou, em 2023, o processo gradual de reversão das desonerações, ciente dos erros do passado.
As medidas de reoneração implementadas até o momento foram conduzidas de maneira conscientemente gradual, considerando as resistências políticas e os lobbies presentes no Congresso.
Este ritmo, embora não acelerado, reflete uma resposta pragmática e necessária para enfrentar as demandas de um ambiente econômico adverso.
O compromisso de Haddad em lidar com as dificuldades orçamentárias, aliado à sua postura republicana, destaca-se como uma estratégia consciente e focada na estabilidade fiscal do país.
A reoneração completa, incluindo um aumento de 12,5% no ICMS sobre gasolina, diesel e gás de cozinha, representa uma ação corajosa para equilibrar as contas públicas. É crucial destacar a compreensão federativa de Haddad ao evitar impor aos estados e municípios as consequências das desonerações, levando em consideração as dificuldades financeiras enfrentadas pela maioria deles.
Reoneração da folha
Nesse contexto, a proposta de reoneração da folha de pagamento, também defendida pelo ministro Haddad, ganha relevância. Um estudo recente do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas e Desenvolvimento do Cedeplar (Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Faculdade de Ciências Econômicas) da UFMG.
O estudo questiona a eficácia da desoneração, fortalecendo a posição do governo na busca pela estabilidade financeira. A desoneração da folha mostrou-se inadequada para promover empregos e salários de forma consistente, representando apenas 17% do emprego formal do setor privado em 2021.
A disparidade entre a política de desoneração e seu real impacto na economia destaca a premente necessidade de uma revisão criteriosa.
A proposta de Haddad para a gradual reoneração da folha de pagamento emerge como uma medida sensata, alinhada à busca pelo equilíbrio fiscal em 2024, conforme estabelecido pela Medida Provisória nº 1.202, de 28 de dezembro de 2023.
Em um momento importante para a economia brasileira e o equilíbrio das contas públicas, a reoneração, tanto dos combustíveis quanto da folha de pagamento, representa uma resposta necessária e corajosa. A priorização da estabilidade fiscal deve sobrepujar iniciativas eleitoreiras, garantindo um futuro mais robusto para o país e restaurando a capacidade do governo de retomar os investimentos.
Neste sentido, merece destaque uma pesquisa do Ipea, com base nos dados da Pnad Contínua do IBGE entre 2012 e 2022, revelando que 47 setores apresentaram um saldo positivo de 13 milhões de postos de trabalho.
Surpreendentemente, 52% desse incremento originam-se de setores não beneficiados pela desoneração, como saúde, comércio, alimentação e educação. Entre os 40 setores que experimentaram uma diminuição no número de empregos, 10 estão abrangidos pela chamada “política de desoneração”. Isso evidencia que o esforço setorial na geração de empregos não se alinhou de forma eficaz à desoneração, destacando suas limitações como estratégia.
Uniformidade
A necessidade de uniformidade na tributação para todos os setores emerge como uma questão crucial de equidade e promoção da eficiência na economia. Certamente, a distinção entre incentivos fiscais e privilégios tributários não é uma tarefa tão simples, e, em última análise, a sociedade é a principal prejudicada.
O resultado disso é uma erosão constante das finanças públicas em troca de supostos benefícios que nunca são compartilhados de maneira equitativa.
A defesa da continuidade de políticas de desoneração, ao privilegiar setores específicos, contraria o princípio da isonomia tributária e negligencia as implicações para a totalidade da economia, configurando-se como um desserviço ao país.
A estrutura tributária brasileira, incluindo a tributação sobre a folha de pagamentos, é inquestionavelmente regressiva e ineficiente, situando-se entre as mais problemáticas do mundo. Estender a desoneração apenas agravaria essa situação.
Para promover avanços significativos em direção a um sistema tributário mais equitativo, torna-se fundamental iniciar imediatamente a implementação e regulamentação infraconstitucional da Reforma Tributária, ao mesmo tempo em que se redesenha o Imposto de Renda para Pessoa Física.
A complexidade desafiadora representada pela dívida bruta, que absorve 6% do Produto Interno Bruto (PIB) em juros, e a renúncia fiscal de aproximadamente R$ 10 bilhões decorrente da desoneração da folha de pagamento estabelecem uma relação causal clara: uma redução na arrecadação resulta no aumento da dívida.
Esse acréscimo na dívida, por sua vez, acarreta em taxas de juros mais elevadas, desencadeando um ciclo de aumento de impostos para cobrir os encargos financeiros, encarecimento do crédito, redução dos investimentos e, por conseguinte, a diminuição, em vez do crescimento, dos postos de trabalho.
Nesse contexto, é crucial direcionar esforços coordenados para enfrentar esses desafios, promovendo uma reforma tributária eficaz e mitigando os impactos negativos sobre a economia e o emprego.
Em um panorama fiscal desafiador, no qual as intricadas relações entre políticas tributárias e desenvolvimento econômico se entrelaçam, as ações do ministro Fernando Haddad emergem como um farol de responsabilidade e comprometimento com a estabilidade jurídica e fiscal do país.
Ao conduzir a gradual reoneração e buscar a equidade tributária, Haddad demonstra uma abordagem política, jurídica e administrativamente consciente, reconhecendo a importância de alinhar as políticas públicas aos princípios republicanos. Sua postura pragmática diante das resistências políticas, aliada à priorização da estabilidade fiscal, destaca-se como um exemplo de liderança que busca mitigar os efeitos negativos das práticas anteriores.
Em tempos nos quais a responsabilidade fiscal e a astúcia política são essenciais, Haddad se destaca como uma figura central na busca por um futuro alvissareiro para o Brasil.
https://www.conjur.com.br/2024-fev-15/entre-o-populismo-fiscal-e-a-reoneracao-responsavel/
Obrigatoriedade da DIRF: entenda regras para empresas com máquinas de cartão de crédito e evite multas
Data: 15/02/2024
Em conformidade com as normativas fiscais, qualquer empresa que viabilize pagamentos via cartão de crédito está obrigada a submeter a Declaração de Imposto de Renda Retido na Fonte (DIRF).
Este requisito é de suma importância devido às comissões decorrentes dessa modalidade de pagamento, as quais estão sujeitas à retenção de imposto na fonte e são remetidas pela administradora do cartão de crédito, seguindo o processo conhecido como auto retenção.
Contudo, microempreendedores individuais (MEIs) estão isentos dessa obrigação, exceto se este for o único caso de retenção em sua atividade.
Razões para a obrigatoriedade da DIRF para empresas com máquinas de cartão de crédito:
1 – Natureza das transações: empresas que efetuam transações como administração de cartões de crédito estão entre as categorias sujeitas à entrega da DIRF, conforme regulamentado pelas autoridades fiscais
2 – Punições por não cumprimento: o não cumprimento da entrega da DIRF pode acarretar multas, sendo essencial que os empreendedores estejam cientes das penalidades impostas pela legislação fiscal.
Prazo e procedimentos
Entrega da DIRF 2024: a declaração deve ser submetida até as 23h59 do dia 29 de fevereiro, através do Programa Gerador da DIRF (PGD) disponibilizado pela Receita Federal do Brasil (RFB).
É imprescindível que os empreendedores solicitem o informe de rendimentos à fornecedora da máquina do cartão de crédito para o preenchimento correto da declaração, garantindo conformidade com as exigências legais. Em vista disso, é aconselhável buscar orientação junto a um contador para evitar possíveis complicações fiscais.
A entrega pontual e precisa da DIRF é fundamental para evitar sanções fiscais e manter a conformidade com as leis tributárias vigentes. Assim, os empresários devem estar plenamente conscientes de suas responsabilidades e prazos estabelecidos pela legislação fiscal para garantir o cumprimento adequado de suas obrigações tributárias.
Onerar ou desonerar? Eis a questão!
Data: 16/02/2024
Em briga de cachorros grandes e disputas de egos é o contribuinte, que no fim do dia, acaba pagando o pato, para que a conta do governo feche.
O planalto quer, o congresso aprova! O congresso quer o planalto veta! E aí, entre guerras de interesses, é o contribuinte que acaba absorvendo o custo de tudo isso, quando contrata um serviço ou adquire um produto, pois, no fim do dia, as empresas que fabricam produtos ou prestam serviços acabam repassando para o consumidor final o custo de tudo isso e quando falamos de empregados, este custo é bem mais elevado, pois, além dos impactos previdenciários, também temos uma série de consectários trabalhistas, além do gigante volume de reclamações trabalhistas que encontram um jeito de compensar o empregado, sempre “hipossuficiente” e essa conta nunca fica no prejuízo das empresas. São repassados e inseridos na precificação.
O Brasil, quando comparado a outros países do mundo, é sempre líder no assunto: carga tributária elevada! Por isso precisamos entender que o complexo sistema tributário há tempos vem dando nítidos sinais de colapso, principalmente quando observamos o déficit previdenciário e famigerada necessidade do governo em arrecadar cada vez mais, que visa unicamente cumprir suas promessas eleitorais, na sua grande maioria assistencialista.
