Retrospecto Tributário – 20/03 a 27/03

Carf, Grandes empresas questionam na Justiça e Perse

Carf reverte entendimento e mantém PIS/Cofins sobre bonificações  

Em setembro de 2022, conselheiros decidiram em caso semelhante envolvendo outro supermercado pelo desempate pró-contribuinte 

Por cinco votos a três, os conselheiros da 3ª Turma da Câmara Superior do Carf entenderam que as bonificações e descontos concedidos por fornecedores ao supermercado Carrefour Comércio e Indústria Ltda têm caráter contraprestacional, constituindo receita. Assim, foi mantida a cobrança de PIS e Cofins sobre os valores. 

Os descontos e bonificações foram concedidos por questões como posicionamento dos produtos na loja (por exemplo, o fornecedor concedia um desconto para que seu produto ficasse em um ponto de maior visibilidade) ou reembolso pelos custos que o Carrefour tinha com a distribuição. 

A decisão de quarta-feira (15/3) representa uma reversão de entendimento na turma, que em setembro de 2022 decidiu caso semelhante pelo desempate pró-contribuinte. O posicionamento havia sido tomado no processo 10480.722794/2015-59, do Bompreço Supermercados do Nordeste Ltda. 

Ao defender o afastamento da cobrança, o advogado do Carrefour, Giancarlo Matarazzo, do Pinheiro Neto, afirmou que o fato gerador do PIS e da Cofins é auferir receita. Os descontos, na sua visão, não teriam característica de receita, uma vez que não têm relação com o objeto social do Carrefour. 

Segundo Matarazzo, a empresa se dedica à compra e revenda de mercadorias, e não presta serviços aos seus fornecedores. Conforme o defensor, os descontos registrados representam elementos de formação de preço e são redutores de custo, não preenchendo o conceito jurídico de 

receita. O advogado observou que, ainda que se tratasse de receita, seriam receitas financeiras, sujeitas à alíquota zero de PIS/Cofins. 

Contraprestação 

A relatora, conselheira Vanessa Marini Cecconello, deu provimento ao recurso do contribuinte. A julgadora seguiu posicionamento conhecido, segundo o qual os descontos e bonificações não possuem natureza de receita. 

O conselheiro Rosaldo Trevisan abriu divergência. Para o julgador, o cerne da questão é o caráter contraprestacional das bonificações. Segundo ele, não são descontos incondicionais, uma vez que estão atrelados a questões como reembolso por distribuição, garantia de margem de lucro e abertura e reforma de lojas. A maioria dos conselheiros acompanhou o entendimento. 

Em setembro do ano passado, no julgamento do caso Bompreço, o voto que levou ao empate foi proferido pelo ex-presidente do Carf, Carlos Henrique de Oliveira, que votou a favor do contribuinte. Foi aplicada, então, a regra do desempate pró-contribuinte, que ainda estava vigente. Já o relator do processo, Valcir Gassen, entendeu que as bonificações constituem receita e votou a favor da tributação, embora seja um dos conselheiros que representam os contribuintes na turma. 

Na quarta, Gassen repetiu o voto pró-fisco. As conselheiras Vanessa Marini Cecconello, Tatiana Midori Migiyama e Erika Costa Camargos Autran, também representantes do contribuinte, ficaram vencidas. 

O processo corre sob o número 16561.720008/2012-12.  

Fonte: Jota 

Grandes empresas questionam na Justiça R$ 559 bi em tributos  

As 19 maiores empresas abertas não financeiras brasileiras questionam na Justiça a cobrança de R$ 559 bilhões em tributos pela União, Estados e municípios. O montante representa 74,3% das estimativas com ações judiciais em geral – quando consideradas as contingências nas demonstrações financeiras de 30 de setembro de 2022, segundo levantamento do Valor Data. 

Os valores envolvidos nesses processos apontam, segundo especialistas, para um quadro preocupante, em comparação com outros países, e demonstram a necessidade de uma reforma no sistema tributário nacional. Por aqui, essas disputas pesam 17 vezes mais para as empresas do que no exterior, conforme estudo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em parceria com o Insper. 

Para algumas companhias, as contingências fiscais representam mais de 90% do total de disputas indicadas em seus informes financeiros. Esse é o caso da Gerdau (91,3%), Ambev (97,5%), Grupo Pão de Açúcar (92,5%), Sendas Distribuidora (93,3) e Natura (90,5%). O volume de processos fiscais é formado principalmente por disputas sem provisionamento, em razão de não haver chance de perda provável na avaliação das companhias. 

Um dos motivos para esse peso relevante das disputas tributárias está na complexidade da legislação, segundo Nelson Machado, professor de economia na FGV e diretor no Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), think tank que elaborou o texto original da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 45. O texto propõe a substituição do PIS, Cofins, ICMS, ISS e IPI por um imposto sobre bens e serviços (IBS). 

Levantamento do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT) mostra essa complexidade. Hoje estão em vigor 39 mil normas tributárias no Brasil. Foram editadas por União, Estados e Distrito Federal e municípios, que hoje cobram 64 tributos – entre impostos, contribuições, fundos e taxas. 

