STF decide se há limite para multas tributárias
O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), liberou para julgamento um processo que discute se há limite para a aplicação de multas tributárias. A Corte vai tratar sobre os percentuais cobrados pelos Fiscos em caso de descumprimento ou erro nas chamadas obrigações acessórias – declarações e emissões de documentos fiscais exigidos junto com o pagamento de tributos.
Essa discussão é importante para a fiscalização e arrecadação dos Estados e também para todos os contribuintes.
O julgamento teve início em dezembro do ano passado e, naquela ocasião, o relator, ministro Luís Roberto Barroso, proferiu voto. Ele entende que deve haver limite.
É o único voto que se tem agora. Dias Toffoli apresentou pedido de vista no ano passado e está, agora, devolvendo o caso. O julgamento ocorrerá no Plenário Virtual entre os dias 23 e 30 de junho.
Entenda
A discussão envolve proporcionalidade e caráter confiscatório desse tipo multa. Chegou ao STF a partir de um recurso da Eletronorte contra uma lei do Estado de Rondônia – já revogada – que fixava multa de 40% sobre o valor da operação pelo não cumprimento de obrigações acessórias.
No caso, a empresa ficou sujeita a pagar cerca de R$ 168,4 milhões pela falta de emissão de notas fiscais em compras de diesel para a geração de energia termelétrica.
O ICMS devido havia sido recolhido pela sistemática da substituição tributária, em que um contribuinte da cadeia adianta o pagamento em nome dos demais. O valor da pena imposta à Eletronorte pelo descumprimento da obrigação acessória foi o dobro do montante do imposto pago.
O Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO) reduziu a multa para 5%. A empresa, ainda assim, levou a disputa ao STF alegando confisco. Depois, aderiu a um programa de parcelamento do Estado e desistiu da ação.
Decisão vinculante
Apesar do encerramento do caso concreto, o STF decidiu seguir adiante para definir uma tese sobre os limites das multas aplicadas pelos Fiscos por descumprimento de obrigação acessória – que será aplicada para todo o país.
Por causa dessa repercussão geral, segundo advogados, o julgamento é considerado tão importante.
“O impacto dessa discussão é muito significativo na vida das empresas. As legislações dos Estados costumam prever multas que são extremamente elevadas e que consideram como base de cálculo o valor da operação ao invés do valor do tributo incidente na operação”, diz a advogada Maria Andréia dos Santos, sócia do escritório Machado Associados.
Pesquisa
A Associação Brasileira de Advocacia Tributária (Abat), que atua nesse caso como parte interessada (amicus curiae) fez um levantamento sobre o tema. De 16 Estados analisados, 11 aplicam multa por descumprimento de obrigação acessória sobre o valor da operação – e não sobre o valor do tributo – o que deixa a conta muito mais alta.
São eles: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Paraná, Santa Catarina, Amapá, Ceará, Rio Grande do Norte e Sergipe.
Por isso, para a entidade, um dos pontos centrais do julgamento é definir – alé dos percentuais – se essas multas podem recair sobre o valor da operação do contribuinte.
Voto do relator
O ministro Barroso, relator do tema no STF, propôs uma limitação para as multas por descumprimento de obrigações acessórias. Com fundamento em outras decisões da Corte, ele fixou um teto de 20% sobre o valor do tributo.
Na prática, portanto, a base de cálculo não poderia ser o montante da operação. “Esse critério faz com que a gradação do quantum da penalidade acompanhe, inclusive, a capacidade contributiva”, diz no voto (RE 640452).
STJ valida exclusão de 11 setores da desoneração da folha
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) validou, ontem, a exclusão de 11 setores da economia do regime de desoneração da folha de pagamentos. Empresas de hotelaria, navegação, transporte aéreo e marítimo, além de algumas do varejo, estão entre as afetadas por essa decisão.
As companhias foram excluídas do regime pela Lei nº 13.670, de maio de 2018, e recorreram à Justiça para tentar manter o benefício até, pelo menos, o fim daquele ano.
Essa norma reduziu de 28 para 17 o número de setores que podiam optar por contribuir para a previdência por meio do regime da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB).
Foi a saída encontrada, na época, para amenizar as perdas que a União teria com a redução dos tributos do óleo diesel – que, dentre outras medidas, acabaria com a greve dos caminhoneiros que paralisava o país.
As empresas recolhiam para a Previdência entre 2,5% e 4,5% sobre a receita bruta e, por força da nova lei, passaram a ser obrigadas à tributação “convencional”, de 20% sobre a folha de salários.
Começou ali, no entanto, uma enorme discussão sobre a data da mudança de regime. A Lei nº 13.670 deu prazo de 90 dias para que os setores excluídos se organizassem e começassem a fazer os pagamentos no novo formato. A publicação ocorreu em maio e a mudança de regime seria em setembro.