Uma discussão legislativa que confronta um interesse político é como nitroglicerina pura, pois, ao mesmo tempo que precisamos equalizar a elevada carga tributária, também precisamos dar maior capacidade às empresas de contratação, pois, sem empregos e baixa taxa de desemprego, não é possível fazer a máquina da economia girar, principalmente quando observamos que, até agora, a maior fonte de arrecadação de receita pública, ainda advém do consumo e sem empregabilidade, o consumo na ponta fica prejudicado e acabamos caindo na síndrome do hamster, que fica o dia todo na gaiola rodando na rodinha, sem contudo, sair do canto.
A decisão política de acabar com a desoneração é no mínimo irresponsável, principalmente quando falamos de um IVA elevado, como previsto com a reforma recém aprovada e não termos ainda qualquer definição de como será a reforma do imposto de renda, que por sua vez, pode compensar a perda que o governo busca repor, de maneira mais justa, tributariamente falando.
Os empresários brasileiros e estrangeiros, precisam enxergar no Brasil um sistema tributário simplificado e justo, para que mais empregos sejam gerados e novas receitas sejam ingressadas na economia. Quando falamos em desoneração de alguns setores, estamos falando de fazer a economia girar e trazermos estabilidade econômica aos empresários que estimula o desenvolvimento social e financeiro do país, pois, isso, o Governo precisa controlar a sua voracidade ao ponto de trazer o sentimento de que o melhor está sendo buscado, mas, o que se vê, é exatamente o oposto: O governo quer arrecadar, custe o que custar e ainda que isso represente a insatisfação social, os cofres públicos precisam estar abastecidos às custas da prole que, continuará pagando muito sobre o consumo, que não separa os ricos dos pobres, ou seja, acabar com a desoneração da folha de forma tão abrupta, não resolverá o problema.
No Brasil nove em cada 10 empresas pagam mais tributos do que deveriam e quando falamos de folha, o custo trabalhista para uma grande maioria das empresas do simples nacional equivalem a 45% a mais do salários e dos demais regimes tributários (Lucro Real ou Presumido) esta provisão é de no mínimo 100% a mais do salário e isso desestimula a contratação e o desejo de expansão, principalmente porque a população, não tem nem capacidade de pagar o custo embutido no preço final, merecendo por fim um destaque, que os custos com folha, ainda que necessários ao funcionamento das empresas, não são considerado como fator suficiente a redução ou dedução do imposto final a ser pago pelas empresas do país.
Logo, observa-se que o governo não pode se perder em seus objetivos e prezar pelo bem social, com a manutenção das políticas sociais, sem entretanto, focar apenas no assistencialismo.
Carlos Pinto é advogado tributarista, especializado em Negócios, principalmente Startups, ama empreender e traz para o mercado uma prestação de serviços diferenciada, congregando técnica, prática e benchmark, tornando as empresas mais rentáveis e competitivas. É Diretor do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), criadora do Impostômetro e do Empresômetro Inteligência de Mercado.
Sobre o IBPT
O Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) foi fundado em 1992, com o objetivo inicial de congregar estudiosos das ciências jurídica, contábil, social e econômica para debater sobre temas relacionados ao planejamento tributário. Desde sua fundação, o IBPT se dedica ao estudo do complexo sistema tributário no país, sendo reconhecido pela adoção de uma linguagem clara e precisa à sociedade sobre a realidade tributária brasileira. O IBPT também lançou bases e fundamentos para viabilizar a lógica da transparência fiscal, promovendo conscientização tributária.
Pioneiro na criação de estratégias de mercado para empresas e entidades setoriais a partir da análise de dados fiscais, públicos e abertos, o IBPT mantém investimentos contínuos em tecnologia e na capacitação de sua equipe para viabilizar pesquisas, estudos e serviços, possuindo o maior banco de dados privado com informações tributárias e empresariais.
https://fococidade.com.br/artigo/61334/onerar-ou-desonerar–eis-a-questao-
Reforma tributária: primeiro passo dado
Data: 16/02/2024
O percurso da reforma tributária no Brasil atingiu mais um marco significativo com a realização da primeira reunião da Comissão de Sistematização do Programa de Assessoramento Técnico à Implementação da Reforma da Tributação sobre o Consumo (PAT-RTC), estabelecida pela Portaria MF 34, do Ministério da Fazenda.
Esta iniciativa dá início a uma importante etapa na efetividade da Emenda Constitucional nº 132, de 2023, indicando um avanço relevante na reformulação do sistema tributário do país. A estrutura da Comissão de Sistematização, acompanhada pelo Grupo de Análise Jurídica e 19 Grupos Técnicos, é uma indicação clara da abrangência e complexidade desta reforma. Esses grupos têm a tarefa de elaborar os anteprojetos de lei derivados da referida emenda, sublinhando a seriedade e a profundidade da revisão tributária em curso.
O Secretário Extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, apresentou um cronograma acelerado para a finalização dos anteprojetos, prevendo sua conclusão entre o final de março e início de abril, um período significativamente mais curto do que os cento e oitenta dias estipulados pela EC 132. Um aspecto notável deste processo é a abordagem adotada em relação à participação da sociedade civil. Apesar da ausência inicial de uma consulta pública, Appy destacou que haverá oportunidades para o envolvimento de representantes do setor privado e da academia. Isso sugere uma estratégia progressiva e inclusiva, embora a principal arena de debate com o setor privado continue sendo o Congresso Nacional.
O objetivo do secretário é tratar em uma só lei complementar as hipóteses de incidência da CBS, da União, e do IBS, dos estados, Distrito Federal e dos municípios, assim como definição de destino, regimes específicos, diferenciados ou favorecidos. A rigor, cabem diferentes interpretações entre os referidos tributos, sobretudo porque um tem natureza de contribuição, enquanto o outro de imposto, mas a ideia é encontrar uma convergência entre todos os entes sobre interpretação, fiscalização e cobrança.
Não haverá obrigatoriedade de cobrar o IBS e a CBS no ano de 2026, período de teste, pois o principal objetivo é a estruturação das informações. Em relação aos impactos da reforma, ainda não é possível mensurá-los, especialmente porque não há a definição de cada alíquota estadual e municipal. A própria lei complementar, que está sendo gestada, será responsável por estabelecer os critérios para os cálculos das alíquotas de referência, subsidiando futuramente a atuação do Tribunal de Contas da União. Já o Imposto Seletivo, não existe ainda uma definição sobre os bens e serviços tributados, mas a regulamentação não deve ir muito além de cigarros, bebidas alcoólicas e grandes poluidores.
O principal objetivo é desencorajar o consumo pelo caráter potencialmente lesivo com repercussão individual ou coletiva, conquanto o Poder Público não despreze a significativa arrecadação de receitas por esta sistemática, como vem ocorrendo até então com o IPI – Imposto Sobre Produtos Industrializados, com extinção prevista em 2027. Ao elevar o custo desses produtos por meio de uma tributação mais onerosa, espera-se reduzir ou “controlar” a correspondente demanda. A sistemática de tributação será monofásica, ou seja, incidirá uma única vez sobre a produção, extração, comercialização ou importação de produtos e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, não sendo cobrável sobre as exportações, os setores de energia elétrica e de telecomunicações, por expressa disposição. Permite-se, por outro lado, a cobrança sob alíquota de 1% (um por cento) sobre a extração de recursos naturais não renováveis, como minérios e petróleo.
O plano para tratar dos mais de setenta pontos da reforma que requerem legislação complementar envolve a criação de três anteprojetos principais. Há também discussões sobre um quarto projeto, voltado para o tratamento do Comitê Gestor, cujo viés político ainda está sendo definido. Apesar da celebração deste marco legislativo, a verdadeira transformação depende desta etapa subsequente de regulamentação. Essencialmente, ela definirá os contornos práticos do sistema tributário reformado, atuando como o mecanismo que preenche os espaços deixados pelo texto constitucional. É preciso um processo legislativo detalhado e minucioso para garantir que a reforma atinja seus objetivos, sendo este momento tão significativo quanto à própria alteração constitucional, haja vista a responsabilidade por definir aspectos essenciais como alíquotas, contribuintes, créditos tributários, bem como regimes especiais.
Um dos principais desafios da regulamentação é garantir que a simplificação proposta pela reforma não seja perdida na prática. Há também preocupações de que aspectos fundamentais, como a não-cumulatividade e o sistema de cálculo dos tributos, possam ser interpretados de maneira que comprometam os objetivos perseguidos, sobretudo de transparência, simplicidade e eficiência. Além disso, a regulamentação enfrenta o desafio de equilibrar os interesses de diferentes entidades federativas e contribuintes, mantendo a integridade e o propósito original. A implementação da reforma tributária, portanto, enfrenta um momento decisivo e os próximos meses serão determinantes para o país.
https://valor.globo.com/legislacao/coluna/reforma-tributaria-primeiro-passo-dado.ghtml
Ilegitimidade do PIS/Cofins sobre bônus concedidos por montadoras de veículos
Data: 19/02/2024
A Receita Federal vem buscando tributar com o PIS/Cofins os bônus recebidos das montadoras de automóveis pelas concessionárias. Em meados de 2021, a Receita convidou diversas concessionárias de automóveis a realizarem uma autorregularização, retificando seus documentos fiscais e recolhendo PIS/Cofins sobre todos os valores recebidos das montadoras a título de bônus. Ao final de 2023, as concessionárias que não aderiram à autorregularização começaram a receber autuações fiscais relativas a tais valores.