É cobrado o ICMS sobre a circulação de mercadorias e ISS sobre serviços, uma separação que era relativamente fácil há 50 anos, mas que hoje gera um contencioso considerável sobre qual tributo deve ser pago em cada situação, avalia Machado. “Nosso sistema é tão caótico que ele produz e aumenta a litigiosidade.” 

O professor lembra que a cobrança de ICMS por 26 Estados mais o Distrito Federal ainda dá margem para a guerra fiscal, que pode levar uma empresa a decidir se instalar em um Estado pelos benefícios oferecidos. “O imposto não deveria induzir à decisão de se instalar em um ou outro lugar.” 

Mas não é nem o ICMS nem o ISS o campeão do contencioso. Hoje o IPTU se destaca com o maior volume de ações – cerca de 25% do total (528.175 processos), conforme a pesquisa CNJ/Insper. 

Os campeões federais e também mais significativos para empresas abertas, com base no estudo, são contribuição previdenciária (8,2%, um total de 174.128 processos), o PIS e Cofins, com 5,8% (122.868) e 5,5% (117.135) do total das ações tributárias. 

Advogado tributarista e head de estudos do IBPT, Gilberto do Amaral lembra que, além da insegurança jurídica, a complexidade do sistema tributário nacional traz forte impacto ao caixa das empresas. De acordo com levantamento da entidade, as empresas gastam por ano, em média, 1,2% do faturamento bruto para administrar e executar as normas tributárias. 

“A empresa não sabe direito que regra aplicar, o que gera custos enormes de compliance”, diz Eurico Diniz De Santi, sócio e diretor do CCiF. O professor destaca que a Receita ainda delega ao contribuinte a prerrogativa de interpretar a legislação e tem cinco anos depois disso para verificar se há algum erro e fazer uma autuação fiscal, o que é mais uma insegurança para as empresas. “Às vezes o passivo tributário é maior que o patrimônio líquido da companhia. Isso a desvaloriza.” 

Para a União, a conta também é alta. A soma do impacto estimado das ações judiciais tributárias, com classificação de risco possível, que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ), é de R$ 862,9 bilhões, conforme a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2023. 

Só discussões tributárias federais na esfera administrativa somam cerca de R$ 1 trilhão, considerando apenas os valores que estão no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Há ainda outra conta, dos valores em que a dívida já foi confirmada na esfera judicial – ou nem chegou a ser discutida – mas ainda não foi paga: são os R$ 2,7 trilhões inscritos em dívida ativa. 

Considerando o tempo médio de uma disputa fiscal no Brasil, as empresas desembolsam valores “exorbitantes” para a sua manutenção – seja com taxas judiciais, custos com perícias, gastos com escritórios de advocacia e custos com garantias -, afirma a Ambev em nota ao Valor. A companhia destaca ainda a existência de um “custo intangível”, em virtude dos impactos reputacionais sofridos por uma empresa que carrega uma disputa fiscal em seu balanço. 

De acordo com a companhia, a maior parte do contencioso brasileiro decorre de divergências de interpretação da legislação tributária. “Isso decorre, em especial, da complexidade da nossa legislação”, diz. Para a Ambev, uma reforma tributária que traga previsibilidade, simplificação e clareza seria um passo importante para redução do contencioso e aumento da segurança jurídica do país, com a melhoria do ambiente tributário, tornando o Brasil mais atrativo para investimentos. 

Um executivo de outra grande empresa que atua em diferentes Estados ouvido pelo Valor destaca a dificuldade em lidar com as divergências entre normas estaduais, em especial. Uma atividade corriqueira, a transferência de mercadorias entre Estados, afirma, pode gerar autuações gigantes, por causa de divergências entre os governos. “Quem eu desagradar cobra uma multa imensa e, às vezes, com processo criminal de sonegação fiscal”, diz. Ele explica que, mesmo com centenas de pessoas dedicadas ao pagamento de impostos, há dificuldade em precificar produtos. 

Entrevistas anônimas feitas na pesquisa CNJ/Insper mostram as diferenças entre o cenário nacional e o internacional. Uma empresa, por exemplo, citou que tem 1.476 processos tributários no Brasil e 16 no exterior, distribuídos por 14 países. Para Breno Vasconcelos, advogado tributarista e professor no Insper, apesar de ser uma amostra pequena e envolver empresas que, provavelmente, têm operações maiores no Brasil, é um indício de que o contencioso brasileiro é complexo. 

Heleno Torres, titular de Direito Financeiro da Universidade de São Paulo (USP), considera ser necessário simplificar e resolver o sistema tributário nacional. Mas defende que essa reforma deveria ser feita por fases – partindo pelo PIS/Cofins. Por serem contribuições, acrescenta, as mudanças poderiam começar a valer em 90 dias. A ideia seria unificá-las. A desoneração da folha de pagamentos também entraria nessa primeira fase. A segunda fase, viria em 2024, com a reforma para unificar os impostos. 