As empresas não concordaram e recorreram ao Judiciário. Argumentavam que haviam feito uma opção irretratável no começo do ano e, por esse motivo, deveriam ter o direito de permanecer no regime da CPRB pelo menos até o fim do exercício de 2018.
Coube ao STJ, agora, dar a palavra final sobre a data correta. Os ministros da 1ª Seção se posicionaram, de forma unânime, contra as empresas. O julgamento foi realizado ontem em caráter repetitivo, ou seja, com efeito vinculante para todo o Judiciário.
O ministro Herman Benjamin, relator do tema, leu apenas as teses que foram fixadas. São duas. Uma diz que “a regra da irretratabilidade da opção da contribuição previdenciária sobre receita bruta prevista no parágrafo 13 do artigo 9 da Lei nº 12.546, de 2011, destina-se apenas ao beneficiário do regime e não à administração”.
Já a outra tese aprovada pelo STJ estabelece que “a revogação da escolha de tributação da contribuição previdenciária pelo sistema da CPRB trazida pela Lei nº 13.370, de 2018, não feriu direitos do contribuinte uma vez que foi respeitada a anterioridade nonagesimal” (REsp 1901638 e REsp 1902610).
Advogados de empresas estavam pessimistas com o resultado desse julgamento. As duas turmas que tratam das questões de direito público no STJ – 1ª e 2ª – tinham decisões contra o contribuinte, ou seja, permitindo a mudança de regime conforme o que foi determinado na lei.
A 1ª Seção, onde ocorreu o julgamento em repetitivo, reúne os ministros das duas turmas. Era pouco provável, portanto, que houvesse uma virada de posicionamento.
Especialistas destacam que a decisão de ontem pode ter sido o fim da linha para esse tema. Essa discussão chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) e os ministros afirmaram se tratar de questão infraconstitucional. Sendo assim, a palavra final fica mesmo com o STJ.
Afirmam, além disso, que o desfecho tem consequências para o caixa das companhias. Como ficou definido que vale setembro de 2018, as empresas que não cumpriram a regra – e continuaram recolhendo pela CPRB até o fim daquele ano – poderão ser cobradas pelo governo e, nesse caso, terão que fazer a complementação de tributos.
“A maioria das decisões de primeira instância sobre o tema foram favoráveis aos contribuintes em 2018 e muitas dessas decisões favoráveis foram mantidas até agora”, diz Guilherme Yamahaki, sócio do escritório Schneider Pugliese.
Com a decisão em repetitivo do STJ, no entanto, ele frisa, essas decisões favoráveis serão revogadas e as empresas terão que apurar os valores devidos entre a CPRB e a contribuição sobre a folha.
Também especialista em tributação, Rodrigo Antônio Dias, sócio do escritório VBD Advogados, frisa que a advocacia sabe que não existe garantia de regime tributário eterno para ninguém e que não brigou contra a mudança na legislação.
O problema, aqui, ele diz, foi o fato de a alteração de regime ter sido feita no meio do ano. “As regras do jogo mudaram enquanto o jogo estava sendo jogado. Decisões empresariais foram tomadas com base na expectativa de que a tributação seria daquela forma durante todo aquele ano”, frisa.
Para o advogado, decisão da Justiça aceitando essa mudança contraria a preservação da segurança jurídica e aumenta o risco Brasil.
Especialistas afirmam que a desoneração da folha é importante para garantir a manutenção de empregos de setores que são intensivos em mão de obra.
Há discussão no Congresso sobre a prorrogação do prazo para as empresas de 17 setores que ainda têm direito ao benefício. Terminaria em 31 de dezembro e o projeto aprovado terça-feira pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado estende até o fim de 2027.
STF encerra polêmica sobre ISS, mas pode ter criado entrave à reforma tributária
Ao decidir que são inconstitucionais as leis que determinavam que o ISS é devido no local do tomador do serviço, o Supremo Tribunal Federal encerrou uma acalorada polêmica do Direito Tributário nas últimas décadas. Mas, por outro lado, pode ter criado entraves à aguardada reforma tributária.
Na última sexta-feira (9/6), o Supremo declarou inconstitucionais os dispositivos da Lei Complementar 116/2003, alterados pela LC 157/2016, que determinavam que o ISS seria devido no município do tomador de serviços.
O julgado criou um novo ponto de fricção no debate em torno das PECs 45 e 110, as duas propostas que devem servir de pilares para a reforma.
O professor de pós-graduação em Direito Tributário da Universidade do Estado do Rio de Janeiro Ricardo Almeida Ribeiro da Silva explica que o impacto da decisão do Supremo na arrecadação municipal será pequeno, porque o regime da LC 157 vigorou por poucos meses até a suspensão por liminar do ministro Alexandre de Moraes.