Entretanto, os bônus recebidos das montadoras de veículos pelas concessionárias não podem ser objeto de tributação pelo PIS/Cofins por dois principais motivos: (i) em que pese sejam recebidos posteriormente, os bônus correspondem a uma parcela do faturamento da concessionária quando da venda do veículo zero para o cliente final; (ii) os veículos zero-quilômetro vendidos pelas concessionárias estão sujeitos ao regime monofásico de PIS/Cofins. Antes de discorrer acerca de tais fundamentos, contudo, é pertinente trazer uma breve contextualização.
Os bônus concedidos pelas montadoras de automóveis têm diferentes situações das quais se originam e aqui tratamos acerca dos bônus que são dados diretamente aos clientes finais, substituindo uma parte do pagamento do automóvel. Trata-se, portanto, de bônus concedidos a funcionários e parceiros, tanto das concessionárias quanto das montadoras, assim como bônus trade-in, concedido quando se inclui um veículo seminovo ou usado na troca por um veículo novo. Em todos os casos, a dinâmica é a mesma: no interesse de motivar a aquisição de um determinado modelo de automóvel, a montadora concede o bônus diretamente ao cliente final e se responsabiliza pelo pagamento de parte do preço do veículo — pagamento este que é realizado para a concessionária.
Assim, o cliente se habilita para o bônus em questão e, ao fazer o pedido de faturamento do veículo, a concessionária o inclui como parte do pagamento. Por exemplo, na venda de um veículo com valor total de R$ 100 mil e bônus de R$ 5 mil, o pedido de faturamento incluirá uma parcela de pagamento de R$ 5 mil (a ser paga pela montadora a título de bônus) e outra parcela de R$ 95 mil (a ser paga pelo cliente final, à vista ou por meio de financiamento bancário). Ao emitir a nota fiscal de venda do veículo pela concessionária, contudo, a venda sai pelo preço cheio, isto é, em momento algum aparece a parcela do pagamento realizada diretamente pela montadora a título de bônus.
Neste contexto, existe um descasamento entre o pagamento da parcela pelo cliente final e o pagamento do bônus pela montadora, já que todos os bônus são acumulados para quitação no mês seguinte ao do faturamento do veículo. Isso não quer dizer, contudo, que se trate de um faturamento distinto da venda do veículo ao cliente final, mas sim de uma parcela que é paga posteriormente, em relação àquela venda já faturada anteriormente.
Portanto, em que pese o valor seja posteriormente pago pela montadora à concessionária, ele já compôs o preço de venda do veículo. Assim, tendo sido o valor da nota fiscal correspondente ao total do veículo negociado, neste momento já se considera o montante da venda como parte do faturamento da empresa.
As bonificações concedidas pela montadora são valores recebidos pela concessionária e utilizados para baixar títulos de clientes que até então permaneciam em aberto, mesmo após o faturamento e a entrega do veículo. Quando o cliente efetua a compra do automóvel, uma parte do preço fica em aberto, porquanto corresponde ao bônus concedido pela montadora ao cliente. Tal montante será posteriormente baixado, com a quitação, pela montadora, dos bônus até então em aberto.
Ou seja, no momento em que o cliente efetua o pagamento do automóvel adquirido, momento em que igualmente é emitida a nota fiscal de venda do veículo pelo seu valor integral, permanece em aberto o saldo relativo ao bônus concedido pela montadora. Neste momento, há o integral faturamento do automóvel, mas permanece em aberto o saldo devido pela montadora para compor o pagamento. Pretender que este saldo, viesse a ser tributado pela concessionária seria o equivalente a duplicar indevidamente o faturamento dela.
Posicionou-se neste sentido o conselheiro Jorge Luís Cabral no julgamento do recurso voluntário 11080.730216/2016-42, da 2ª Turma Ordinária da 4ª Câmara da 3ª Seção, de cujo voto se extrai que “os ingressos de valores no caixa ou outro ativo da empresa, apenas podem ser registrados como receitas se decorrerem da negociação de um bem econômico, disponibilizado ao cliente comprador ou contratante de serviços, total ou parcialmente, de forma integral ou proporcional dadas as regras do regime de competência. Como já dito anteriormente, ingressos que visem repor o patrimônio da empresa em decorrência de despesas que contratualmente não eram suas, mas que foram por ela suportadas em razão de acertos contratuais, ao serem ressarcidas, não podem ser consideradas como receitas, pois não se tratam de aumento nos benefícios econômicos durante o período contábil, mas sim de reposição à situação anterior”.
A conclusão, então, é de que o recebimento, pela concessionária, de valores decorrentes de bônus de qualquer espécie não está sujeito à incidência de PIS/Cofins, pois os bônus recebidos não se enquadram no conceito de faturamento e/ou receita.
Além disso, a saída do veículo zero-quilômetro para o consumidor final está sujeita à alíquota zero de PIS/Cofins, por força do regime monofásico aplicado na cadeia de produção automotiva.
Nos termos do artigo 1º da Lei 10.485/2002 estão sujeitos ao regime monofásico de PIS/Cofins os veículos descritos no código NCM 87.03 (“automóveis de passageiros e outros veículos automóveis principalmente concebidos para transporte de pessoas (exceto os da posição 87.02), incluindo os veículos de uso misto (station wagons) e os automóveis de corrida”), para os quais a lei atribui o recolhimento do PIS/Cofins pelo regime monofásico, com alíquotas de 2% para o PIS e 9,6% para a Cofins.
Portanto, no contexto da tributação monofásica, a carga tributária é concentrada na fase inicial do ciclo produtivo e aplicadas alíquotas superiores às dos demais regimes, de modo a compensar a desoneração nas demais fases da comercialização desses produtos. Na saída para o cliente final pelo comerciante atacadista ou varejista (situação em que se enquadram as concessionárias de veículos), a venda fica sujeita à alíquota zero, por força do artigo 3º, § 2º, da Lei n. 10.485/2002. Por conseguinte, o valor tributado é o anterior à concessão do bônus (valor total da nota fiscal de venda do veículo), não gerando qualquer prejuízo ao Fisco.
A propósito da aplicação do regime monofásico na venda de automóveis com alíquota zero, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) recentemente decidiu que “no regime de apuração monofásico de PIS/Cofins, descontos no preço de venda ao revendedor, concedidos posteriormente, em razão de termos contratuais pré-estabelecidos, não pode ser considerado como receita tributável, na medida em que o revendedor assume os riscos e a propriedade temporária da mercadoria, tendo o montante total sido integralmente tributado no elo anterior da cadeia negocial e não sendo submetido a alíquota zero no elo seguinte”, tal como se extrai do acórdão 3402-011.075, proferido pela 2ª Turma Ordinária da 4ª Câmara da 3ª Seção.
Os valores relativos ao pagamento dos bônus pela montadora à concessionária, portanto, se enquadram no regime de tributação monofásica, já que se referem à mera quitação do preço de venda do veículo para o consumidor final. Assim, sob qualquer ótica que se analise a questão, não há como a Receita Federal pretender tributar com PIS/Cofins os bônus concedidos pelas montadoras.
https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/ilegitimidade-do-pis-cofins-sobre-bonus-concedidos-por-montadoras-de-veiculos-19022024
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Carf analisa dedutibilidade das despesas com remuneração de debêntures
Data: 14/02/2024
Nesta semana trataremos dos precedentes do Carf acerca da dedutibilidade das despesas com remuneração de debêntures.
Ary Oswaldo Mattos Filho assinala que “as debêntures, no Direito brasileiro, são instrumentos de emissão peculiar às sociedades por ações; representam dívida da companhia, compreendendo, além do principal investido, acréscimos resultantes de juros fixos, variáveis ou de participação no lucro da sociedade como um todo ou em determinado empreendimento desta, conforme as obrigações assumidas na escrituração de emissão” [1].
De igual modo, Marcos Paulo de Almeida Salles pondera que a debênture é um valor mobiliário, que representa um crédito contra o emitente, assegurando aos seus titulares iguais direitos decorrentes da subdivisão da obrigação contraída na unidade de escritura de emissão [2].
Assim, a debênture é um valor mobiliário de emissão de uma sociedade por ações, sendo uma das formas de financiamento de tal tipo de sociedade. Com relação à remuneração da debênture, o artigo 56 da Lei n. 6.404/76 estabelece que ela poderá assegurar ao seu titular juros, fixos ou variáveis, participação no lucro da companhia e prêmio de reembolso.