Para a sócia do Demarest Advogados, Priscila Faricelli, é preciso também uma reforma do contencioso fiscal. “Para uma empresa se defender na Justiça, ela precisa apresentar uma garantia integral (do valor cobrado). Se for um processo de bilhões, é algo inviável até para grandes empresas”, diz, acrescentando que outra questão a ser discutida são os valores das multas, que podem chegar a 150%. “Um auto de infração que começa em R$ 100 milhões, facilmente chega a R$ 450 milhões.” 

Procuradas pelo Valor, as empresas Gerdau, Pão de Açúcar e Sendas Distribuidora não quiseram comentar o assunto. 

Fonte: Valor.globo 

Norma que reduz setores beneficiados pelo Perse deve respeitar noventena, decide juíza  

Uma empresa de serviços de tradução simultânea obteve, no dia 14 de março, uma liminar na Justiça Federal da Bahia para suspender, por 90 dias, os efeitos de uma norma do Ministério da Economia – hoje Ministério da Fazenda – que reduziu o número de setores com direito às alíquotas zero previstas no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse). 

O serviço de tradução foi um dos 88 setores contemplados pela Portaria ME 7.163/2021, editada pelo então Ministério da Economia, para regulamentar os grupos econômicos que teriam direito à alíquota zero do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins pelo prazo de 60 meses. O benefício consta na Lei 14.148/2021, que instituiu o Perse. 

Mas, no primeiro dia útil deste ano, a pasta publicou a Portaria ME 11.266/2022, que reduziu o número de setores contemplados para 38. Entre os que não mais constam está o serviço de tradução simultânea. 

Segundo a empresa, a medida “constitui uma verdadeira revogação de benefício fiscal, bem como, traduz aumento de carga tributária sem explicitar 

em nenhum momento respeito as garantias constitucionais da não surpresa do contribuinte”. 

A juíza Marianne Bezerra Sathler Borré, da 7ª Vara Federal Cível e Agrária da Seção Judiciária da Bahia, considerou um precedente do Supremo Tribunal Federal (STF) segundo o qual se aplica o princípio da anterioridade quando houver redução ou supressão de benefícios fiscais, “haja vista que tais situações configuram majoração indireta de tributos”. 

Ela, contudo, só acolheu em parte a argumentação da empresa, que pedia, em primeiro lugar, a suspensão da cobrança dos tributos. Para isso, a empresa evocou o artigo 178 do Código Tributário Nacional (CTN), que prevê que “a isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo”. 

Borré rejeitou a alegação por não considerar o benefício fiscal instituído pelo Perse uma isenção. A isenção, afirmou, exclui a incidência do tributo por motivos de política fiscal, o que não se verificaria no benefício de redução de alíquota zero do Perse. Por isso, para a juíza, seria possível reduzir a abrangência do benefício por meio da portaria. 

“No entanto, no nosso entender, o STJ pacificou esse tema no julgamento do Resp da Lei do Bem. Ao fim e ao cabo, no critério quantitativo que está sendo atacado nessa questão, o benefício de alíquota zero e a isenção têm o mesmo efeito prático para o contribuinte, que seria o de não pagar o tributo,” afirmou Gustavo Conde de Almeida, do Germano Cardoso. 

O advogado atuou no caso ao lado de Mateus Canedo Ramos Moura e do sócio da banca, Germano César de Oliveira Cardoso. 

O processo ao qual Almeida se referiu é o Recurso Especial 1.988.364/RN. Nele, os ministros consideraram que é adequada a aplicação do artigo 178 do CTN na “hipótese de fixação, por prazo certo e em função de determinadas condições, de alíquota zero da Contribuição ao PIS e da Cofins, porquanto os contribuintes, tanto no caso de isenção, quanto no de alíquota zero, encontram-se em posição equivalente no que tange ao resultado prático do alívio fiscal”. 

O argumento de contradição aparece nos embargos de declaração protocolados contra a decisão de Borré. Também se aponta uma possível omissão por parte da juíza federal, que aplicou o princípio da anterioridade nonagesimal, mas não se manifestou sobre a anterioridade de exercício, à qual está sujeito o IRPJ. 

O objetivo principal é que os pedidos sejam concedidos como em outro caso em que Gustavo Conde de Almeida atuou e no qual uma outra empresa de tradução simultânea conseguiu uma liminar para suspender os efeitos da norma do Ministério da Economia. 

Esta outra decisão foi proferida pelo juiz da 19ª Vara Federal do Rio de Janeiro, Fabricio Fernandes de Castro. Para ele, “o benefício fiscal previsto no artigo 4º da Lei nº 11.148/2021 se assemelha à isenção tributária, devendo receber o mesmo tratamento e observar a regra instituída no art. 178 do 

CTN, no que diz respeito à proteção das legítimas expectativas dos contribuintes”. 

Os processos, na ordem em que aparecem, têm os números 1009551-10.2023.4.01.3300 e 5017146-91.2023.4.02.5101.  

Fonte: Jota.info 

  


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