O impacto, no entanto, será sentido nas propostas da reforma. Para o especialista, do jeito que estão hoje desenhadas e anunciadas, as duas propostas seriam declaradas inconstitucionais.
“As PECs 45 e 110 alteram para o destino a incidência do Imposto (único ou dual) de todos os bens e serviços, mas não trazem qualquer tipo de regulamentação e muito menos preveem o sistema eletrônico operacional que irá viabilizar a tributação de serviços, produtos e mercadorias, evitando conflitos interfederativos e garantindo segurança para os contribuintes”, argumenta.
O tributarista Augusto Fauvel compartilha da impressão de que o texto das propostas deve ser mudado em face da decisão do Supremo. “Se o texto das PECs seguir os mesmos parâmetros existentes na lei declarada inconstitucional, a reforma será afetada pela decisão do STF. No entanto, se o texto definir de forma mais adequada a figura do tomador conforme voto do ministro Alexandre, podemos ter novo julgamento com outro entendimento”, pondera.
Já Carlos Augusto Daniel Neto, advogado tributarista, sócio do Daniel & Diniz advocacia tributária, entende de modo diverso a questão. “A PEC 45 privilegiou o critério do destino na definição da titularidade da arrecadação do tributo relativo à à aquisição de bens e serviços. Trata-se de um regime de repartição das receitas arrecadadas pelo IBS, e não uma regra de resolução de conflitos de competência entre municípios, como é a LC 157/2016. Por isso, não parece que essa decisão terá impacto direto sobre o conteúdo da PEC que está sendo discutida”, afirma.
Distorção persiste
No julgamento do Supremo que declarou a inconstitucionalidade da LC 157/2016 prevaleceu o entendimento do relator, ministro Alexandre de Moraes. Ele já havia concedido liminar para suspender o efeito dos dispositivos, por entender que a nova disciplina normativa deveria apontar com clareza o conceito de “tomador de serviços”, sob pena de causar insegurança jurídica e dupla tributação ou de incidência tributária incorreta.
Após a decisão liminar, a LC 175/2020 especificou a figura do “tomador dos serviços” das atividades em questão e padronizou um sistema nacional para o cumprimento das obrigações acessórias relativas ao tributo municipal. As alterações promovidas pela
ações, por aditamento. Contudo, as mudanças não convenceram o ministro, que manteve seu voto e foi seguido pela maioria.
O tema sempre foi polêmico. Para se ter ideia, o advogado e professor de Direito Tributário da Universidade de São Paulo Heleno Taveira Torres já havia apontado em artigo publicado na revista eletrônica Consultor Jurídico que o Projeto de Lei Complementar 170/2020, promovia uma “partilha” (não autorizada pela Constituição) entre o município do estabelecimento prestador e o município de domicílio do tomador.
Outros especialistas, por sua vez, miram no problema que a LC 157/2016 tentava corrigir. É o caso de Carlos Daniel Neto. Ele explica que a lei complementar que foi declarada inconstitucional pelo STF tinha, na sua origem, a finalidade de alocar a competência tributária nos municípios dos tomadores do serviço, com a finalidade de aumentar as suas receitas próprias.
“A declaração de inconstitucionalidade da regra vai, nesse sentido, ampliar a distorção na arrecadação do ISS, concentrando-a em alguns municípios maiores. Por outro lado, a lei complementar foi rejeitada pelo STF justamente em razão dos potenciais novos conflitos fiscais que geraria, e não pela impossibilidade constitucional da resolução desses conflitos horizontais intermunicipais em favor dos municípios dos tomadores de serviços”, pondera.
A mesma distorção na arrecadação do ISS é apontada por Fauvel. “Entendo que do ponto de vista arrecadatório dos municípios a decisão do STF vai causar distorção. Isso porque relatório da Secretaria do Tesouro Nacional revela discrepância, uma vez que aproximadamente 50% do total da arrecadação do ISS em nosso país está concentrada em 69 municípios”, pondera.
O advogado Breno Dias de Paula faz coro aos colegas. “Na verdade, o Supremo Tribunal Federal concluiu pela legitimidade da cobrança do ISS na sede do estabelecimento do prestador de serviço e afastou a LC que previa a cobrança para o município local da prestação de serviço. Aqui parece-me uma vitória dos municípios mais ricos do país em detrimento dos mais pobres. Entendo que perdeu a Federação e a cláusula constitucional que determina a redução das desigualdades sociais e regionais”, lamenta.
ADI 5.835
ADI 5.862
ADPF 499
LC 116/2003
LC 157/2016
LC 175/2020
PECs 45 e 110
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