Dessa forma, embora grande parte das debêntures estabeleça uma remuneração na forma de juros fixos ou variáveis, há possibilidade legal de que a debênture remunere o seu titular por meio de uma participação no lucro da companhia.
Como uma obrigação presente da entidade de transferir um recurso econômico como resultado de eventos passados, os recursos oriundos da emissão de uma debênture são registrados como um passivo da companhia.
A remuneração dos debenturistas é registrada no passivo de acordo com o regime de competência em contrapartida a uma despesa registrada no resultado do exercício.
Diante de tal cenário, resta discutir a dedutibilidade de tal despesa para fins de apuração do imposto de renda. Quando a forma de remuneração das debêntures é um juro fixo ou variável, essa despesa financeira será considerada dedutível, a princípio.
Por sua vez, quando a forma de remuneração das debêntures é a participação no lucro da companhia, o artigo 58, II, do Decreto-lei nº 1.598/77 determina que as pessoas jurídicas podem excluir do lucro líquido as participações asseguradas a debêntures de sua emissão.
Embora haja um dispositivo legal estabelecendo tal dedutibilidade, surge uma questão controversa quando as debêntures não são emitidas ao público em geral e possuem uma remuneração calculada com base em alto percentual da participação dos lucros, tal qual ocorreu em um caso concreto envolvendo uma sociedade anônima então de capital fechado que emitiu debêntures que asseguravam uma remuneração de 70% do lucro da companhia, de forma que houve autuação por parte das autoridades fiscais em diversos anos em que houve o pagamento de tal remuneração aos debenturistas.
O tema
Antes de adentramos no âmbito das decisões do Carf, cumpre salientar que o tema já foi objeto de análise do Poder Judiciário. Nessa linha, no âmbito da apelação e reexame necessário n.º 2010.61.00.007888-3/SP, julgado no Tribunal Regional Federal da 3ª Região, decidiu-se:
(i) que a debênture pode atribuir ao seu titular juros e/ou participação no lucro, de onde se conclui que o pagamento de juros é, portanto, uma faculdade prevista na referida legislação;
(ii) a ausência de circulação monetária, no sentido exclusivamente físico, não implica na inexistência de circulação econômica e jurídica de recursos financeiros;
(iii) as debêntures diferenciam-se de despesas operacionais, na medida em que as despesas operacionais alcançam insumos ou custos diversos do contribuinte e não deduções financeiras como as debêntures;
(iv) não se aplica a tal caso a regra geral de dedutibilidade contida no artigo 47 da Lei nº 4.506/64; (v) não há qualquer restrição quanto à dedutibilidade da remuneração das debêntures — salvo as regras gerais próprios dos atos jurídicos gerais, a sua efetiva existência, validade, como a forma e os seus requisitos gerais; e
(vi) a emissão das debêntures obedeceu às disposições da Lei n. 6.404/76, sendo que o fato de os acionistas terem sido os subscritores das debêntures não descaracterizou o negócio ou o tornou ilegal.
Precedentes do Carf
Feitas as considerações gerais sobre o tema, passaremos à análise dos precedentes do Carf acerca do assunto.
No âmbito das turmas ordinárias, nos Acórdãos 107-08.029 (13/04/05), 101-94.986 (19/05/05), 110200.659 (31/1/12), 1102-001.227 (22/10/14), prevaleceu o entendimento de que são indedutíveis as despesas com remuneração das debêntures lastreadas em participações nos lucros.
Com relação às razões de decidir que levaram a tal entendimento, merecem destaques os seguintes pontos.
No Acórdão 107-08.029, o conselheiro Marcos Neder apresentou declaração de voto, no qual assinala que “a razão da autorização da dedução do lucro tributável das participações de debêntures é sua natureza de juros, tanto que sua tributação na fonte segue as regras aplicáveis às demais aplicações financeiras de renda fixa”. “Portanto, a possibilidade de dedução dessas participações, que se assemelham a juros, deve ser confrontada com o critério de sua necessidade em face dos objetivos sociais da empresa.”
De igual modo, no Acórdão 101-94.986, a conselheira Sandra Faroni pondera que a remuneração da debêntures com base em um alto percentual de participação lucros não pode ser considerada “usual” e “normal”, sobretudo, quando o negócio jurídico não tem um real propósito negocial, mas visa apenas o apenas reduzir artificialmente a carga.
Por outro lado, nos acórdãos 101-97.021 (13/11/08) e 1101-000.889 (7/5/13), prevaleceu, por maioria de votos, o entendimento da dedutibilidade das despesas com as remunerações das debêntures sob a forma de participações nos lucros.
No Acórdão 1101-000.889, a conselheira Edeli Bessa assinalou que “não é possível reputar artificial este tipo de operação apenas com base no percentual de lucro estipulado para remuneração das debêntures”. “Como visto, há diversos outros aspectos envolvidos nesta forma de capitalização, e a autoridade lançadora deve analisar estas repercussões antes de afirmar que a emissão de debêntures foi realizada com propósito único de fabricar uma despesa gerando artificialmente deduções fiscais conferidas a este título.”
Diante de resultados distintos no âmbito das turmas ordinárias, o assunto veio a ser analisado na Câmara Superior de Recursos Fiscais.
No Acórdão 9101-000.869 (23/02/11), entendeu-se, por maioria de votos, que a despesa com a remuneração das debêntures seria indedutível, dado que haveria um motivo simulatório manifesto em virtude da emissão das ações ter se dado exclusivamente para os sócios e diante do alto percentual do lucro ser a remuneração da debênture.
Em um momento posterior, a 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais se deparou com alguns casos acerca do tema, sendo que nos Acórdãos 1202-00.335 (06/07/10), 9101-002.555 (19/01/17), 9101-002.538 (20/01/17) e 9101-002.973 (05/07/17), prevaleceu o entendimento por voto de qualidade no sentido de indedutibilidade das despesas com a remuneração das debêntures lastreadas em participações nos lucros.
Em mais de uma oportunidade (Acórdãos 1202-00.335 e 9101-002.555), o conselheiro Rafael Vidal de Araújo asseverou que não se aplica a regra geral de dedutibilidade contida no artigo 47 da Lei n. 4.506/64 na hipótese de dedutibilidade das despesas com debêntures.
O referido conselheiro mencionou ainda que a razão da autorização da dedução do lucro tributável das participações de debêntures prevista no artigo 58, II, do Decreto-Lei n. 1.598/77 se dá em função da natureza de juros da remuneração das debêntures.
No Acórdão 9101-002.973, a conselheira Adriana Gomes Rego pontuou que “a entrega de parcelas significativas de seus lucros a título de remuneração das debêntures no contexto de empresas ligadas, caracteriza liberalidade, e desvirtua a natureza de despesa necessária, tornando-a indedutível na apuração do lucro real”, sendo que o financiamento por debêntures deveria, em tese, atrair um público externo da companhia e de forma pulverizada.
Ademais, algumas características das operações com as debêntures demonstrariam a falta de propósito negocial, tais quais (i) não possuírem caráter de incerteza com relação à remuneração; (ii) não houve efetivo ingresso financeiro de recursos com as debêntures; (iii) é alta a destinação de 70% dos lucros aos debenturistas; e (iv) comparação comas taxas utilizadas como formas de remuneração de outras debêntures do mercado.
Ainda houve acórdãos como os seguintes: 9101-003.310 (17/1/18) e 9101-003.699 (8/8/18), em que prevaleceu o entendimento pela indedutibilidade das despesas com a remuneração das debêntures por maioria de votos, sendo que as razões de decidir dos demais processos da Câmara Superior foram expressamente citadas.
Em vista de todo o exposto, nota-se que tem prevalecido no Carf o entendimento de que são indedutíveis as despesas relacionadas com a remuneração de debêntures, quando esta é lastreada em percentuais altos do lucro do exercício e a oferta das debêntures se deu tão somente aos acionistas.
*Este texto não reflete a posição institucional do Carf, mas, sim, uma análise dos seus precedentes publicados no site do órgão, em estudo descritivo, de caráter informativo, promovido pelos seus colunistas.
Carf julga casos de R$ 9 bilhões da Petrobras na terça-feira
Data: 18/02/2024
A Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) retoma o julgamento sobre a validade de duas cobranças de Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), recebidas pela Petrobras, que somam R$ 9,18 bilhões, na terça-feira. Quatro dos oito conselheiros da 3ª Turma, que analisa a questão, já votaram pela manutenção da cobrança. O julgamento havia sido suspenso por um pedido de vista.
Se os quatro votos forem mantidos quando o julgamento for retomado, mesmo que os outros quatro conselheiros divirjam, a Fazenda terá o empate. O desempate será da presidente da Turma, Liziane Angelotti Meira, representante da Fazenda, que é a relatora do caso e já votou contra a empresa.
A Receita Federal cobra Cide sobre as remessas efetuadas ao exterior por conta de pagamentos de afretamentos de embarcações (espécie de aluguel). O Fisco desconsiderou os afretamentos e disse se tratar de importações de serviços.
Contexto
A tese não é nova no setor de energia. A Receita Federal já autuou a Petrobras e outras companhias por discordar da forma de contratação de serviços de exploração marítima de petróleo.
Normalmente, há dois contratos separados: um para o afretamento de embarcações e outro para a prestação de serviços de perfuração, exploração e prospecção — geralmente firmado com uma subsidiária do fornecedor estrangeiro.
Como o afretamento não é tributado, geralmente corresponde ao maior percentual do negócio. Porém, a partir de 2014, a Lei nº 13.043 passou a estipular um percentual máximo para a alocação de receitas em cada contrato.
Também há cobranças de PIS e Cofins da Petrobras pelo mesmo motivo, mas a 3ª Turma analisa nos casos apenas da exigência de Cide.
Detalhes das autuações
Em um dos casos sob julgamento do Carf, a Receita cobra Cide referente ao exercício de 2012 (processo nº 16682.722898/2016-54). A cobrança soma R$ 6,12 bilhões, de acordo com documento enviado pela empresa à Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
O outro caso trata de cobrança de Cide referente ao ano de 2010 (processo nº 16682.720836/2014-46). Essa autuação soma R$ 3,06 bilhões. Os recursos sobre ambas as autuações fiscais começaram a ser julgados juntos.
Carf: contribuição previdenciária incide sobre ‘PLR’ paga em mais de duas parcelas
Data: 19/02/2024
Por sete votos a dois, a 2ª Turma da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) entendeu que uma verba denominada pelo contribuinte como “Participação nos Lucros e Resultados” deve integrar o salário de contribuição para fins de cobrança de contribuições previdenciárias.
Embora o contribuinte tenha descrito o pagamento como PLR, os conselheiros concluíram que ele não observou a legislação que define que esta deve ser paga em, no máximo, duas vezes. Assim, o colegiado concluiu que a verba tem natureza salarial, devendo compor a base de cálculo das contribuições previdenciárias.
O colegiado também decidiu que a contribuição previdenciária deve incidir sobre os abonos pagos anualmente, ainda que previstos em Convenção Coletiva de Trabalho, por entenderem que a verba é paga com regularidade. No caso em questão, embora o acórdão recorrido afirme que houve o pagamento de abonos únicos, para o colegiado da Câmara Superior, os pagamentos seguem outra sistemática, sendo habituais.
Segundo a fiscalização, a empresa pagou os valores a título de PLR em desacordo com a Lei 10.101/2000, que regula a participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados das empresas. Essa legislação determina que o pagamento deve ser feito em duas vezes em parcelas semestrais. O contribuinte, no entanto, realizou o pagamento em três parcelas. Desse modo, para o fisco, esse parcelamento descaracterizou a PLR, fazendo com que a verba tenha natureza salarial. Já o contribuinte alegou que a fiscalização desconsiderou um acordo entre a empresa e o sindicato da categoria, que determinou o pagamento em três parcelas.
Em relação aos abonos, a fiscalização considerou que eles não são únicos, mas habituais, uma vez que foram pagos anualmente. Desse modo, para a autoridade tributária, os abonos também teriam natureza salarial e deveriam compor a base de cálculo das contribuições previdenciárias. Sobre os abonos, a empresa defendeu que foram únicos.
A maioria dos conselheiros, no entanto, entendeu como a fiscalização. “Se o abono pago no caso concreto se deu em parcelas, não estando desvinculado do salário, inclusive se afastando do abono único, que é pago uma única vez e tem uma roupagem inversa da coletada nos autos, não se deve confundi-los”, destacou o relator, Leonam Rocha de Medeiros.
A ação tramita com o número 16095.000053/2008-14 e envolve a empresa Borlem S/A Empreendimentos Industriais.
NOTÍCIAS RELACIONADAS A DECISÕES JUDICIAIS:
- FEDERAIS:
Liquidação antecipada do seguro-garantia não será discutida como repetitivo no STJ
Data: 15/02/2024
1ª SEÇÃO
Processos: REsps 2093036/SP, 2093033/SP e 2077314/SC
Partes: Seara Alimentos Ltda. e outros X Fazenda Nacional
Relatora: Regina Helena Costa
A possibilidade de liquidação antecipada do seguro-garantia, ou seja, a conversão dos valores em dinheiro antes do trânsito em julgado, não será discutida sob a sistemática repetitiva no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A ministra Regina Helena Costa, relatora dos processos candidatos à afetação, votou pelo cancelamento da controvérsia, pois já existe lei disciplinando a matéria. Os processos indicados eram os REsps 2093036/SP, 2093033/SP e 2077314/SC.
Quando um processo é afetado ao rito repetitivo, a decisão do STJ sobre o tema torna-se vinculante, ou seja, de observância obrigatória para os demais tribunais, com exceção do Supremo Tribunal Federal (STF). O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) também fica vinculado à aplicação do entendimento.
No caso da discussão sobre a liquidação antecipada do seguro-garantia, o Congresso Nacional derrubou o veto presidencial a dispositivo da Lei 14.689/2023 que proíbe a antecipação. A proibição foi inserida por parlamentares na lei, que restabeleceu o voto de qualidade (desempate pelo presidente da turma, sempre um representante do fisco) como critério de desempate no Carf. O item foi vetado, mas o veto caiu em dezembro do ano passado.
Conforme Regina Helena Costa, “a questão ora controvertida recebeu disciplina legislativa específica e exauriente, prejudicando, assim, o prosseguimento da afetação”. A magistrada disse ainda que, por se tratar de norma de caráter processual, a legislação aplica-se às ações judiciais em curso.
Segundo a advogada Fernanda Secco, sócia do Velloza Advogados, a nova lei traz segurança jurídica e alívio financeiro às empresas. “O tema é de grande relevância uma vez que as empresas estavam sendo prejudicadas duplamente. Além de terem que arcar com os custos da seguradora quando da contratação da garantia, logo no início da discussão judicial, também eram obrigadas a despender altas quantias financeiras para depósito dos valores quando da liquidação antecipada do seguro, com o objetivo de evitar o acionamento da seguradora e a diminuição do seu poder de crédito”, comentou.
STF invalida lei do TO que criou cobrança sobre operações para outros estados
Data: 15/02/2024
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão virtual, declarou inconstitucionais dispositivos de lei de Tocantins que impunham aos produtores do estado o pagamento de um adicional sobre o imposto de operações envolvendo a saída de produtos de origem vegetal, mineral ou animal ao exterior ou a outros estados. A decisão, unânime, foi tomada no julgamento de uma ação direta de inconstitucionalidade.
A Lei estadual 3.617/2019 previa que os produtores locais pagassem 0,2% sobre o valor das operações de saídas interestaduais ou com destino a exportação desses produtos para compor o Fundo Estadual de Transporte (FET). A Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), autora da ação, argumentou, entre outros pontos, que o estado instituiu um “adicional camuflado” do ICMS com receita vinculada, violando princípios como a vedação da vinculação de receitas de impostos, a imunidade tributária das operações de exportação, a isonomia tributária e as determinações constitucionais a respeito da política agrícola, por elevar o custo da produção.
Em informação prestada nos autos, o governo do estado alegou que a cobrança não configuraria tributo, mas preço público cobrado em razão do uso de rodovias estaduais.
Imposto
Em seu voto pela procedência do pedido, o ministro Luiz Fux, relator da matéria, observou que a cobrança apresenta características de imposto, pois incide compulsoriamente sobre os contribuintes e não se vincula a qualquer atividade estatal. Ele explicou que o tributo em questão possui fato gerador (operações de saída de produtos de origem vegetal, mineral ou animal) e base de cálculo (valor destacado no documento fiscal) idênticos aos do ICMS. E, de acordo com o artigo 155 da Constituição Federal, cabe a resolução do Senado Federal estabelecer as alíquotas aplicáveis às operações e prestações interestaduais e de exportação. “Não podem os estados-membros criar adicionais sobre as alíquotas interestaduais do ICMS”, afirmou Fux.
O ministro ressaltou ainda que a Constituição Federal veda a vinculação da receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, salvo nas hipóteses expressamente nela previstas. Além disso, a base de cálculo não guarda relação com eventuais custos de manutenção das rodovias estaduais utilizadas para o escoamento da produção. Por fim, Fux explicou que o adicional incide inclusive sobre operações de saída de mercadorias com destino à exportação, situação que afronta regra da Constituição Federal que estabelece imunidade em relação ao ICMS para as operações que destinem mercadorias ao exterior. Com informações da assessoria de imprensa do STF.
Verbas recebidas a título de ajuda de custo não compõem base de cálculo de Imposto de Renda
Data: 15/02/2024
A 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) deu provimento à apelação interposta por servidor contra a sentença que, em mandado de segurança, negou o pedido do requerente, parlamentar da Assembleia Legislativa do Amazonas, mantendo a incidência do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) sobre a ajuda de custo e o ticket combustível.
O impetrante argumentou que essas verbas não se incorporam ao patrimônio dele, possuindo natureza indenizatória, o que afasta a incidência do IRPF. Em contrarrazões, requereu a Fazenda Nacional a manutenção da sentença sob o argumento de que as parcelas foram recebidas em caráter permanente, apresentando-se como riqueza nova que se agrega ao patrimônio individual, sujeitando-se à incidência tributária.
A relatora do caso, juíza federal convocada Clemência Maria Almada Lima de Angelo, explicou que se encontra pacificado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) o entendimento de que as verbas recebidas a título de ajuda de custos, bem como as demais verbas de gabinete, não compõem a base de cálculo de Imposto de Renda, vez que não se incorporam ao subsídio do parlamentar, possuindo natureza indenizatória ainda que sejam pagas de maneira constante, mensal.
Por unanimidade, o Colegiado deu provimento à apelação para anular o débito fiscal referente às parcelas de IRPF sobre ajuda de custo e ticket combustível.
Processo: 0004068-84.2007.4.01.3200
Data do julgamento: 12/12/2023
Benefícios fiscais sobre a partilha de receitas de impostos segundo o STF
Data: 16/02/2024
O que diz o Supremo Tribunal Federal acerca dos impactos dos benefícios fiscais sobre a partilha de receitas de impostos? Teriam os entes federados recipientes da partilha direito ao recebimento do valor “total” sem os benefícios?
O STF tem desempenhado um papel crucial na análise dos impactos dos benefícios fiscais sobre a partilha de receitas de impostos no contexto federativo brasileiro.
Em diversas decisões, a Suprema Corte brasileira tem se debruçado sobre a questão da legalidade e da constitucionalidade desses benefícios, especialmente no que diz respeito à sua influência na partilha de recursos entre os entes federados.
Uma das questões centrais debatidas é se os entes federados destinatários da partilha teriam direito ao recebimento do valor “total” das receitas sem os benefícios fiscais. Adicionalmente, defendemos que, dentre outras normas, o artigo 113 do ADCT deve ser considerado pelo ente que concede o benefício fiscal.
A partilha de receita tributária
Sob o prisma do federalismo fiscal, a autonomia de cada ente federado é garantida mediante dois mecanismos básicos:
(1) atribuição de competência tributária própria, como uma fonte independente e regular de recursos (receitas próprias), e
(2) repartição direta e indireta de receitas tributárias (receitas transferidas), como forma de implementação do federalismo cooperativo, que visa à redução das desigualdades regionais e à adequada prestação dos serviços públicos titularizados por cada ente [1].
Ressalta-se que as receitas transferidas incluir-se-ão, como despesa, no orçamento da entidade obrigada a transferência e, como receita, no orçamento da que as deva receber (§1º, artigo 6º, Lei nº 4.320/1964).
Quanto às receitas transferidas mediante repartição indireta, os municípios, estados e o Distrito Federal fazem jus a quotas do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal (FPE), cujos recursos são formados por parcelas dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados, ambos de titularidade da União, nos termos do artigo 159, inciso I, da Constituição.
Em relação às receitas transferidas por repartição direta, sem intermediação de fundos ou condicionantes outras, a Constituição republicana assegura aos entes subnacionais parcelas do produto da arrecadação de diferentes impostos titularizados pelos “entes maiores”.
Nessa linha, por exemplo, pertence aos estados, ao Distrito Federal e ao municípios o produto da arrecadação do imposto de renda retido na fonte (artigos 157, I e 158, I, da Constituição).
Quanto ao ICMS, os municípios são titulares de 25% do produto da arrecadação desse imposto estadual (artigos 158, IV, da Constituição).
Benefícios fiscais e “cortesia com chapéu alheio”
Dúvida surge quando um “ente maior” decide instituir benefício fiscal redutor de sua capacidade arrecadatória imediata, reduzindo, assim, a base de cálculo do percentual de receita tributária que caberia a um “ente menor”.
Cita-se a política de incentivos fiscais do ente central como uma “cortesia com chapéu alheio”, porquanto parte desse custo é transferida para o ente titular de parcela do produto de uma arrecadação que jamais será concretizada. Nesse contexto, há redução das receitas partilhadas suportada pelos entes beneficiários, sendo o assunto levado ao STF no RE nº 572.762/SC (Tese 42) e RE nº 705.423/SE (Tese 653) [2]
O conceito técnico de “arrecadação” revela-se fundamental para o exame de casos do tipo, já que os dispositivos constitucionais referentes à repartição de receitas tributárias literalmente asseguram aos entes beneficiários parcelas do “produto da arrecadação” dos tributos repartidos (não à toa, a repartição de receitas é um tema de Direito Financeiro, não de Direito Tributário [3].
A posição do Supremo Tribunal Federal
Inicialmente, ao julgar o Tema 42 da Repercussão Geral (recurso-paradigma: RE 572.762, rel. min. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, DJe 05.09.2008), a Suprema Corte brasileira entendeu que o Programa de Desenvolvimento da Empresa Catarinense violara o artigo 158, IV, da Constituição republicana ao reduzir as quotas do produto da arrecadação do ICMS devidas aos municípios catarinenses.
De acordo com a ementa do julgado, “o repasse da quota constitucionalmente devida aos municípios não pode sujeitar-se à condição prevista em programa de benefício fiscal de âmbito estadual”.
Nessa oportunidade, o ministro relator qualificou sua posição ao frisar que, da análise do acórdão recorrido, ficara claro que “o tributo em tela já havia sido efetivamente arrecadado”.
O fato, no entanto, é que o STF, ao julgar o Tema 42, ampliou em demasia a expressão “produto da arrecadação” para nela compreender a totalidade dos percentuais das receitas tributárias repartidas, como se pertencessem de pleno direito aos municípios, a despeito do estágio ou fase em que a receita se encontrasse.
Para que se compreenda o equívoco desse entendimento, é necessário ressaltar que o conceito de “arrecadação” possui um sentido técnico amplamente aceito no Direito Financeiro. Em verdade, a receita pública orçamentária sujeita-se a diversos estágios, nomeadamente: previsão, lançamento, arrecadação e recolhimento.
A arrecadação corresponde à entrega dos recursos devidos ao Tesouro pelos contribuintes ou devedores, por meio dos agentes arrecadadores ou instituições financeiras autorizadas pelo ente. Esse é o momento em que se reconhece a receita pública orçamentária, nos termos do artigo 35, I, da Lei nº 4.320, de 1964.
O recolhimento em si consiste em fase posterior, que se dá no momento em que o produto da arrecadação é efetivamente transferido para conta específica do Tesouro, responsável pela administração e controle da arrecadação e programação financeira, nos termos do artigo 56 da Lei nº 4.320, de 1964 [4].
Não menos importante nesse caso é perceber que, segundo uma conhecida diretriz hermenêutica (hoje transformada técnica legislativa por força do artigo 11, I, a, da Lei Complementar nº 95/1998), as disposições normativas devem “usar as palavras e as expressões em seu sentido comum, salvo quando a norma versar sobre assunto técnico, hipótese em que se empregará a nomenclatura própria da área em que se esteja legislando”.
Na interpretação constitucional, deve-se privilegiar o sentido técnico de “arrecadação” na análise dos dispositivos que tratam da repartição de receitas tributárias.
Nesse contexto, o uso da expressão “produto da arrecadação” por parte do Constituinte é determinante: se o benefício fiscal antecede a fase de arrecadação, evitando a própria previsão da receita no âmbito do ente titular da competência tributária (como ocorre na isenção), nada pode ser alegado pelo ente beneficiário da receita transferida.
Caso já tenha ocorrido a arrecadação da receita tributária orçamentária, no entanto, o benefício fiscal não pode reduzir a base de cálculo do repasse, preservando-se, desse modo, a transferência do percentual do produto da arrecadação previsto constitucionalmente.
Tal entendimento, além de preservar o conceito técnico de “arrecadação”, é o que concilia de maneira mais adequada e isonômica a autonomia dos entes subnacionais (reforçada no âmbito fiscal pela garantia do recebimento de receitas transferidas) com a competência tributária do ente titular da receita, que também possui status constitucional.
O STF acolheu essa posição no julgamento dos Temas 653 e 1.172 da Repercussão Geral. Ao apreciar o Tema 653 (leading case: RE 705.423, rel. Edson Fachin), o STF concluiu que as regras constitucionais de repartição de receitas não limitam o exercício da competência tributária própria de cada ente, o que inclui tanto a prerrogativa de instituir e arrecadar tributos quanto a de conferir benefícios fiscais.
Ressaltou, ademais, que a expressão “produto da arrecadação” prevista no artigo 158, I, da Constituição da República, não permite interpretação constitucional de modo a incluir na base de cálculo do FPM os benefícios e incentivos fiscais devidamente realizados pela União em relação a tributos federais, à luz do conceito técnico de arrecadação e dos estágios da receita pública.”
O ministro Teori Zavascki, em seu voto, argumentou: espera-se que, a médio prazo, as desonerações fiscais promovam desenvolvimento econômico local, com subsequente aumento da arrecadação direta dos entes federativos subnacionais (uma externalidade positiva que, no entanto, carece de confirmação empírica).
Em verdade, segundo a jurisprudência do STF, a alegação de ofensa à regra de repartição de receitas prevista no artigo 158, IV, da Constituição por parte dos municípios será procedente se houver a prévia arrecadação da correspondente receita pelo estado, a despeito do benefício fiscal, já que, segundo a literalidade do dispositivo constitucional, os municípios fazem jus a parcela do “produto da arrecadação” do imposto.
Contudo, quando a receita chega à fase de arrecadação, o benefício fiscal concedido pelo Estado não pode acarretar a diminuição da base de cálculo da parcela cabível ao município. Foi o que o STF decidiu no RE 1.288.634 (Tema 1172 da Repercussão Geral) em caso de diferimento do pagamento de ICMS, segundo o qual:
“Os programas de diferimento ou postergação de pagamento de ICMS — a exemplo do FOMENTAR e do PRODUZIR, do Estado de Goiás – não violam o sistema constitucional de repartição de receitas tributárias previsto no art. 158, IV, da Constituição Federal, desde que seja preservado o repasse da parcela pertencente aos Municípios quando do efetivo ingresso do tributo nos cofres públicos estaduais.”
O artigo 113 do ADCT e a mudança de paradigma
Em nossa opinião, o tema deve ser contextualizado também à luz da Emenda Constitucional 95/2016, que instituiu o então “Novo Regime Fiscal” no país.
Ressalta-se um dispositivo em específico: o artigo 113 do ADCT. Com base nessa norma, toda proposição legislativa (federal, estadual, distrital ou municipal) “que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro”, em linha com a previsão do artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal.
A escolha do Constituinte de regular esse assunto reflete o princípio da responsabilidade fiscal, especialmente ao lidar com a concessão de benefícios tributários que resultam em renúncia de receita.
Essa decisão decorre da percepção de que a elaboração de tal estudo concede ao Poder Legislativo a autoridade para examinar não apenas os objetivos constitucionais buscados por meio desses benefícios, mas também para fiscalizar a viabilidade financeira dessa decisão política.
A concessão de benefícios fiscais, ao impactar a receita do ente, afeta os recursos financeiros usados pelo Estado (em sentido amplo) para financiar suas operações. Portanto, uma decisão política informada do legislador requer uma compreensão abrangente da questão, especialmente no que diz respeito aos efeitos financeiros resultantes.
Acredita-se que a política de isenções de tributos sujeitos à partilha deve igualmente se submeter a tal preceito. Desse modo, poder-se-ia pensar na regularidade das isenções de impostos sujeitos à partilha, desde que atendidas as normas constitucionais e legais pertinentes, notadamente o artigo 113 do ADCT [5] e o artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal, entre outros [6].
Isso porque a obediência a essas prescrições contribui para a maior qualidade da renúncia de receita – tanto pelo prisma fiscal quanto pelos resultados sociais e econômicos gerados, compensando eventual impacto interfederativo da renúncia de receita sobre os entes menores. Aliás, foi justamente o que o STF decidiu na ADI 2.238 ao considerar válido o artigo 14 da LRF [7].
Em suma, a decisão do ente central que concede benefícios fiscais sobre a partilha de receitas de impostos deve observar os seguintes parâmetros:
1) Conforme o caso, há a necessidade de editar lei específica, como exige o artigo 150, §6º, da Constituição; 2) Em se tratando de benefício fiscal de ICMS, deve-se obter autorização mediante convênio celebrado no âmbito do Confaz (artigo 155, § 2º, XII, g, da Constituição);
3) Cumpre estimar o impacto orçamentário e financeiro da renúncia de receita no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes (artigo 113 do ADCT [8] e artigo 14, caput, da LRF);
4) Atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias (artigo 14, caput, da LRF); 5) Demonstrar que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do artigo 12 da LRF, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias (artigo 14, I, da LRF) ou estar acompanhada de medidas de compensação; e, além disso, o projeto de lei orçamentária será acompanhado de demonstrativo regionalizado do efeito, sobre as receitas e despesas, decorrente do benefício fiscal (artigo 165, § 6º, da Constituição).
STF retoma julgamento sobre manutenção de benefício fiscal para reciclagem
Data: 16/02/2024
O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, no Plenário Virtual, a análise de recurso para tenta reduzir o impacto de julgamento que derrubou um importante benefício fiscal para o setor de reciclagem: a isenção de PIS e Cofins na venda de reciclados, que vigorou por pouco mais de 15 anos. As empresas tentam evitar uma conta de pelo menos R$ 4,1 bilhões, referente aos recolhimentos que deixaram de ser feitos no passado. Por enquanto, apenas dois ministros votaram, sugerindo um limite temporal (modulação de efeitos) para a aplicação da decisão.
No julgamento, os ministros analisam recursos (embargos de declaração) de associações de empresas contra decisão do STF tomada em junho de 2021. Alegam que o posicionamento tem impactos no meio-ambiente, uma vez que, com a tributação, os preços dos recicláveis perdem competitividade em comparação com os dos insumos extraídos da natureza.
Em 2021, o STF declarou inconstitucionais dois dispositivos da Lei do Bem (nº 11.196/2005), que prevê incentivos fiscais para empresas que fazem pesquisa e desenvolvimento de inovação tecnológica. Ao derrubar o artigo 47 da norma, os ministros autorizaram o uso de créditos de PIS e Cofins na aquisição de insumos recicláveis — desperdícios, resíduos, aparas, vidros e aço, por exemplo. Consequentemente, também consideraram inválida a isenção das contribuições, concedida pelo artigo 48 na venda desses materiais.
Voto do relator
Para o relator, ministro Gilmar Mendes, os artigos 47 e 48 da lei formam um “bloco unitário incindível”. A declaração de inconstitucionalidade apenas do primeiro dispositivo, afirmou, faria com que o conjunto perdesse sentido e racionalidade. O ministro negou o pedido das empresas para reanálise do mérito. Mas defendeu a imposição de um limite temporal (modulação de efeitos) ao entendimento.
Pela proposta original do relator, ficaria definida uma data para início da cobrança das contribuições: 16 de junho de 2021, quando foi publicada a ata do julgamento de mérito.
Em voto depositado hoje, o relator alterou a modulação, tendo em vista indicação do ministro Dias Toffoli em voto divergente que já havia sido apresentado. Nova proposta de modulação do relator é para que sejam produzidos efeitos a partir do exercício seguinte à data de publicação da ata de julgamento dos embargos.
“Não há dúvidas de que o afastamento da proibição de apropriação de créditos de PIS/Cofins fatalmente causará impactos financeiros de relevo, obrigando a União a reformular aspectos significativos de sua programação orçamentária”, afirma ele, em seu voto.
O ministro também considerou que a invalidação do benefício tributário poderia levar à cobrança retroativa de PIS e Cofins sobre vendas de insumos recicláveis. “A injustiça da medida é manifesta, porque, em se tratando de operações pretéritas, não há meios para o contribuinte repassar o ônus tributário para os elos seguintes da cadeia produtiva”, diz.
Sem a modulação, as vendedoras de recicláveis poderão ter que desembolsar R$ 4,1 bilhões em PIS e Cofins relativos aos últimos cinco anos, segundo estudo feito em abril de 2022 pela consultoria GO Associados.
Voto divergente
Consta no sistema o voto divergente do ministro Dias Toffoli – sem indicação se atualizado ou não após o voto do relator. Para Toffoli, o artigo 48 da lei é constitucional, portanto, seria possível manter a suspensão da exigência do PIS e da Cofins no primeiro elo da cadeia econômica. Pela norma, a isenção é aplicada na venda de recicláveis para empresa que apura o Imposto de Renda no lucro real.
Ainda segundo Toffoli, se vencido nesse entendimento, o STF deve dar prazo para que o Congresso, se quiser, voltar a equiparar a cadeia de materiais recicláveis à cadeia extrativista no que diz respeito à tributação de PIS e Cofins. Os demais ministros têm até a próxima sexta-feira, dia 23, para votar ou suspender o julgamento (RE 607109).
TRF-3 derruba autuação fiscal por amortização de ágio
Data: 19/02/2024
O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) afastou autuação fiscal recebida pela Companhia de Transmissão de Energia Elétrica (ISA CTEEP) por amortização indevida de ágio. O precedente é importante por prevalecer na Corte, que engloba os Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul, posição contrária aos contribuintes. Além disso, aplica decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o assunto, proferida em setembro.
Essa é uma das 112 decisões judiciais sobre ágio proferidas no país até janeiro deste ano. Desse total, a maioria (61) é favorável aos contribuintes, segundo levantamento exclusivo feito pelo escritório Mattos Filho a pedido do Valor.
O ágio é um valor pago, em geral, pela rentabilidade futura da empresa adquirida ou incorporada. Como a Lei nº 9.532, de 1997, permite seu registro como despesa no balanço, o valor é amortizado para reduzir a base de cálculo (lucro) do Imposto de Renda (IRPJ) e da CSLL. Só a partir da entrada em vigor da Lei nº 12.973, de 2014, a amortização do ágio interno foi vedada. Por isso, existem autuações fiscais sobre aproveitamento de ágio no passado, cobrando agora valores elevados.
A decisão do TRF-3 leva em consideração o primeiro julgamento realizado pelo STJ sobre o assunto. Em setembro, a 1ª Turma afastou a tributação aplicada a uma empresa que aproveitou o ágio gerado em operação realizada em 2004 por meio de uma intermediária, que, segundo a Fazenda, não tinha motivação econômica para existir, tratando-se de uma “empresa de prateleira” (REsp 2026473).
A ação da Companhia de Transmissão de Energia Elétrica foi ajuizada em 2018. O objetivo era anular a cobrança de IRPJ e CSLL que recebeu sobre suposta amortização indevida de ágio, após a incorporação, em 2008, de sua controladora, a ISA Capital do Brasil.
Entre 2006 e 2007, a ISA adquiriu, em etapas, o controle acionário da CTEEP, por meio de leilão de privatização, compra de ações de funcionários e oferta pública de aquisição de papéis de acionistas minoritários. Foi registrado um ágio na aquisição de ações na contabilidade, já que o preço pago foi superior ao valor de patrimônio líquido da empresa.
Depois, a ISA foi incorporada pela CTEEP. Para a operação, porém, foi criada uma subsidiária. Não foi possível realizar a incorporação direta, de acordo com a companhia, em razão de restrições impostas por normas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
No processo, a empresa alega que cumpriu os requisitos básicos para a amortização de ágio, além de atender às exigências das agências reguladoras. Acrescenta que esse formato foi mais oneroso, do ponto de vista fiscal, do que o indicado pela Receita Federal – gasto a mais de R$ 262,3 milhões. Mesmo assim, foi autuada no ano de 2013, por causa do uso de intermediária na operação.
A decisão, proferida pela 3ª Turma do TRF-3, foi unânime. Considera que até a edição da Lei nº 12.973, de 2014, não existia proibição legal para amortização de ágio gerado entre partes relacionadas, nem vedação ao aproveitamento do ágio entre partes dependentes.
“É plenamente viável a utilização de empresa veículo na reorganização societária, sobretudo no caso, em que restou comprovada a impossibilidade, por restrição da Aneel e CVM, na incorporação direta da ISA Capital pela CTEEP. Ademais, inexiste indícios de ocorrência de fraude à lei ou simulação na reestruturação em análise”, afirma o relator, desembargador Nery da Costa Junior, no acórdão.
Além do precedente do STJ, a decisão cita decisões no mesmo sentido do TRF da 4ª Região, que abrange os Estados do Sul do país (processo nº 5024766-47.2019.4.04.7201). Leva em conta ainda que, no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), a decisão contrária à CTEEP se deu por voto de qualidade – o desempate pelo presidente da turma julgadora, que é representante da Fazenda.
Foi apresentado recurso (embargos de declaração) da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) à decisão. Por meio de nota, o órgão informa ao Valor que, “sem subestimar a importância de uma decisão da Corte Superior, é importante lembrar que o aresto não foi prolatado em sede de julgamentos de feitos repetitivos, nem representa entendimento da Seção ou da Corte Especial”.
A PGFN aguarda o julgamento do recurso no processo e afirma que as conclusões não podem ser consideradas definitivas, nem aplicáveis a qualquer situação envolvendo ágio.
Procurado pelo Valor, um dos advogados que representou a empresa no TRF-3, Celso Costa, sócio do escritório Machado Meyer Advogados, preferiu não comentar o caso (processo nº 5024068-10.2018.4.03.6100).
Lígia Regini, sócia do BMA Advogados, destaca que o precedente do TRF-3 é interessante por citar a legalidade, ponderando que não pode ser exigido o que não estava vedado na lei vigente naquela época. “Isso é muito convergente com o entendimento proferido pela 1ª Turma do STJ”, afirma.
Para a advogada, o recente julgamento do STJ esvazia 15 anos de debates no Carf sobre a exigência, por parte da Receita Federal, de requisitos que não constam em lei. “Ainda estamos longe de ter um repetitivo com entendimento vinculante sobre a matéria. Mas mesmo que ele venha, não vai resolver todos os casos de ágio”, diz.
A tributarista Andrea Oliveira, do mesmo escritório, reforça que, apesar das diferentes nuances em casos de ágio – como uso ou não de empresa veículo, partes relacionadas, entre outros – o que se tem visto são os tribunais muito focados em legalidade. E, quando isso acontece, acrescenta ela, as decisões são favoráveis aos contribuintes.
“Vemos uma tendência favorável nos tribunais federais, ao restabelecerem o ponto de vista da legalidade”, afirma a advogada. “O Fisco foi criando conceitos que não estavam baseados em lei.”
- ESTADUAIS:
Empresa júnior vinculada a faculdade tem direito a imunidade tributária, diz TJ-DF
Data: 15/02/2024
Uma empresa júnior, enquanto organização estudantil gerenciada por alunos da graduação de determinada faculdade, tem direito à imunidade tributária oferecida às instituições de educação sem fins lucrativos, conforme prevê a Constituição.
A conclusão é do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que deu provimento a recurso para afastar a cobrança de ISS sobre uma empresa júnior de administração vinculada ao Centro Universitário de Brasília (Uniceub).
O resultado foi por 3 votos a 2. O tema é importante e ainda não tem precedentes no Supremo Tribunal Federal ou no Superior Tribunal de Justiça.
Identidade própria
A empresa júnior, chamada Projetos Consultoria Integrada, é entidade com CNPJ próprio e que não se confunde com a faculdade à qual é vinculada. Representada pelo escritório Mesquita Póvoa Advocacia, ela ajuizou ação pedindo a imunidade tributária conferida pelo artigo 150, inciso III, alínea “c” da Constituição.
A alegação é de que a empresa foi criada com objetivo educacional e sem fins lucrativos ou econômicos. A sentença negou o pedido por entender que isso representaria uma vantagem excessiva em relação às demais empresas do mercado, causando desequilíbrio.
No recurso ao TJ-DF, a companhia júnior apontou que não disponibiliza produtos ou serviços no mercado, mas apenas desenvolve atividades e projetos estritamente pedagógicos, por meio da supervisão de professores e especialistas da área.
“A empresa júnior traz a possibilidade de complementar o que a instituição de ensino muitas vezes não traz, o ensino prático. Os estudantes não recebem salário, tendo como contraprestação cursos, capacitações, eventos e experiências no mercado de trabalho”, explicou o advogado Diogo Póvoa.
Voto vencedor
Venceu o voto divergente do desembargador Getúlio Moraes de Oliveira. Ele citou posição do STF segundo a qual a imunidade tributária prevista na Constituição para entidades sem fins lucrativos não as impede de cobrar por seus serviços. Basta que esses valores cobrados sejam integralmente aplicados na conservação dos seus próprios objetivos institucionais.
Para afastar a imunidade tributária, portanto, seria necessário comprovar o desvio de finalidade da empresa júnior, ônus que cabe ao Fisco distrital.
Ele também rechaçou o argumento de que a imunidade dependeria de a empresa júnior demonstrar, mediante portaria do MEC ou da Secretaria de Educação do Distrito Federal, a autorização para funcionar como instituição de ensino.
“Em relação ao caráter educacional, na Lei das Empresas Juniores há dispositivos apontando que o seu principal objetivo deve ser a educação e o desenvolvimento acadêmico dos seus membros”, explicou.
O voto vencedor apenas negou o direito de, por meio do mandado de segurança, reaver os valores indevidamente pagos em ISS nos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação.
Os desembargadores Robson Barbosa de Azevedo e Sandra Reves acompanharam a divergência.
Voto vencido
Ficou vencido o relator do recurso, desembargador Fabrício Fontoura Bezerra, acompanhado do desembargador Maurício Silva Miranda. Para eles, a imunidade tributária da empresa júnior é inviável, pois elas não se confundem com as instituições de ensino a que se vinculam.
“Não pode a apelante defender o amadorismo e a limitação acadêmica para o Poder Judiciário para fins de imunidade tributária do ISS, e adotar uma outra postura de profissionalismo em expansão do mercado, com altas cifras em destaque”, apontou.
Ainda segundo o relator, a imunidade tributária da empresa júnior ofereceria uma vantagem e causaria desigualdade no mercado. Para ele, haveria “com clareza o regime de livre e desleal concorrência, caso lhe fosse reconhecida a não incidência do citado imposto”.
- MUNICIPAIS: